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O programa de reaparelhamento das Forças Armadas do Brasil
Fonte: Missao de Paz - Por: Francisco Carlos Teixeira Da Silva[1]

Durante toda a Guerra fria (1947-1991) o Brasil esteve excêntrico aos grandes conflitos internacionais, não participando – em termos de política externa e de defesa – dos grandes eventos políticos, diplomáticos e, mesmo, bélicos internacionais. De certa forma, esta exterioridade do país aos grandes conflitos acabou por gerar um “complexo de ilha”, segundo o qual estaríamos ao largo dos grandes conflitos. Da mesma forma, as pesadas tarefas nacionais – como educação e saúde públicas – imporiam um claro limite com gastos militares. A este sentimento de “ilha”, ao lado de uma falsa garantia de estar ao largo dos conflitos internacionais, somar-se-ia a memória do regime civil-militar no país (1964-1984), quando um grupo de políticos e de membros influentes da sociedade civil assumiram a responsabilidade chamar os militares para administrar autoritariamente o Brasil[2]. Estes três elementos, fortemente presentes no senso comum nacional, explicariam a grande dificuldade de pensar e formular uma política pública de segurança e de defesa.

A própria expressão “segurança nacional” foi, por sua óbvia associação com a doutrina emanada da Escola Superior de Guerra/ESG nos anos de 1960, banida do repertório nacional, obrigando-se os centros de pensamento estratégico à criação de inúmeras metáforas daí decorrentes.

Falar em “rearmamento” no país constitui-se, assim, em levantar uma forte polêmica, principalmente na imprensa e em alguns segmentos da sociedade civil. Visando evitar ao máximo tais debates, as autoridades brasileiras resolveram denominar o atual esforço de modernização das suas FFAA com o termo “reaparelhamento”.

EXPLICANDO O REAPARELHAMENTO DAS FFAA

As três explicações clássicas sobre o caráter relativamente desarmado do Brasil acima expostas (a saber: i. Excentricidade do país; ii. As necessidades sociais da população; iii. A memória do regime militar) podem, e devem, ser contra-arrestadas por argumentos racionais e de forte impacto sobre a sociedade civil, com claro esforço de convencimento sobre os benefícios gerais (incluindo aí a importantíssima área de inovação e de geração de tecnologias de ponta), incluindo a população civil, dos esforços do projeto nacional de reaparelhamento.

  1. O Brasil não é uma ilha!

Em primeiro lugar devemos deixar claro que a condição de relativo isolamento do país, seu complexo de “ilha”, foi já largamente superada e, ou, desmentido. Desde o final da Guerra Fria (com o colapso da União Soviética em 1991) a ordem mundial evolui intensamente em direção a uma ampla conexão de interesses, fluxos e redes, promovendo uma importante unificação mundial, sob a denominação de Globalização.

O paroquialismo de interesses, ou ao menos o regionalismo, foi largamente superado, com a assunção crescente por parte do Brasil de um forte protagonismo internacional. Do ponto de vista físico, por definição, os interesses nacionais são absolutamente continentais e transcontinentais. O Brasil, país continental, com 8.514.877 km2 e com mais 198 milhões de habitantes, esta entre os maiores e mais populosos países do mundo, junto com China Popular, Rússia, Canadá e Estados Unidos. Possuímos, e isto é um dato fundamental, um litoral aberto, de fácil abordagem, com 7.408 quilômetros de extensão – e se contarmos as baías, enseadas e ilhas teremos 9.198 quilômetros de coast line para vigiar e cuidar. Da mesma forma, possuímos 16.885 quilômetros de fronteiras terrestres, com dez diferentes países sul-americanos, muitos nem sempre estáveis e com controle eficaz da ordem interna[3].

O Oceano Atlântico, denominado pela Marinha do Brasil, de forma metafórica, como “Amazônia Azul”, em função da imensa extensão sob responsabilidade nacional e por suas riquezas, foi a própria origem do país. Para o Brasil, que se fez através dos mares, o Atlântico é uma área vital do funcionamento do Brasil. Quase 95% de todo o comércio externo do país, importação e exportação, usam o Atlântico como via principal de acesso ao país. São cerca de 300 bilhões/ano de riquezas (sobre um conjunto de 359 bilhões) que fluem do/para o Brasil através das águas do Atlântico. Além disso, cerca de 90% de todo o petróleo e gás do país encontra-se em zonas off shore do oceano confrontante.

