Há uma corrida contra o tempo nos escritórios da Airbus, em Toulouse, na França. Ali, a principal missão dos executivos é impedir que os recentes incidentes envolvendo sua grande estrela, o modelo A380, coloque em xeque a reputação do maior avião de passageiros do mundo.

Os problemas começaram há cerca de 15 dias, quando algumas peças de um dos quatro motores do A380 da companhia aérea australiana Qantas Airways se soltaram em pleno voo depois de um incêndio na turbina. O avião, que fazia a rota Austrália-Cingapura com 433 passageiros a bordo, fez um pouso forçado e ninguém se feriu.

Mas a Qantas, que nunca registrou nenhum acidente com seus aviões, achou melhor deixar os seis modelos no chão até que os motivos do incidente sejam esclarecidos. A Singapore Airlines seguiu a concorrente e também preferiu não operar o A380 até que fossem apontadas as causas e as soluções para o problema.

Uma semana depois foi a vez de a maior companhia aérea do mundo, a Lufthansa, afirmar que uma de suas aeronaves A380 teve de retornar ao terminal de passageiros quando se preparava para a decolagem porque o piloto notou algum problema com o trem de pouso. “Acidentes são raros e eles podem acontecer com qualquer aeronave.

Estamos trabalhando rapidamente para reparar o problema”, disse à DINHEIRO John Blanchfield, diretor técnico da Airbus. Ele tem razão. Acidentes acontecem com qualquer tipo de avião. O problema é que o A380 já nasceu sob o signo da desconfiança e não só pelo tamanho assustador – de perto o avião parece um transatlântico com asas.

O projeto consumiu 2 bilhões de euros acima do orçamento original de 10 bilhões de euros e demorou dez anos para ser concluído – só o primeiro avião teve atraso de um ano e meio para ser entregue à Singapore Airlines. Depois de uma década de atrasos, prejuízos contábeis e alguns executivos demitidos, a Airbus, dona de um faturamento anual de 28 bilhões de euros, parecia finalmente preparada para desfrutar de sua maior aposta comercial.

John Blanchfield, diretor técnico da Airbus

Afinal, a expectativa é de que sejam comercializadas 1,7 mil aeronaves nos próximos 20 anos. A considerar os capítulos mais recentes dessa história, porém, pode ser que a companhia tenha de esperar mais um pouco. Seus executivos, é claro, adotam outro discurso. “Só em 2010 já entregamos 16 aviões e outros quatro serão entregues até o fim do ano”, disse Blanchfield. Esses últimos, porém, estão em compasso de espera até que a Rolls-Royce, uma das fabricantes dos motores, solucione o vazamento de óleo das turbinas.

Esse foi o problema que motivou o acidente com o avião da Qantas. Quando questionado sobre o prazo – afinal, faltam menos de 40 dias para o fim do ano, Blanchfield diz apenas estar “confiante” no futuro. As investigações estão sendo acompanhadas por autoridades francesas, inglesas, além de técnicos da Airbus e da Rolls-Royce.

“Mas se ficar comprovado que é uma falha de projeto, a imagem da Airbus ficará abalada no mercado”, diz Respício Espírito Santo, professor de transporte aéreo da Escola Politécnica da UFRJ. Atualmente, 39 aviões A380 estão em operação. Desses, seis pertencem à companhia australiana, 11 são da Singapore Airlines, 14 da Fly Emirates, quatro da alemã Lufthansa e outros quatro pertencem à Air France.

Incêndio na turbina do avião da Qantas acendeu a polêmica e pôs em dúvida a segurança do A380

De acordo com os números da Airbus, há 234 pedidos do modelo e outras 196 ordens de compra que funcionam como uma espécie de carta de intenções. Cada exemplar da mega-aeronave custa a partir de US$ 350 milhões. Apesar do histórico de problemas, do ponto de vista do marketing, o A380 ainda é uma grande promessa para os desafios atuais da aviação comercial.

De um lado, há uma demanda de passageiros que não para de crescer – embora a taxas mais modestas nos mercados maduros como Estados Unidos e Europa. Na outra ponta, há a crescente pressão de ordem ambiental e o tráfego aéreo tem sido apontado como um dos maiores vilões do aquecimento global com suas emissões estratosféricas de gases poluentes. E o A380 aparece como uma boa resposta a essas questões.

Vinte e cinco por cento da estrutura do superavião é fabricada com fibra de carbono. Na prática isso significa reduzir em 15% o peso total da aeronave. O avião tem o menor consumo de combustível por assento – cerca de três litros por poltrona a cada 100 quilômetros voados –, contra cinco litros de combustível consumido, em média, por outros Jumbos.

Na ponta do lápis, a economia para a companhia aérea pode chegar a US$ 7,9 milhões por ano. Até o momento, porém, não se tem notícia do repasse dessa economia para os preços das passagens em nenhuma das cinco empresas aéreas que operam o A380. Joaquim Toro-Prieto, diretor de marketing da Airbus, disse que ainda não há previsão de venda do A380 para companhias da América Latina. “Sabemos que a Air France está em negociações para operar o A380 no México e possivelmente no Brasil. Mas não há nada concreto.”

Com 600 milhões de habitantes e com uma das economias que mais crescem no mundo, a América Latina está na mira da Airbus. “A região responde por apenas 6,2% do tráfego aéreo mundial, o que mostra um enorme potencial de crescimento”, diz Prieto. E não é só a demanda que atrai a cobiça da indústria.

Prieto lembra que a consolidação do mercado aéreo está apenas começando na América Latina – primeiro com a fusão de Avianca e Taca e mais recentemente com a chilena LAN e a brasileira TAM. “Temos um mercado incrivelmente promissor pela frente”, diz Prieto.

Fonte: Eliane Sobral (IstoÉ Dinheiro) - Imagens: Reprodução - Via: Noticias Sobre Aviação