Alta fonte da Marinha brasileira criticou, nesta sexta-feira, a declaração do almirante norte-americano James Stavridis, comandante da recém-criada 4ª Frota dos Estados Unidos, que irá navegar nos oceanos Atlántico e Pacífico da América Latina. Stavridis disse, na véspera, que é intenção de seu país respeitar as reivindicações marítimas do Brasil, inclusive nas reservas petrolíferas de alto-mar. Segundo o comandante, a nova frota tem objetivos pacíficos mas, de acordo com a alta patente naval brasileira, que optou pelo sigilo de sua identidade por razões de segurança, é "descabida a mensagem" do militar norte-americano.

- Que os EUA precisam respeitar o limite das 200 milhas soberanas do Brasil é parte dos direitos brasileiros, segundo a legislação internacional, que não precisam ser ratificados pelo comandante da 4ª Frota ou de qualquer outra frota no mundo. Invadir as águas nacionais brasileiras seria um ato hostil e sem sentido, diante da série de acordos que o Brasil mantém com os EUA, o que torna ainda mais descabida a declaração do almirante - afirmou.

O presidente da Agência Nacional do Petróleo, Haroldo Lima, no entanto, externou sua preocupação com a possibilidade de os EUA contestarem a posse brasileira sobre as enormes reservas petrolíferas na chamada zona econômica exclusiva. Segundo a Convenção da ONU sobre a Lei do Mar, de 1994, os Estados litorâneos têm direitos exclusivos sobre todos os recursos naturais do seu litoral numa faixa de até 200 milhas náuticas (370 quilômetros).

Segundo o ministério da Ciência e Tecnologia, no entanto, de acordo com a ata da XIV Reunião Ordinária do Fundo Verde Amarelo, de 15 de dezembro de 2004, realizada no Rio de Janeiro, o limite das águas continentais brasileiras pode se extender além das 200 milhas convencionadas pela ONU. A armada nacional poderá apoiar quaisquer pesquisas que visem ao aproveitamento dos "bens econômicos existentes na Zona Econômica Exclusiva/ZEE (massa líquida e subsolo marinho) do Brasil", diz o documento.

Ainda segundo a ata, "acrescenta-se à ZEE a extensão da Plataforma Continental que ultrapassa o limite das 200 milhas marítimas onde o país possui os direitos soberanos, desde que mantenha pesquisa na região. Tal região dá ao país um domínio de 4.451.766 Km2 (52% do território nacional). Além disso, a presença de pesquisadores nos rochedos de São Pedro e São Paulo garante a soberania do Brasil das 200 milhas marítimas ao seu redor, acrescentando a nossa Amazônia Azul uma área de 450 mil Km2".

Narcotráfico

A 4ª Frota dos EUA foi recriada pelo governo do presidente norte-americano, George W. Bush, após ter sido desabilitada, há 58 anos. De acordo com o comandante Stavridis, o conjunto de armamentos flutuantes ajudará a combater o narcotráfico na América Latina e no Caribe. Mas isso, segundo ele, não significa uma intensificação nas operações contra o tráfico.

- Não é de forma nenhuma uma força ofensiva - adiantou.

Ele admitiu, porém, que a presença da frota é "objeto de preocupação" na região, mas o almirante disse que a armada prestará apoio às missões de paz, prestará auxílio humanitário e participará de exercícios navais.

- O maior navio que vai trabalhar para a 4ª Frota é um navio-hospital - garantiu Stavridis aos jornalistas.


Brasil analisa contraproposta da Onu sobre mar territorial

O governo brasileiro ainda não decidiu se aceita a proposta da Comissão de Limites da Plataforma Continental, de aumentar em cerca de 700 mil quilômetros o mar territorial brasileiro, ou se reitera o pedido de 950 mil quilômetros quadrados, feito em 2004 depois de um extenso levantamento que durou 18 anos e custou cerca de R$ 100 milhões.

"A proposta da Comissão (grupo da ONU encarregado de analisar demandas de países interessados em garantir soberania sobre a plataforma continental) está sendo estudada pelos técnicos brasileiros e a decisão ainda não foi tomada", disse o oficial da reserva da Marinha Alexandre Tagore Medeiros de Albuquerque, atual presidente da Comissão e assessor técnico da Diretoria de Hidrografia e Navegação da Marinha brasileira.

Ele disse que a tendência do grupo técnico que analisa a contraproposta da Comissão da Onu - embora seja presidente da comissão, ele não participou da análise deste caso - é de recusar a oferta da Comissão e refazer os argumentos técnicos para ter direito à área total pretendida inicialmente.

"Mas claro que tudo depende da decisão política, que pode ser diferente", afirmou.

Se aceito, o pedido brasileiro vai elevar para quase 4,5 milhões de quilômetros quadrados o mar territorial brasileiro, quase metade do território terrestre do país.

A Marinha cunhou a expressão "Amazônia azul", para designar a área, de potencial científico e econômico ainda desconhecido devido à falta de estudos sobre o mar.

