O quadrimotor Boeing B-17 foi um dos
mais importantes aviões militares do Século XX, participando ativamente
da Segunda Guerra Mundial. Embora tivesse sido projetado bem antes da
Guerra, e voado pela primeira vez em 28 de julho de 1935, ainda era
considerado muito atual em 1941. Foi dos bombardeiros americanos mais
efetivos durante o conflito, tendo lançado mais de um terço (640 mil
toneladas) dos 1,5 milhões de toneladas de bombas americanas lançadas na
Europa e no Pacífico até o fim da guerra, em 1945.
Entretanto,
com o final da Guerra, milhares de B-17, remanescentes dos 12.731
exemplares fabricados, foram desativados. Como tinham pouca utilidade
para operadores civis, foram desmanchados aos milhares e transformados
em sucata.
Pode-se dizer que, como bombardeiro estratégico, sua missão terminou em
1945. Mas o B-17 era muito mais que um simples bombardeiro. Muitas
dessas aeronaves foram fabricadas, ou convertidas, em aeronaves de
reconhecimento, aerofotogrametria, carga e busca e salvamento. Essas
versões tiveram uma sobrevida considerável como aeronaves militares
depois da Segunda Guerra, especialmente as versões de busca e salvamento
(B-17H, depois redenominadas SB-17) como veremos a seguir.
Em 1944, ainda durante a Guerra,
foi realizada a Convenção de Chicago, a mais importante convenção de
aviação civil até hoje realizada. Reuniu 52 países, inclusive o Brasil, e
estabeleceu as bases para a reordenamento da aviação civil em todo o
mundo. Como resultado da Convenção de Chicago, em 1947 foi estabelecida a
ICAO - International Civil Aviation Organization, a mais importante
organização relacionada à aviação civil no mundo.
A
Convenção de Chicago estabeleceu diversas responsabilidades aos países
signatários, visando a segurança e eficiência das operações da aviação
civil, entre as quais estava a obrigação de cada país manter unidades
de salvamento, busca e reconhecimento de longo alcance, dentro da sua
área de responsabilidade.
O Brasil, nos termos da
Convenção, teria que proporcionar apoio e proteção às aeronaves em
emergência que estivessem sobrevoando seu território e o Oceano
Atlântico, provenientes ou destinadas à América do Sul.
Isso
criou um problema para a Força Aérea Brasileira. Não existiam ainda
aeronaves, unidades aéreas, doutrina militar, experiência ou
adestramento para essa tarefa. Qualquer aeronave que tivesse
dificuldades, ou se acidentasse sobre o Oceano Atlântico, por exemplo,
dependeria inteiramente dos navios da Marinha Brasileira para o seu
socorro, ou até mesmo de embarcações ou aeronaves privadas.
A FAB iniciou então um processo
de adequação, criando uma unidade de busca e salvamento em Belém,
utilizando um único avião Consolidated PBYCatalina (FAB 6516). No final
de 1950, foi criado o Serviço de Busca e Salvamento Aeronáutico da FAB,
vinculado à Diretoria de Rotas Aéreas do Ministério da Aeronáutica.
Um dos maiores problemas
encontrados foi a falta de equipamento para tal missão, especialmente os
de grande raio de ação. Em 1950, o Governo Brasileiro pediu ajuda à
USAF, tentando adquirir aeronaves especializadas Boeing SB-17, para que
pudesse atender os requisitos da ICAO. A USAF concordou em ceder seis
aeronaves do tipo, sendo que as cinco primeiras chegaram ao Brasil em
abril de 1951, na Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Integraram o
Centro de Treinamento de Qadrimotores - CTQ, uma unidade provisória
criada em 24 de janeiro do mesmo ano, com a tarefa exclusiva de formar
um grupo inicial de tripulantes e pessoal de terra para a operação dos
B-17.
Apenas
dois meses depois, em junho de 1951, os SB-17, aqui designados
simplesmente como B-17, foram transferidos, junto com o CTQ, para a Base
Aérea do Recife, em Pernambuco, onde se dedicariam ao treinamento de
missões de busca e salvamento de longo alcance, além de missões de
aerofotogrametria.
Durante a fase do CTQ, os aviões
eram operados por instrutores americanos, cedidos pela USAF, e seus
esquemas de pintura eram basicamente os mesmo da USAF, exceto pelo leme
de direção pintado com duas faixas, uma verde e outra amarela. Na
verdade, as aeronaves ainda não haviam sido oficialmente incorporadas à
FAB, o que ocorreria somente em dezembro de 1953.
Durante a fase do CTQ, ocorreu o
primeiro acidente grave dos B-17 brasileiros: em 23 de julho de 1952,
um B-17 do CTQ (ainda matriculado como USAF 44-8557) equipado com bote e
pilotado por um oficial da USAF, fazia uma demonstração de lançamento
do bote sobre o mar, quando se chocou com um North American T-6, (o FAB
1555) que voava em formação com o quadrimotor para fazer a cobertura
fotográfica da missão. Ambas as aeronaves caíram no mar, sem
sobreviventes.
