Brasil acelera programa de construção de submarino nuclear
Para acelerar o desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro, a Marinha decidiu criar uma nova estrutura para tratar do programa. O comandante da Marinha, Júlio de Moura Neto, convocou o almirante de esquadra da reserva José Alberto Accioly Fragelli, ex-comandante do Estado Maior da Armada, para assumir a Coordenadoria Geral do Programa de Desenvolvimento do Submarino Nuclear, que será criada nesta sexta-feira (26) no Rio.
A medida é um dos primeiros passos da Força para retomar a construção de submarinos convencionais no Arsenal do Rio, de onde o último dos cinco submarinos da frota brasileira saiu em 2005, para alcançar o projeto de um casco capaz de receber o reator nuclear.
Com a decisão do Brasil de fechar um acordo bilateral com a França para a transferência de tecnologia para a construção de quatro submarinos convencionais visando ao nuclear, a Marinha terá de preparar o Arsenal do Rio para retomar a construção desse tipo de embarcação no País. O último submarino construído no Rio, o Tikuna, foi incorporado à Armada em 2005.
A decisão do Brasil pela França, anunciada no início da semana pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, era o que faltava para a Marinha voltar a planejar a construção de submarinos. Os oficiais temiam que a demora tornasse obsoleta a plataforma montada no Arsenal do Rio.
O modelo a ser adotado deverá ser o Scorpene, classe de submarinos franceses vendida a países como Chile, Malásia e Índia. Os cinco submarinos convencionais da frota brasileira foram construídos a partir de uma plataforma alemã. O Tikuna é uma versão aperfeiçoada dos quatro anteriores, da classe Tupi. O primeiro deles foi construído na Alemanha, em 1989, num acordo de cooperação que transferiu tecnologia para a construção dos outros no Arsenal da Marinha no Rio. O Brasil esteve prestes a assinar um novo acordo com a Alemanha para a construção de novos submarinos, que tinha até previsão de financiamento, mas voltou atrás com a retomada do projeto nuclear este ano. Ao contrário da França, a Alemanha não tem submarinos nucleares.
"Precisamos dos submarinos convencionais, que são mais adequados para o controle de águas mais perto da nossa costa. Além disso, ele vai dar o embasamento necessário para alcançarmos o submarino nuclear", declarou o almirante Álvaro Luiz Pinto, comandante de Operações Navais da Marinha. Para ele, o projeto do submarino nuclear consumirá ainda pelo menos dez anos.
Apesar da decisão pela França, o almirante disse que ainda é cedo para prever quando o Arsenal do Rio estará adaptado para começar a linha de produção dos submarinos com tecnologia francesa. Ele espera abrir a linha de produção de submarinos em 2010. "Nada foi assinado ainda", adverte.
Jobim já anunciou que o acordo será assinado no final de dezembro, quando o presidente francês Nicolas Sarkozy virá ao Brasil. O tratado, que o ministro classificou de "estratégico", não se restringe aos submarinos. A França também vai transferir tecnologia para a construção no Brasil dos helicópteros E-725, a cargo da Helibras. Na área de treinamento, a França também ajudará na formação de agentes especiais, principalmente do Exército.
O ministro também quer ir às compras para adquirir mais navios para a Marinha e concretizar seu plano de descentralização da Força com a criação de duas novas esquadras. Jobim quer bases no Nordeste e na Foz do Amazonas. No entanto, as aquisições deverão privilegiar a indústria naval nacional, uma das diretrizes do Plano Estratégico de Defesa que o governo promete para outubro.
Primeiro submarino nuclear brasileiro deve ficar pronto até 2021, diz Marinha
colaboração para a Folha Online, no Rio
O primeiro submarino nuclear brasileiro deverá estar pronto até 2021. A afirmação foi feita nesta sexta-feira pelo comandante da Marinha, almirante Julio Soares de Moura Neto. Ele também antecipou que o estaleiro dedicado ao submarino deve ser construído na área de Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio.
"Queremos fazer na área da Baía de Sepetiba, que fica perto dos pólos industriais de Rio e São Paulo, da Nuclep [Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A.], das usinas de Angra 1 e 2 e do porto de Itaguaí", disse.
Moura Neto participou no Rio de Janeiro da posse do almirante José Alberto Accioly Fragelli como coordenador-geral do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear.
De acordo com Moura Neto, a primeira etapa do programa, que envolve o ciclo de enriquecimento do urânio no Centro Experimental de Aramar, em Iperó, interior de São Paulo, já está concluída. A construção de uma planta nuclear de produção de energia elétrica está em fase final.
