O Brasil vive um período muito especial nas relações com a Rússia. No caso da Criméia, quase todos os países se definiram contra ou a favor da Rússia, e o chanceler brasileiro, Luis Fernando Figueiredo, fez um inflamado discurso, no qual declarava apenas que “via o tema com atenção”. Ou seja, o Brasil ficou em cima do muro, por razões estratégicas. A presidente Dilma reclamou de forma dura da espionagem norte-americana e cancelou visita a Washington. Esse esfriamento em relação a Barack Obama significa, na prática, uma certa aproximação com a Rússia de Putin. De um lado, Moscou acena com a liberação de carne de porco brasileira. De outro, Brasília pensa em comprar o sistema de defesa antiaérea russo Pantsir-S1. Assim, o Brasil se viu inibido de criticar a invasão da Criméia. Os dois países se encontram frequentemente, como integrantes do grupo de emergentes Brics, que conta ainda com China, Índia e África do Sul – o que gera certa solidariedade entre essas nações.

O lado tragicômico dessa negociação foi a participação do marido da ex-ministra Ideli Salvati, o subtentente-músico Jeferson da Silva Figueiredo, na missão que avaliou o sistema Pantsir-S1. Segundo Veja, o subtenente músico passou duas semanas na terra dos czares, “ajudando a estudar” o sistema russo. No século passado, o então secretário de Estado norte-americano, John Foster Dulles, disse: “Os Estados União não têm amigos, têm interesses”, frase que pode ser aplicada a todos os países. O Brasil tem seus interesses e deve medir com exatidão quais os benefícios e perdas com a aproximação a Putin e o esfriamento das relações com a Casa Branca.
Em sua linha de não se afastar muito, mas de também não se aproximar da Casa Branca, o Brasil deu novos passos em relação à compra de 36 caças Gripen NG da Sueca Saab – o que, nem de longe, agradou à Boeing e a Obama. O acordo assinado pelo ministro da Defesa, Celso Amorim, com os suecos, se refere à troca de “informações sigilosas entre as duas nações” e “outros projetos de interesse na área militar”. Um item positivo é que o Brasil poderá vender Gripens NG a serem feitos aqui para terceiros – vizinhos bolivarianos e países africanos, supõe-se. O acordo prevê que a indústria brasileira poderá suprir 80% dos equipamentos, o que, a princípio, parece exagerado, pois os aviões da Embraer têm mais de 60% de itens importados – alguns dizem que até mais. Como o projeto dos aviões é para 2018, a partir de 2016 vão chegar dez Gripen NG emprestados pela Suécia. Antes disso, o Brasil acertou com a França a construção de cinco submarinos com tecnologia da DCNS, sendo que um deles será de propulsão nuclear.

Tanto o Brasil gera interesse bélico que comentou Konstantin Sivkov, vice-presidente da Academia de Problemas Geopolíticos da Rússia, segundo a Voz da Rússia: “O Brasil faz parte do Brics, e os dirigentes brasileiros percebem que logo que o país comece a aumentar sua influência e a proteger seus interesses e seus negócios em regiões afastadas, ele irá precisar de ter mais meios navais. Para atuar em toda a área do Atlântico Sul, o Brasil irá precisar de submarinos nucleares. Segundo alguns cálculos, o total de submarinos nucleares que o Brasil irá necessitar poderá ser de quatro a cinco unidades”. Sivkov ainda prevê que o Brasil, além do porta-aviões São Paulo – que praticamente não opera – deverá dispor de mais dois porta-aviões. A julgar por esse analista russo, após o primeiro submarino de propulsão nuclear, o Brasil teria de fazer mais alguns.



– Isso será muito importante para o Brasil, especialmente se considerarmos que os EUA já restauraram a sua 4ª Frota, cuja área de atuação inclui a América do Sul – disse Sivkov.