Ao mesmo tempo, cerca de 86% da população do Brasil encontra-se em cidades, das quais a maior parte fica às margens do Oceano Atlântico, dependendo dele diretamente para sua alimentação, transporte, lazer e bem-estar.

Estes são pontos muitas vezes “esquecidos” pela mídia nacional e, mesmo, ignorados pelo homem comum, que devem, desde o inicio, ser fortemente enfatizados ao discutirmos a relevância, valores e eficácia do plano de reaparelhamento das FFAA, em especial da Marinha do Brasil.

Além disso, a nossa Zona Econômica Exclusiva, onde buscamos a pesca – fundamental na produção de alimentos para nossa população – até a exploração de petróleo em águas ultra-profundas, corresponde a cerca de 4.4 milhões de quilômetros quadrados. Esta “outra” Amazônia, a chamada “Amazônia Azul”, precisa, necessita, de imediato patrulhamento e proteção. Até mesmo a relevância da conservação e preservação ambiental deve desempenhar um papel chave na argumentação produzida a acerca da validade do programa de reaparelhamento. Precisamos de meios eficazes para proteção de nossas reservas de piscicultura e os santuários que queremos construir no Atlântico Sul, incluindo aí a área livre da terrível caça de baleias[4].

Da mesma forma a participação brasileira em vários esforços internacionais de disposição de Forças de paz não será possível ser feita caso continuemos com uma panóplia militar sucateada e de má qualidade. A questão das operações de paz (como em Timor, Haiti ou na África) deve ser vista sob tal ângulo: precisamos de pessoal qualificado e de material de alto desempenho em face das exigências do próprio papel do país na comunidade internacional[5].

Podemos assim apresentar razões econômicas, sociais e mesmo ambientais para o desenvolvimento de um projeto nacional que busque eficácia na proteção da nossa chamada “Amazônia Azul”[6].

  1. A emergência de um novo eixo estratégico:

Estas razões para o reaparelhamento das nossas FFAA, em especial da Marinha de Guerra, não são as explicações estratégicas únicas, presentes no necessário planejamento de força do país. Na verdade, as riquezas do país, extensivas ao off shore brasileiro, são antigas e confirmadas a cada momento. Mas, na defesa do país, de suas fronteiras e de seu território – a função constitucional das FFAA, ao lado das ações de manutenção da lei e da ordem no território quando assim sejam convocadas – antecede e transcende a própria existência de tais riquezas. É função das FFAA defender o país, para isso precisa estar devidamente equipada. Um obstáculo nesta direção é o constante axioma do senso comum de que o Brasil é um país pacifico e distante dos principais cenários de conflitos bélicos atuais.

O Ministério da Defesa do Brasil, através dos documentos publicados, entende, hoje, que as transformações ocorridas pós-Guerra Fria afetam diretamente o país. Neste sentido, o término do conflito da bipolaridade (EUA versus URSS) não tornou o mundo um lugar mais seguro. Bem ao contrário, a nova ordem mundial trouxe as chamadas “Novas Ameaças”. Trata-se de um conjunto de fenômenos e eventos, muitas vezes de caráter caótico, sem vinculação direta a um pretenso país agressor (como era o caso no cenário clássico). Para o planejamento brasileiro as novas condições de unificação global, ao lado da emergência de novos centros de poder no mundo, implicam na construção de nova geopolítica para o Brasil. O equipamento militar brasileiro – além de obsoleto em grande parte – foi pensado para outros eventos e conjunto de ameaças, datado da Guerra Fria. Daí a emergência do reaparelhamento das FFAA brasileiras.

Na Nova Ordem Mundial é uma obrigação indeclinável do poder público a atualização dos meios de prevenção e de defesa do país.

Atualmente o Ministério da Defesa, da mesma forma, ‘ entende que a situação do Brasil no cenário mundial alterou-se enormemente desde os anos de 1950. De um país grande e respeitado, mas excêntrico ao conjunto dos decisores mundiais, o país caminha aceleradamente para ser um país central no exclusivo clube de “global player”. Nossa presença em inúmeros fóruns, formais e informais, como o G-20 ou o denominado BRIC, explícita este “novo protagonismo mundial”. Tal protagonismo decorre, ainda uma vez, de nossas riquezas naturais, bem como da obra do próprio povo brasileiro que transformou, nos últimos 20 anos, este país em uma das maiores economias do planeta[7]. Evidentemente a produção de tamanha riqueza fez, e fará ainda mais, crescer a relevância do país no cenário mundial, aumentando sua visibilidade e impondo maiores tarefas na sociedade das nações.