O comandante da Marinha assinalou que quatro submarinos de propulsão convencional começarão a ser fabricados --ainda no Arsenal da Marinha, na capital fluminense-- a partir do ano que vem. Ao mesmo tempo, o projeto do nuclear terá início. Segundo este cronograma, em 2014 o primeiro convencional fica pronto e o nuclear entra em fabricação na área de baía de Sepetiba. O casco será desenvolvido em conjunto com a França. O primeiro submarino nuclear brasileiro deve ficar pronto seis ou sete anos depois disto.
Para o almirante, as descobertas de petróleo na camada pré-sal geram maior necessidade de modernização dos equipamentos da Marinha. "O submarino nuclear reforça a capacidade dissuasória do país diante de qualquer país do mundo. A Marinha tem que ter capacidade de tomar conta das nossas águas. A capacidade de Defesa é o que faz que os países nos respeitem".
A construção do submarino nuclear, equipado com torpedos e mísseis, está prevista na Estratégia Nacional de Defesa, desenvolvida pelos ministros Roberto Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) e Nelson Jobim (Defesa). O custo estimado é mais que o dobro do referente a um submarino de propulsão convencional (US$ 600 milhões).
O projeto não fará parte do orçamento da Marinha para 2009 (cerca de R$ 2,7 bilhões), pois deve ser feito com financiamento externo. A Marinha espera gerar pelo menos 600 empregos diretos no país durante o processo.
Precursor do projeto, iniciado em 1979, o atual presidente da Eletronuclerar, almirante da reserva Othon Luiz Pinheiro da Silva, também esteve presente no evento. Ele avaliou que, pelo tamanho da costa brasileira, o país precisa de pelo menos seis submarinos nucleares, apesar da "vocação para a paz" do país. "Defesa tem que ter para não usar", disse.
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Retomada do projeto do submarino nuclear
não pode depender de oscilação orçamentária
CLÁUDIO CAMARGO - Fonte: Isto é
Mais do que apenas fazer declarações em conversas reservadas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem feito movimentações concretas para retomar por completo o programa do submarino nuclear brasileiro. O primeiro passo nessa direção foi dado no ano passado, com a liberação de R$ 1,1 bilhão para a conclusão do reator nuclear desenvolvido pela Marinha. O próximo passo será dado nos próximos dias, quando os ministros Nelson Jobim, da Defesa, e Mangabeira Unger, das Ações a Longo Prazo, embarcarem para a França e para a Rússia em busca de alianças estratégicas e cooperação tecnológica. Os dois ministros serão acompanhados pelo comandante da Marinha, almirante-de-esquadra Júlio Soares de Moura Neto.
O programa do submarino nuclear brasileiro foi iniciado em 1979, interrompido na década de 1990 – por dificuldades financeiras e pressões americanas – e parcialmente retomado meses atrás. Ele é composto de três etapas básicas: o domínio do ciclo do combustível nuclear, a fabricação do reator e a construção do casco do submarino. A primeira parte foi muito bem-sucedida: graças aos esforços do Centro de Pesquisas da Marinha, em Aramar, o Brasil hoje domina a tecnologia de enriquecimento de urânio, desenvolvido através do método das ultracentrifugadoras. A segunda fase, a da construção do reator, está bastante avançada, restando apenas recursos para sua finalização – o R$ 1,1 bilhão liberado em 2007. A última etapa, a da fabricação do casco, exige muita sofisticação tecnológica e ainda necessita ser desenvolvida. É exatamente nessa etapa que reside a importância da viagem dos ministros.
KNOW-HOW Os EUA têm a maior frota de submarinos nucleares do mundo e apenas três estaleiros para construí-los |
Apesar dos avanços recentes, o caminho a percorrer ainda é longo. A fabricação de um submarino nuclear, da concepção do design básico e ao detalhamento da engenharia, é um processo que exige de 12 a 14 anos de trabalho, de acordo com estudo da Rand Corporation, centro de estudos americano. Pelas dimensões desse tipo de embarcação – comprimento de cerca de 90 metros por dez metros de diâmetro –, a fabricação demandará instalações que, no Brasil, só a Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A. (Nuclep) tem atualmente. A fase mais longa desse processo, que dura de oito a dez anos, é a montagem do submarino, que exigirá um tipo específico de estaleiro, de que o Brasil ainda não dispõe. Os Estados Unidos, que têm a maior frota de submarinos nucleares do mundo, possuem apenas dois estaleiros para construí- los. A Rússia tem três estaleiros, a França dois e o Reino Unido e a China, um cada um.
