A Alemanha abriu nesta feira uma investigação contra a redação do site Netzpolitik.org por divulgar informações sobre o funcionamento do serviço de inteligência do país. A oposição arremete-se contra a iniciativa do governo.

É a primeira vez em mais de 50 anos que as autoridades da Alemanha acusam uma publicação de alta traição. Andre Meister e Markus Beckedahl são os dois jornalistas do site, especializado no direito digital, que estão sendo investigados por publicar documentos que podem constituir-se segredo de Estado. Beckedahl, além disso, é o editor-chefe da publicação.
Em seu artigo no Netzpolitik.org desta sexta-feira (31), Meister comenta o anúncio do processo penal aberto contra ele e seu chefe dizendo:
“Nós olhamos isso [á investigação] como um ataque à liberdade de imprensa! Já faz muito que os jornalistas e as suas fontes são tratados assim na Alemanha”.

Continuando, afirma que os acusados “não admitirão intimidações” por isso.
A pena aplicada a culpados de alta traição na Alemanha pode ir de um ano à prisão perpétua.

As matérias em questão foram publicadas em 25 de fevereiro de 15 de abril do ano em curso. São baseadas em informações vazadas que indicam que o Serviço Federal para a Proteção da Constituição da Alemanha estudava planos de pedir mais verbas para monitoramento da mídia social e espionagem online.
Neste 30 de julho, o site publicou outra matéria, que trata da nova estratégia do Ministério da Defesa da Alemanha de preparar a base digital para uma possível “ciberguerra” “na quinta dimensão”.
Isso acontece em um contexto de tensão em torno ao escândalo de espionagem da NSA (Agência Nacional de Segurança, dos EUA) com suposta participação do serviço de inteligência alemão, BND. O Bundestag (parlamento da Alemanha) até criou uma comissão que agora ameaça com abrir uma ação penal contra o governo de Angela Merkel por “conluio” com espionagem estrangeira.

Segunda vez na história A última vez que um periódico foi acusado de alta traição na Alemanha deu-se em 1962, quando a revista Der Spiegel tornou-se alvo de buscas e perseguição após a publicação de um artigo com críticas ao estado do Exército alemão. O escândalo terminou com a demissão do então ministro da Defesa.
Protesto
Em outra publicação, uma autora do Netzpolitik informa sobre uma manifestação de protesto contra a decisão das autoridades alemãs.  Os manifestantes irão marchar desde a estação ferroviária de Friedriechstrasse até o prédio do Ministério da Justiça, em Berlim.
A oposição parlamentar também já se pronunciou contra a investigação. Segundo Renate Kunast, do partido Verde, trata-se de uma “desgraça constitucional”.
A Sputnik contatou Hendrik Zorner, secretário de imprensa da União de Jornalistas da Alemanha, para saber a opinião dele no tocante a este assunto. Perguntado se dava razão às autoridades que iniciaram a investigação, Zorner disse o seguinte:
"Não, definitivamente. Eu não considero isso como uma alta traição. Os jornalistas não tinham muita dificuldade em obter as informações que eles divulgaram no blog Netzpolitik.org. Eles escreveram sobre as verbas que o Serviço Federal para a Proteção da Constituição quer usar para financiar os seus novos programas. Isso nada tem a ver com alta traição".
Zorner criticou ainda a postura do presidente do serviço, Hans-Georg Maassen, que "se empenha em impedir todo o tipo de comentários críticos que são feitos a ele, e ele quer assegurar que só sejam publicadas informações que tenham recebido aprovação oficial". E isso, segundo o porta-voz da União de Jornalistas alemã, não é algo positivo. Os jornalistas do Netzpolitik deveriam agora "não ficar nervosos, senão continuar escrevendo" e fazendo o seu trabalho.