Esqueça o 14 Bis. A aeronave mais influente da história é outra obra de Santos Dumont: o Demoiselle, que popularizou a aviação no mundo todo.
"Esse aparelho, o Nº 19 do brasileiro, representou uma mudança radical na forma dos aviões", dizo físico Henrique Lins de Barros, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, no Rio de Janeiro, e especialista no assunto. Uma mudança que, cedo ou tarde, iria parar em todos os outros aviões, inclusive nos dos irmãos Wright.
A chave para isso foi uma iniciativa audaz de Dumont: colocar o "rabo" do avião no devido lugar, a parte de trás. O que vai ali são aquelas duas asinhas menores, que formam uma peça chamada leme profundor - uma das partes responsáveis por levantar e baixar o avião durante o vôo. E a tradição de colocá-la no "lugar errado" (a parte da frente) vinha desde o fim do século 19. Tudo por razões de segurança. Depois que o construtor de planadores alemão Otto Lilienthal morreu em um de seus inventos, em 1896, seus seguidores decidiram manter o leme à frente. Isso porque Lilienthal tinha sido vítima de um estol (do inglês stall, fenômeno em que o aeroplano aponta para cima, perde sustentação e cai de bunda). Para evitar essas empinadas, todos os inventores da época acharam crucial deixar esse leme na parte da frente.
Só tem um problema: essa configuração deixa a máquina bem mais instável no ar - o piloto precisa estar sempre atento aos controles para mantê-la em vôo, do mesmo jeito que um ciclista não pode largar o guidão. Convenhamos, não é a melhor coisa do mundo num avião, que cobra caro por qualquer falha humana.
Por isso, os pioneiros acharam melhor não arriscar. E foi com a parte "de trás" colocada na frente que os irmãos Wright realizaram, em Kitty Hawk, Carolina do Norte (EUA), os primeiros vôos motorizados da história. Os outros aspirantes a aviador usaram sistemas parecidos, inclusive Santos Dumont. O 14 Bis, por exemplo: tem aquele bico enorme na ponta justamente para abrigar o leme. Graças a isso, aliás, o primeiro avião de Dumont não costuma ser chamado de 14 Bis em lugar nenhum fora do Brasil. Lá fora, conhecem a aeronave pelo apelido: Canard ("pato", em francês).
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