Em
1º de setembro de 1953, o CTQ realizou a primeira travessia oceânica de
uma aeronave militar brasileira, quando um dos B-17 decolou do Recife,
pousou em Dakar, no Senegal, e retornou ao Recife, demonstrando assim,
pela primeira vez, a capacidade do Brasil em atender ao disposto na
Convenção de Chigaco quanto aos serviços de busca e salvamento.
O CTQ foi extinto em 15 de
outubro de 1953, sendo substituído pelo 1º Esquadrão do 6º Grupo de
Aviação (1º/6º GAV), ainda baseado em Recife. Em dezembro do mesmo ano,
as aeronaves finalmente entraram no acervo da FAB, sendo carregadas com
as matrículas FAB 5400 a FAB 5404. A aeronave acidentada em 1952 jamais
recebeu uma matrícula na FAB.
No
final de 1954, a FAB recebeu mais sete aeronaves B-17 da USAF, as quais
receberam as matrículas 5405 a 5411, totalizando então 12 aeronaves em
serviço. Em 20 de novembro de 1957, o 6º GAV foi reorganizado, compondo
dois grupos distintos de B-17: o 1º/6º GAV, que operou as aeronaves de
busca e salvamento, e o 2º/6º GAV, que operou os B-17 de reconhecimento,
meterologia e aerofotogrametria.
O auge das operações dos B-17 da
FAB ocorreu em 1957, com o total de 5.800 horas voadas. Em março desse
ano, a FAB utilizou os B-17 para apoiar o Batalhão Suez, uma unidade
brasileira a serviço da ONU na Faixa de Gaza, na missão de pacificar a
região logo após a Crise de Suez, desencadeada com a nacionalização do
Canal de Suez pelo Presidente Gamal Abdel Nasser, do Egito, em 1956. Os
B-17 voaram 24 missões ao Oriente Médio, até 1960, levando 50 toneladas
de suprimentos e correio até 1960, num total de 2.071 horas de voo.
Além
das missões de busca e salvamento no litoral, os B-17 realizaram muitas
missões semelhantes na região Norte, na Amazônia, então praticamente
inacessíveis por terra. Sua enorme autonomia possibilitou o salvamento
de muitas vidas nessa região. As aeronaves B-17 de reconhecimento e
fotogrametria fizeram os primeiros levantamentos topográficos da região
amazônica durante os anos 50 e 60.
Os
B-17 revelaram-se aeronaves confiáveis e seguras durante a primeira
metade dos anos 1960, mas a partir de 1965, começaram a aparecer os
primeiros sinais de obsolescência e cansaço. Até então, além do B-17
acidentado na colisão em 1952, a FAB tinha perdido duas aeronaves em
acidentes, um em Belém, em 08 de agosto de 1959, e outra em Recife, em
1962. Em 1965, o FAB 5410 acidentou-se no Recife, reduzindo o efetivo da
frota para nove aeronaves, nem todas operacionais, pois algumas já
estavam sendo canibalizadas para manter os outros em voo.
O PAMA/SP (Parque de Material Aeronáutico de São Paulo), responsável pela manutenção dos B-17, começou o processo de canibalização dos aviões em pior estado para manter os outros voando. Os primeiros B-17 desativados foram os FAB 5406, em 17 de maio de 1966, e o FAB 5409, em 21 de novembro do mesmo ano. Serviram como fonte de peças de reposição aos demais. Em 1967, os B-17 ainda voaram cerca de 3.260 horas, mas as condições de manutenção estavam ficando críticas, com mais aviões no solo servindo como doadores de peças para os que estavam em voo, como os FAB 5403, descarregado do inventário em 13 de março de 1967, e o FAB 5407, descarregado em 29 de setembro do mesmo ano.
O PAMA/SP (Parque de Material Aeronáutico de São Paulo), responsável pela manutenção dos B-17, começou o processo de canibalização dos aviões em pior estado para manter os outros voando. Os primeiros B-17 desativados foram os FAB 5406, em 17 de maio de 1966, e o FAB 5409, em 21 de novembro do mesmo ano. Serviram como fonte de peças de reposição aos demais. Em 1967, os B-17 ainda voaram cerca de 3.260 horas, mas as condições de manutenção estavam ficando críticas, com mais aviões no solo servindo como doadores de peças para os que estavam em voo, como os FAB 5403, descarregado do inventário em 13 de março de 1967, e o FAB 5407, descarregado em 29 de setembro do mesmo ano.