É desta forma que o Ministério da Defesa, publicamente, entende a noção de “redistribuição de poder” na nova ordem mundial, obrigando o país a assumir maiores tarefas nas suas relações internacionais. São um exemplo claro disso as exigências internacionais em torno da presença do país em forças internacionais de manutenção da paz e da ordem – ou mesmo observadores para o cumprimento das decisões da ONU -, muitas vezes em áreas excêntricas aos interesses imediatos do país, como Timor, Nepal, Kossovo ou Sudão. Para o bom, e eficaz, cumprimento de tais tarefas é necessário que o pessoal das nossas FFAA esteja familiarizado com toda ordem de equipamento militar moderno, visando o perfeito desempenho das missões assumidas perante a comunidade internacional.

A assunção de tais responsabilidades é um processo, permanente, de agregação de valor à imagem do país, que passa a ser considerado um fator de estabilidade na comunidade internacional, melhorando claramente nossa capacidade de negociar os interesses nacionais nos grandes fóruns internacionais.

Contudo, é no outro domínio da Ordem Mundial que a posição do Brasil surge enfraquecida no conjunto das relações internacionais. Ao lado da emergência de novos centros mundiais de poder, vemos ainda a emergência das chamadas Novas Ameaças. Tais fenômenos e eventos são de natureza totalmente diversa das ameaças clássicas dos tempos da Guerra Fria. Não se trata mais de estados hostis, visando à desestabilização de um país, a conquista de um território ou o açambarcar de uma fonte de riqueza. Embora estes ainda sejam temas presentes, infelizmente, nas relações internacionais, as chamadas Novas Ameaças caracterizam uma classe inédita de ameaça ao Estado-Nação.

O fantástico crescimento de novos pólos de poder, baseados em vastas e intensas economias industriais (como na Ásia Oriental, Ásia Central e Sudeste Asiático) exerce uma inédita pressão sobre os recursos naturais do planeta. Assim, água potável, energia e alimentos são fontes fundamentais de poder nas relações entre as nações na Nova Ordem Mundial.

O Brasil possui cerca de 12% de todas as reservas mundiais de água potável no planeta – sem referência aos lençóis freáticos – o que permite, entre outros processos, uma brilhante agricultura industrial. Os chamados CAI´s (Complexos agro-industriais) combinam, no Brasil, a oferta de boas terras, água e insolação abundantes com uma moderna indústria moto-mecânica, indústria química e centros de pesquisa da excelência, como a EMBRAPA. Assim, somos uma potência mundial na produção de alimentos, enquanto outros países e continentes, como a China Popular ou a África, não conseguem produzir o mínimo necessário para manter suas populações alimentadas. Desta forma devemos garantir a segurança de nossas áreas agrícolas, a integridade do território, e fundamentalmente a segurança de portos – incluindo aí a emergência da chamada “nova pirataria” – e de rotas marítimas de transporte de tais riquezas[8].

Da mesma forma a produção de energia no país é cada vez maior, combinando a busca de autonomia energética – possível através do sistema swap de tipos de petróleo (a produção brasileira em 2007 foi de 2.277 milhões de barris/dia, o que nos colocou então como o 15º. Produtor mundial) – com a junção de grandes obras de hidrelétricas, baseadas em tecnologia não-agressiva, como no Rio Madeira, Rondônia, (no conjunto do país a produção de energia elétrica é de 40,47 bilhões de kW em 2007) [9], as descobertos do chamado Pré-Sal[10] e a crescente identificação de jazidas de urânio e outros minerais radioativos[11]. Boa parte de tais riquezas ou estão localizados junto ao litoral, como a usina de Angra dos Reis e muitas refinarias, ou dependem de transporte – via navios ou dutos – dependentes do mar.

Em suma, é responsabilidade nossa a defesa de tais riquezas, sua preservação para as gerações seguintes, num mundo marcado pela instabilidade e o caráter difuso das Novas Ameaças.

  1. Há ameaças reais?

O cenário mundial, marcado pelo novo terrorismo de massas, a sofisticação do crime organizado de caráter transnacional e as ameaças às reservas naturais e a biodiversidade são elementos fundamentais das chamadas Novas Ameaças. Os tremendos eventos organizados pelos cartéis de narcotraficantes – dispondo de fonte ilimitada de recursos e com acesso às armas de uso estritamente militar – abalam hoje nações como o México e o próprio Brasil.

