Honório Moreira /Folha Imagem -
Plataforma de lançamento, ainda chamuscada, só deve ser refeita a partir de 2009;
torre destruída foi vendida como sucata após perícia


Base do foguete brasileiro VLS aguarda reconstrução

FÁBIO GUIBU - da Agência Folha, em Alcântara (MA)

As novas medidas de segurança que envolvem o projeto do foguete brasileiro VLS (Veículo Lançador de Satélites) prevêem a construção de um túnel subterrâneo de fuga no CLA (Centro de Lançamento de Alcântara) e a redução no número de pessoas autorizadas a permanecer na torre de lançamento -onde estavam os 21 técnicos mortos no incêndio do VLS-1, há cinco anos.

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A nova plataforma, que começará a ser construída no próximo ano, contará com sistema de saída rápida por tubos para um túnel de concreto com 60 metros de extensão. Na torre será permitido o acesso de, no máximo, cinco pessoas antes dos lançamentos.

Os foguetes partirão do mesmo local onde ocorreu o acidente, em 22 de agosto de 2003. A Folha visitou anteontem a base militar e esteve na área do desastre. Marcas do acidente, um dos quatro piores da história da exploração espacial, ainda permanecem.

O piso de concreto está parcialmente destruído. Chapas e tubos metálicos estão chamuscados e corroídos pela ferrugem. O mesmo ocorre com os trilhos que levavam a chamada torre móvel de integração até o foguete. O cenário contrasta com a pintura bem-feita do meio-fio e o asfalto novo.

Não há no local nenhum memorial às vítimas ou referência ao acidente. Um monumento em homenagem aos mortos foi erguido no CTA (atual Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial), órgão da Aeronáutica em São José dos Campos (SP), onde todos trabalhavam.

Os destroços da plataforma e do VLS-1 foram periciados por técnicos russos e brasileiros e guardados até a conclusão do IPM (Inquérito Policial Militar) que apurou o caso. Depois, foram leiloados como sucata.

A investigação apontou que o incêndio foi causado pela ignição antecipada de um dos propulsores do foguete. A causa do problema, porém, não foi identificada. O caso foi arquivado em 2005, por falta de provas. Ninguém foi punido.

A perícia apontou que a estrutura do piso não foi afetada. Ela será aproveitada nas obras de reconstrução do local. Receberá uma nova camada de concreto, de cinco centímetros.

Recomeço

As obras da torre do VLS-1 e do novo Centro Espacial de Alcântara haviam sido barradas pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que viu problemas técnicos em uma licitação e de sobrepreço em outra.

Neste ano, o tribunal liberou as obras. A nova torre, que custará cerca de R$ 35 milhões, terá aproximadamente 250 toneladas e será capaz de lançar a versão 2 do VLS, com maior capacidade de transporte de carga. A empresa Jaraguá Equipamentos já foi contratada para refazer a torre, segundo a Agência Espacial Brasileira.

Segundo o diretor do CLA, tenente-coronel Nilo Andrade, as obras deverão ser concluídas em agosto de 2010. Testes de lançamento estão previstos para 2011. Se aprovado, o foguete brasileiro poderá colocar satélites em órbita em 2012.

Desde o acidente, o centro de Alcântara realizou três lançamentos de foguetes de médio porte, para experimentos de microgravidade. Para isso, foi utilizada outra torre, a 500 metros do local do acidente.

Mensalmente, os militares lançam também, em média, 12 pequenos foguetes de plataformas móveis, para treinamento e testes dos radares e do equipamento de telemetria (transmissão de dados à distância).

Segundo o diretor do CLA, outros foguetes experimentais e de treinamento poderão ser lançados ainda este ano das bases de Alcântara e do Centro de Lançamento da Barreira do Inferno, no Rio Grande do Norte.

O CLA deverá abrigar ainda uma nova plataforma de lançamento, para o foguete ucraniano Cyclone-4, informou o diretor-geral da binacional Alcântara Cyclone Space, Roberto Amaral. A previsão é lançar o foguete em julho de 2010.


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Foguete VLS só volta a voar em 2012, nove anos após a tragédia de 2003; governo mantém projeto estratégico sob dieta

Fonte: Folha on line - Editorial


O VLS (Veículo Lançador de Satélites), pedra angular do programa espacial brasileiro, prossegue firme no rastro dos fracassos e adiamentos. O foguete cujo desenvolvimento iniciou-se em 1980 voará novamente só em 2012 -se nada mais der errado.

O retrospecto do VLS demonstra que muita coisa ainda pode dar errado. Foram três tentativas e três fiascos: 1997, 1999 e 2003. Na última, a ignição acidental ainda na torre de lançamento causou a morte de 21 técnicos e engenheiros no centro de lançamento de Alcântara (MA).

Há menos de três anos, o governo federal previa no Programa Nacional de Atividades Espaciais 2005-2014 que o quarto protótipo do VLS seria lançado em 2007. Uma previsão tão irrealista quanto a promessa, logo após a tragédia de 2003, de efetuar nova tentativa até 2006.

Os sucessivos descumprimentos deixam patente que o planejamento nessa área complexa é no mínimo errático. O pretexto atual para mais uma postergação é a cultura de segurança que estaria em implementação no Instituto de Aeronáutica e Espaço, órgão encarregado da montar e testar o veículo lançador.

Mais verossímil é que o projeto esteja sofrendo os efeitos de um fluxo inconstante de verbas, moléstia crônica do programa espacial. O orçamento da AEB para 2008 é de meros R$ 189 milhões (R$ 30 milhões para o VLS), 23% menos que em 2007. E só 39% do autorizado para este ano foram realizados até agora.

Nem mesmo a reconstrução da torre destruída em 2003 progrediu. A Agência Espacial Brasileira (AEB) anuncia agora, cinco anos depois, que as obras começarão em 2009.

Em paralelo, criou-se uma empresa binacional para lançar, de Alcântara, o modelo ucraniano Cyclone-4. Obter rendimento comercial com a base maranhense não é má idéia. Mas há boas razões estratégicas para adquirir autonomia na capacidade de lançar satélites em órbita e fazer uso pleno da localização de Alcântara, cuja vizinhança com a linha do Equador favorece a diminuição de custos de lançamento.

Já se disse aqui que o Brasil possui dimensões, recursos e massa crítica para justificar um programa espacial de verdade. Argumento similar pode ser adiantado a favor do desenvolvimento de um submarino de propulsão nuclear, outro projeto estratégico que o país ensaia há décadas sem traduzir em recursos suficientes toda a retórica grandiloqüente que os cerca. Passa da hora de fazê-los deslanchar.