Em
1968, o número de aeronaves operacionais, apenas duas, chegou a um
ponto crítico, determinando o fim das atividades do B-17 na Força Aérea
Brasileira. Nesse ano, a FAB ainda conseguiu voar, a duras penas, 1.965
horas com os B-17, mas o fim estava próximo. Pouco depois do começo do
ano de 1969, nenhum B-17 voava mais. Em 07 de novembro de 1969, a FAB
descarregou o FAB 5408, seguido rapidamente pelo FAB 5411, no dia 20 de
novembro. Apenas 105 horas foram voadas pelos dois aviões no decorrer de
1969. Ainda em 1968, em 5 de outubro, a FAB tinha doado o FAB 5400,
ainda em condições de voo, para o Museu da USAF.
De
fato, quando a FAB descarregou o FAB 5411, em 20 de novembro de 1969,
encerrou-se a longa carreira dos B-17 militares no mundo., que durou,
portanto, 31 anos, desde a entrada em serviço ativo do primeiro, em
abril de 1938, no USAAC. Alguns poucos B-17 civis ainda ficaram ativos,
nas mãos de organizações de entusiastas da aviação, bombeiros florestais
ou em transporte de carga no Altiplano Boliviano.
De todos os 13 B-17 operados
pela FAB, em quase 19 anos, quatro perderam-se em acidentes, os FAB
5404, FAB 5405 e FAB 5409, além do USAF 44-85579, que nunca recebeu uma
matrícula na FAB. Seis serviram como fonte de peças aos demais, sendo
posteriormente desmanchados, os FAB 5401, FAB 5403, FAB 5406, FAB 5407,
FAB 5409 e FAB 5411.
Sobrevivem até hoje, portanto, apenas três, dos treze aviões. São eles:
FAB 5400: essa aeronave
Boeing B-17G-90-DL, fabricada pela Douglas, c/n 33204, Ex-USAF 44-83663,
entrou em serviço na USAAF em 1º de maio de 1945. Ainda estava em
condições de voo quando foi doada ao USAF Museum, em 5 de outubro de
1968. O USAF Museum considerou a aeronave excedente, pois já tinha
muitas aeronaves do tipo, e cedeu o avião para uma organização privada, a
Yesterday Air Force, onde o B-17 recebeu a matrícula civil N47780. Voou
muitos anos até ser desativada, mas permanece em exposição estática em
Hill AFB, em Ogden, Utah, USA, nas cores da USAAF da Segunda Guerra e
batizado de "Short Bier" (foto abaixo);
FAB 5408:
essa aeronave Boeing B-17G-95-DL, c/n 32359, ex-USAF 44-83718A,
fabricada pela Douglas, ficou estocada por três anos em Recife, após ser
desativada, e depois foi transferida para a Base Aérea de Natal. A Base
Aérea de Natal colocou o avião em exposição estática no Aeroclube do
Rio Grande do Norte no dia do Aviador, 23 de outubro de 1972, com grande
festa. Infelizmente, sem conservação adequada, a aeronave deteriorou-se
muito, e acabou transferida para o Museu Aeroespacial - MUSAL, em 1980.
A aeronave foi desmontada e transportada para o Rio de Janeiro, sendo
as partes maiores, fuselagem e asas, levadas pelo navio Soares Dutra, e
as menores, como partes da empenagem e motores, por caminhão. As partes
que vieram por navio ficaram bastante danificadas no transporte, e
chegaram ao MUSAL em 29 de dezembro de 1980. Foram estocadas no hangar
de restauração do MUSAL por muitos anos, e alguns trabalhos de
recuperação chegaram a ser feitos nesse tempo, até meados da década de
2000. Com a reorganização e remodelação do hangar de restauração do
MUSAL, o avião foi retirado de seu interior e armazenado ao ar livre,
protegido das intempéries por lonas plásticas, e assim se encontra até
hoje, dezembro de 2010. Não existe previsão para a conclusão dos
serviços de restauração desse avião, por falta de recursos financeiros
(foto abaixo);
FAB 5402:
essa aeronave Boeing B-17G-95-VE, c/n 8492, ex-USAF 44-8558, fabricada
pela Vega (Lockheed), depois de retirada de serviço, foi designada para
ficar em exposição estática na sua própria base, em Recife, onde se
encontra até hoje, nas cores e configuração originais do SAR. Embora
esteja ao ar livre, é cuidadosamente preservada pelo pessoal da base e é
a única aeronave do seu tipo preservada no esquema e configuração pelos
quais operou na FAB, pelo menos até uma futura restauração do FAB 5408
do MUSAL. É o único avião B-17 atualmente exposto no Brasil.
Na FAB, os B-17 foram
substituídos pelos Lockheed RC-130E Hércules. O 2º/6º GAV foi desativado
e seu pessoal e equipamento foi transferido para o 2º ETA - Esquadrão
de Transporte Aéreo. O 1º/6º GAV opera até hoje com os RC-130, na mesma
missão original dos velhos B-17, que deixaram saudades na Força Aérea.
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