Para não se pensar que exageramos fantasiosamente o poder do crime organizado contra o Estado-Nação cabe lembrar que só este ano -2009 e até este momento – autoridades internacionais capturaram 11 submarinos manejados pelo narcotráfico, cada um deles capaz de transportar até 250 milhões de dólares em cocaína. Um deles foi usado por um traficante colombiano operando na cidade de São Paulo[12].

Contudo, outra natureza de ameaças paira sobre um país tão vasto como o nosso (e, nem sempre, tão cuidadoso como deveria ser com a preservação de seu meio-ambiente e de suas riquezas naturais). Trata-se da posição da Amazônia e o debate sobre seu uso e sua preservação no cenário mundial. Para muitas personalidades, organizações (governamentais ou não) e mesmo organismos internacionais a relevância da floresta amazônica (também nem sempre entendida de forma correta) é tão grande para a humanidade, que a soberania brasileira deveria ser apenas relativa ou mesmo abolida sobre a imensa floresta tropical. Para não nos perdermos em citações desimportantes cabe trabalhar com apenas um caso, como se segue.

Em 2001 o prestigiado cientista político e estrategista Pascal Boniface publicou, em Paris, o livro Guerres de Demain (Guerras do Amanhã), onde construía prováveis cenários de grandes guerras que ocorreriam ao longo do século XXI. Um dos cenários construídos, com categoria de elevada probabilidade de conflito, surgia a guerra ambiental, a travar-se em algum momento depois de 2030. Note bene: Pascal Boniface não é um amador qualquer. Trata-se do diretor do Instituto de Relações Internacionais e estratégicas/IRIS da França e Conselheiro do Comitê de Desarmamento junto ao Secretário-Geral da ONU, em Nova York.

Bem, para Boniface é bastante provável que em determinado momento deste século surja uma guerra entre países “preservacionistas” – potências altamente industrializadas do Ocidente – e o Brasil pela posse da Amazônia. Ou nas próprias palavras do estrategista francês: “A Amazônia pertence plenamente ao Brasil. Mas, se as potências ocidentais ignoraram o princípio sagrado da soberania nacional para fazer a guerra na Iugoslávia e ajudar os kossovares (mesmo Kossovo pertencendo plenamente a Servia/Iugoslávia) por que não o fariam contra o Brasil para se apropriar da Amazônia? O pretexto não seria mais a proteção de uma população, mas de toda a espécie humana… isto seria um dever dos outros estados em nome de toda a humanidade[13].

Assim, pode-se constatar, longe de qualquer paranóia ou fantasia, a discussão séria de um a alternativa bélica contra o Brasil num cenário futuro aonde a questão ambiental, o aquecimento global, venha a se constituir em ameaça real ao planeta.

É neste sentido que o Ministério da Defesa entende a necessidade de se constituir uma série de elementos reais, concretos, capazes – não exatamente de vencer ou contra-atacar uma poderosa força-tarefa estrangeira que ameace a integridade do território ou das riquezas nacionais. Mas, sim, de meios de infligir um sério dano a quem ameace a integridade nacional. Na verdade, o programa de reaparelhamento das FFAA brasileiras implica na construção de um poder de dissuasão capaz de fazer difícil, doloroso e altamente custoso qualquer aventura bélica estrangeira que ameace o país.

Por esta razão é a dissuasão a política oficial de defesa do país: trata-se de dissuadir, desestimular, obrigar a avaliar os custos – materiais, humanos, psicológicos – de uma aventura contra o território nacional.

Porém, a eficácia de uma política de defesa dissuasória reside inteiramente na credibilidade das ferramentas de dissuasão. Sem as ferramentas necessárias, com uma panóplia deficiente, não há efeito dissuasor, o que exporia o país a tremendos riscos.

É neste contexto que o reaparelhamento da Marinha de Guerra desempenha um papel central.

  1. A Marinha de Guerra como aparelho dissuasor:

Como vimos antes, o Brasil possui fronteiras terrestres gigantescas com mais de 16 mil quilômetros de extensão, e alguns casos vastidões atravessadas por florestas e pântanos, como a fronteira com a Bolívia (possuímos cerca de 3, 423 km), com Colômbia (1, 644 km) e com Peru (2, 995 quilômetros). Na maior parte das vezes são fronteiras “secas” altamente porosas e usadas por todo tipo de ilícitos transfronteiriços, como contrabando (principalmente de armas), tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Contudo, dado a profunda assimetria existente entre o Brasil e seus vizinhos sul-americanos não esperamos qualquer ameaça bélica, de grande porte, por parte dos países limítrofes. Podermos ter, e já temos, profundos aborrecimentos com o crime organizado. Contudo, trata-se neste caso de impor as necessárias ações da Policia Federal (sempre que necessário com o apoio logístico das FFAA).