"O Brasil não conhece o mar. Ainda é visto como fonte de lazer e de pesca, apenas. É preciso investir para aprofundar o conhecimento sobre o mar", diz o comandante reformado da Marinha Antonio José Teixeira.

Outras propostas

Desde que foi criada, além da proposta brasileira, a Comissão já analisou as reivindicações da Rússia e da República da Irlanda.

Estes países também já receberam os relatórios da Comissão com as contra-propostas, aceitando parcialmente a área reivindicada. Até agora, nenhum país enviou a resposta concordando com a área oferecida ou reafirmando o pedido original.

Austrália e Nova Zelândia, com interesse na Antártida, enviaram os estudos à Comissão com pleitos similares mas pediram que as propostas ficassem apenas arquivadas e não fossem analisadas por enquanto.

O Tratado da Antártida, firmado em 1961, renovado em 1991 e revisado em 1998, congelou até 2048 as pretensões territorialistas.

De acordo com o comandante Tagore, o interesse desses países é marcar posição e ter os estudos já prontos se um dia os acordos internacionais forem alterados para permitir a exploração comercial da Antártida.

Foram enviados também para análise da Comissão os pedidos da Noruega, França (referentes ao departamento ultramarino de Guiana Francesa e à possessão de Nova Caledônia) e um pedido conjunto da Espanha, França, Irlanda e Reino Unido no golfo da Biscaia, no norte da Espanha.

''Balão de ensaio''

Em outubro do ano passado, o jornal britânico The Guardian publicou uma reportagem afirmando que o governo britânico também está planejando entrar com um pedido de plataforma continental em ilhas britânicas próximas à Antártida, mas até agora o pedido não foi oficializado, de acordo com o presidente da Comissão.

A reportagem provocou grande polêmica entre os países que têm base na Antártida, já que o Tratado não permite soberania sobre nenhuma área, mas a percepção é de que se trata de um "balão de ensaio" lançado para ver a reação dos outros países.

Existe uma incerteza jurídica, de acordo com especialistas brasileiros, sobre os limites entre a Convenção da Onu sobre o Direito do Mar e o Tratado da Antártida se houver uma intersecção das zonas atingidas por eles.

O entendimento dos países não territorialistas, como o Brasil, é que o limite para a reivindicação de território é o paralelo S60, onde começa o território da Antártida, até o pólo sul.

Qualquer modificação no Tratado da Antártida tem que ser feito durante as reuniões anuais do grupo. A próxima ocorre em São Petesburgo, na Rússia, em maio.

"Vamos ver se eles se manifestam, porque às vezes saem algumas notícias que não são confirmadas pela chancelaria", afirmou o comandante Eron de Oliveira Pessanha, encarregado da Divisão de Operações do Programa Antártico Brasileiro.


EUA respeitam mar do Brasil, diz comandante
IURI DANTAS
Folha de S. Paulo

O comandante do Comando Sul dos Estados Unidos, almirante James Stavridis, tentou ontem eliminar suspeitas sobre a atuação norte-americana nos mares da América do Sul e Caribe dizendo que seu país respeitará os limites territoriais também no oceano. "Os EUA vão respeitar os mares territoriais e as Zonas Econômicas Exclusivas das nações do mundo", disse Stavridis, na 4ª Conferência de Defesa do Cone Sul.
A declaração de Stavridis serve de resposta ao presidente da ANP (Agência Nacional de Petróleo), Haroldo Lima, que defendeu anteontem ações de defesa para proteger a ZEE brasileira porque "os Estados Unidos não respeitam muito esse negócio de 200 milhas."
Segundo a Convenção de Montego Bay, da qual o Brasil é signatário, o país tem mar territorial de 12 milhas náuticas e ZEE de 188 milhas. Esta zona pode ser estendida até 300 milhas, se houver prolongamento da plataforma continental no fundo do oceano, o que pode ser verificado tecnicamente.
Boa parte das novas reservas de petróleo localizadas pela ANP se localizam na ZEE, na chamada camada pré-sal. A apreensão de Lima também se justifica porque os EUA assinaram, mas não ratificaram a convenção. Outro motivo de preocupação, principalmente entre militares brasileiros, é a recriação da 4ª Frota dos EUA, responsável pela área do Caribe e da América do Sul.
A 4ª Frota será composta por dois navios-hospitais, mais voltada a ações de alívio humanitário e casos de desastres naturais, disse Stavridis.
A preocupação do presidente da ANP não é compartilhada pela Marinha brasileira. Segundo o chefe do Estado Maior de Defesa, almirante-de-esquadra Marcos Martins Torres, não há chance de violação da ZEE pelos EUA. "Vejo pelo que foi apresentado, antes de receber comunicação oficial sobre a 4ª Frota, que existe respeito à soberania de cada país. Não temo essa quebra de soberania, isso não vai ocorrer", disse, ao lado de Stavridis. Segundo o almirante, embarcações estrangeiras sempre informam a Marinha sobre a entrada na ZEE.

USN treinando no mar de 200 milhas do Brasil em Video: