Submarino nuclear brasileiro terá reator desenvolvido pelo país, aliado à tecnologia transferida pela França

Paola Carvalho - Correio Brasiliense

A era do submarino nuclear está próxima para a Marinha do Brasil. Depois de um acordo assinado entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu colega francês Nicolas Sarkozy, no início do mês, o país deu o último passo para integrar um seleto grupo de nações composto por Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia, China e Índia.

Na década de 1970, a Marinha construiu, com projeto alemão, quatro submarinos convencionais, em que a energia é fornecida por motores a diesel e baterias elétricas. Paralelamente, porém, deu continuidade ao seu programa nuclear, no Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP), o que possibilitou o desenvolvimento de um reator adequado a esse tipo de embarcação. Ficou, entretanto, uma pendência: o casco.

O contrato entre Brasil e França prevê a compra de cinco submarinos, sendo quatro convencionais, do modelo Scorpène, e um nuclear. Uma das embarcações convencionais será montada em território francês, enquanto as outras quatro serão produzidas no Brasil e entregues até 2021. “Pelo acordo, a França vai transferir toda a tecnologia do submarino nuclear, exceto o reator. Vamos integrar o nosso”, explica o capitão de mar e guerra Renato Rodrigues de Aguiar Freire.

Segundo ele, atualmente, o programa nuclear está na fase de construção do Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica (Labgene). “Esse laboratório é, na verdade, um protótipo do reator nuclear, cuja conclusão está prevista para 2014. Sua função é testar os sistemas, equipamentos e combustível que serão usados no submarino”, diz.

Freire destaca ainda que o Labgene é um reator nuclear PWR (sigla em inglês para reator a água pressurizado) com potência de 11mw. Semelhante aos reatores de Angra 1 e Angra 2, ele é capaz de produzir energia elétrica para consumo industrial e doméstico. Para se ter uma ideia de sua potência, ela é suficiente para iluminar uma cidade de aproximadamente 20 mil habitantes. O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub) — que inclui a produção das embarcações, compra de armamentos e construção de um estaleiro e de uma base naval — custará 6,7 bilhões de euros, sendo que 4,3 bilhões virão de financiamento externo, em 20 anos.

Vantagens
Para o capitão, são evidentes as vantagens táticas e estratégicas de um submarino nuclear, pela enorme autonomia. “Sem haver a necessidade de vir próximo à superfície do mar para recarregar as baterias, fica muito mais difícil a sua detecção por navios de superfície, helicópteros e aviões de um eventual oponente. Além disso, ele pode desenvolver velocidades elevadas por tempo ilimitado, já que não tem restrições de combustível, aumentando a sua mobilidade e permitindo cobrir enormes áreas de patrulha no oceano”, explica. O militar destaca ainda que o submarino nuclear é extremamente seguro. “Não há motivos para preocupação. São vários sistemas de segurança”, afirma, sem dar os detalhes.

Com o desenvolvimento do reator nuclear, produzido em princípio exclusivamente para o submarino, o Brasil, os Estados Unidos e a Rússia serão os únicos países a deter o chamado tripé — domínio tecnológico, recursos naturais e capacidade de implementação em escala industrial. “A França tem tecnologia, mas não tem reservas. A Austrália tem reservas, mas não tem tecnologia”, exemplifica João Roberto Mattos, pesquisador do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN). Ou seja, o acordo firmado entre o Brasil e a França vai muito além da frota para fortalecer a defesa nacional. O domínio das três etapas dá poder de fogo para negociações políticas internacionais.

Além do Brasil, conhecem e aplicam a tecnologia de enriquecimento de urânio os Estados Unidos, a França, a Rússia, a Alemanha, o Japão e a Holanda. Desses países, os dois primeiros utilizam a difusão gasosa, que é considerada obsoleta, pois consome 25 vezes mais energia do que a tecnologia de ultracentrifugação, empregada pelo Brasil e pelas demais nações.