Um ameaça bélica, de caráter letal, viria necessariamente de potências tão ou mais fortes que o Brasil e através do Oceano Atlântico. O modelo de ação britânica na Guerra das Malvinas, em 1982, é muito possivelmente a forma padrão como agiria uma força-tarefa estrangeira, de um ou mais países[14]. Uma agressão de tal tipo combinaria o poder naval e aéreo numa ação de apropriação do espaço aeronaval brasileiro, anulação das contramedidas brasileiras e por fim uma operação anfíbia de desembarque. A área entre a foz do Oiapoque, no Amapá, e a Baia de São Marcos, no Maranhão é, muito possivelmente, a área mais frágil, a janela de oportunidades, para uma força agressora estrangeira contra o país.

Outro cenário possível, ainda de forma punitiva contra o Brasil, seria uma operação de apossamento da nossa Zona Econômica Exclusiva – com seus 4,4 milhões de quilômetros quadrados, incluindo aí as explorações off shore de gás e petróleo.

Nestes casos, a política de dissuasão possui um papel central. Ao apresentar ferramentas capazes de dissuadir o hipotético agressor, o país estaria evitando uma tragédia altamente custosa, capaz de causar um dano alguns milhares de vezes mais caros que o valor do reaparelhamento das FFAA. Caso o agressor insista em fazer uma demonstração de força caberia a passagem para etapa complementar da política de defesa nacional: a capacidade de resposta rápida.

A política de reaparelhamento das forças armadas nacionais volta-se, desta forma, para cumprir com estes dois compromissos complementares da Política de Defesa Nacional: dissuadir a agressão externa e projetar poder através de uma pronta resposta em caso de necessidade. Ora a escolha das ferramentas adequadas depende inteiramente desta formulação. Foi assim que se chegou ao conjunto de bens militares em fase inicial de aquisição pelo Brasil.

Submarinos convencionais (diesel/eletricidade) são armas defensivas fundamentais, guardiães das chamadas “águas marrons”, trecho costeiro, junto ao off shore brasileiro. O submarino nuclear, por sua vez, é uma arma ofensiva, de imensa capacidade de ocultamento e de rápido deslocamento, podendo manter-se quase infinitamente submerso – apenas a alimentação da tripulação é um limite – capaz de patrulhar a imensidão da Amazônia Azul e criar um fator de limitação à aproximação de uma força-tarefa agressora. A combinação de submarinos convencionais e submarino de propulsão nuclear cria as condições ideais de defesa do imenso litoral brasileiro, oferecendo eficaz fator dissuasório, com a negação do mar, em condições de alta tecnologia, à força agressora. Da mesma forma, a aquisição de helicópteros e modernos aviões de caça negaria o acesso ao espaço aéreo nacional, protegendo instalações, plantas e depósitos estratégicos à defesa nacional.


[1] Professor Titular de História Moderna e Contemporânea da UFRJ/Coordenador do Laboratório de Estudos do Tempo Presente/TEMPO ( WWW.tempopresente.org ). Professor Conferencista da Escola de Guerra Naval e Professor Emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército brasileiro. Detentor da Ordem do Mérito de Tamandaré.

[2] Existe hoje no campo da história um forte debate sobre a natureza do regime vigente no Brasil entre 1964 e 1985, incluindo aí uma periodização de suas fases mais agudas de arbítrio e o legado destes anos para o Brasil. Para um grupo novo de historiadores a expressão “Ditadura Militar” mais encobre do que explica a realidade, posto que a sociedade civil – mídia, Igreja, empresários, além de vários partidos políticos – participaram intensamente do regime vigente.

[3] Os países com fronteiras terrestres com o Brasil ( sua respectiva extensão )são: Argentina, com 1,261 km; Bolívia, com 3,423 km; Colômbia 1,644 km; Guiana Francesa, com 730 km; Guiana, com 1,606 km; Paraguai, 1,365 km; Peru, com 2,995 km; Suriname, com 593 km; Uruguai, com 1,068 km e Venezuela, com 2,200 km.

[4] Ver: Documento apresentado pelos Governos da Argentina, Brasil e África do Sul à 57ª Reunião Anual da Comissão Internacional da Baleia, em Ulsan,Coréia do Sul, em junho de 2005 A criação do Santuário visa a aperfeiçoar o manejo não letal dos estoques baleeiros, com benefícios para a pesquisa científica benigna; para desenvolvimento do turismo de observação de baleias, fonte de criação de empregos e geração de renda; para a educação ambiental; para a projeção, no plano regional em longo prazo, de medidas de conservação; e para a consecução dos objetivos expressos no Artigo 65 da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, que estabelece que os Estados devam cooperar com vistas a assegurar a conservação, gestão e estudo dos cetáceos, através das organizações internacionais apropriadas.In:http://www.baleiafranca.org.br/oprojeto/publicacoes/SantuarioAtlanticoSul.pdf.

[5] De qualquer forma devemos ter certo condado em não exagerar no papel das chamadas “Operações de Paz”. As FFAA brasileiras não devem assumir um papel de polícia internacional sob mandado da ONU. FFAA foram constituídas, precipuamente, para a defesa da soberania nacional. Sua especialização em força de paz – além das distorções internas na formação dos quadros superiores da hierarquia militar – geraria um crescente desinteresse pela tática e pela doutrina diretamente voltada para o embate, com material pesada, resultando em risco para a própria capacidade de combate da tropa.

[6] Ver VIDIGAL, Armando. Amazônia Azul. O mar que nos pertence. Prefácio e Introdução de Francisco Carlos Teixeira da Silva. Rio, Record, 2003.

[7] Em 2008, utilizando o sistema de paridade de valor com o dólar, o PIB brasileiro foi de 1.993 trilhões de dólares, estando Brasil na décima posição entre as grandes economias globais. Da mesma forma, as reservas do país ultrapassaram, em 2009, os 200 bilhões de dólares, colocando país na sétima posição mundial enquanto estoque financeiro.

[8] A safra agrícola brasileira em 2008 atingiu a cifra de 140.5 milhões de toneladas, ocupando uma área de 46.5 milhões de hectares.

[9] Para uma análise das possibilidades da energia elétrica no Brasil ver: Atlas da Energia Elétrica no Brasil ( ANEEL) http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/Atlas/apresentacao/apresentacao.htm

[10] No momento, há uma enorme especulação sobre quantos barris de petróleo pode conter o pré-sal. Uma estimativa não-ufanista feita pelo Credit Suisse, fala em algo entre 30 e 50 bilhões de barris – o que já aumentaria em cerca de quatro vezes as reservas provadas brasileiras, que contavam com 12,1 bilhões de barris em janeiro deste ano. Mas os números podem ser ainda maiores. Alguns acreditam que o pré-sal poderia esconder no mínimo 100 bilhões de barris – o que colocaria o Brasil em 6º lugar entre as maiores reservas de petróleo do mundo. Já outros, como um ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo, Newton Monteiro, chegam a afirmar que o pré-sal pode guardar 338 bilhões de barris, o que faria do Brasil o maior detentor de reservas provadas do mundo, superando de longe a Arábia Saudita – hoje com 264 bilhões de barris. Para efeito comparativo, se o preço por barril de petróleo cair para US$ 100 dólares, os 338 bilhões de barris dariam uma renda em potencial de US$ 33,8 trilhões de dólares. Quase três vezes o PIB dos Estados Unidos ou 19 vezes o PIB brasileiro. Ver: http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/especiais/especiais/petroleo/entenda-o-que-e-a-camada-pre-sal

[11] O Brasil, segundo dados oficiais (INB – Indústrias Nucleares do Brasil S.A.), ocupa a sexta posição no ranking mundial de reservas de urânio (por volta de 309.000t de U3O8 ). Segundo esta empresa, apenas 25% do território nacional foi objeto de prospecção, e as duas principais delas são a de Caetité (mina Lagoa Real), e Santa Quitéria (Ceará).Descoberta em 1976, a mina de Caetité é feita a céu aberto, numa das 33 ocorrências localizadas numa faixa com cerca de 80 km de comprimento por 30 a 50 km de largura. Localizada a 20 km da sede do município, o complexo instalado produz um pó do mineral, conhecido por yellow cake. Esta reserva possui um teor médio de 3.000 ppm (partes por milhão), capaz de suprir dez reatores do porte de Angra 2 durante toda sua vida útil.

[12] Ver The Miami Herald: Traffickers assembling navy of drug-toting subs., em 28 de junho de 2009, p. 3.

[13] BONIFCE, Pascal. Les Guerres de Demain, Paris, Seuil, 2002, PP.107/108.

[14] Ver KEEGAN, John. Inteligência na Guerra. São Paulo, Companhia das Letras, 2006.