Duas conseqüências advêm dessa situação. A primeira é que a decisão de construir o submarino nuclear é estratégica, uma decisão de Estado, que não pode ficar ao sabor de contingências orçamentárias, como aconteceu até o ano passado. A maturação de um projeto dessa natureza é necessariamente de longo prazo e implica investimentos constantes para que se chegue a bom termo. A segunda é que o Brasil provavelmente deverá buscar formas de cooperação internacional para a construção e montagem do casco do submarino nuclear. Mas o desafio da missão dos ministros no Exterior é o de obter cooperação sem, contudo, trazer consigo a dependência. Veja-se o caso da Índia, que deve lançar seu submarino nuclear ao mar já em 2009. Para treinar as futuras tripulações, os indianos arrendaram da Rússia um SNA por três anos. A Rússia também prestou assistência tecnológica para que a Índia desenvolvesse seu submarino.
A retomada do programa do submarino nuclear no Brasil também não pode ser vista como uma resposta conjuntural às supostas ameaças de vizinhos instáveis. É um programa de longo prazo, que só começará a produzir resultados concretos entre 2020 e 2024. A tarefa de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva incumbiu o ministro Nelson Jobim é estabelecer os objetivos de longo prazo do Brasil e preparar uma capacitação tecnológica e industrial para tal desafio, em lugar de buscar na prateleira os equipamentos militares de que necessitamos. Daqui a uma década, os desafios serão outros. Em 2020, o petróleo estará bem mais escasso no mundo e o Brasil, com a perspectiva de desenvolver as novas jazidas na Bacia de Santos, estará entre os primeiros exportadores do mundo. Teremos também, com a descoberta de novas jazidas de urânio no Ceará, a primeira ou segunda reserva desse minério do mundo. Os interesses a proteger serão, portanto, muito mais extensos e diversificados do que os que hoje conseguimos enxergar.
INICIATIVA Moura Neto levou Lula para conhecer o projeto de Aramar
Entrevista com o comandante da Marinha, almirantede- esquadra Júlio Soares de Moura Neto.
“Vamos enriquecer aqui todo nosso urânio”
ntegrante de uma família tradicional de oficiais da Armada, o comandante da Marinha, almirantede- esquadra Júlio Soares de Moura Neto, é um grande defensor do projeto do submarino nuclear. Nomeado em fevereiro de 2007, ele conseguiu sensibilizar o presidente Lula sobre o tema ao levá-lo para conhecer o Centro Experimental de Aramar, em Iperó (SP), que estava em estado quase vegetativo. Depois disso, o governo liberou R$ 1,1 bilhão, em parcelas de R$ 130 milhões anuais, fora do orçamento da Marinha, para a conclusão do projeto do reator nuclear desenvolvido pela força em Aramar. Nesta entrevista a ISTOÉ, Moura Neto diz que o Brasil terá condições de enriquecer todo o urânio de que necessita para as usinas de Angra 1, 2 e 3 e futuramente para o submarino.
ISTOÉ – Por que o Brasil precisa de um submarino nuclear?
Almirante Moura Neto – O submarino é uma arma precisa, extremamente valorosa em termos de dissuasão. É o único navio que, por andar debaixo d’água, obriga os navios de superfície um grande esforço para poder localizá-lo. Mas um submarino convencional tem muitas limitações: ele é movido por motor elétrico alimentado por grandes baterias, que precisam ser recarregadas pelo processo de snorkel. Isso o obriga a subir à superfície de tempos em tempos, tornando- o vulnerável. Já o submarino nuclear fica permanentemente debaixo d’água; só o fator humano o restringe, como cansaço da tripulação etc. Por isso, ele é importante para ajudar a patrulhar a extensa costa brasileira. ISTOÉ – A liberação do dinheiro para a conclusão do reator significa a retomada do projeto de construção do submarino nuclear brasileiro?
Moura Neto – O projeto de Aramar não é o projeto da construção do submarino nuclear. O programa nuclear da Marinha é o da viabilização do ciclo de enriquecimento de urânio e da construção do reator nuclear. A liberação do dinheiro permitirá a conclusão de um reator de 11 MW de potência. É um reator dual, que não apenas poderá propelir um submarino como também produzir eletricidade para uma cidade de 20 mil habitantes. A decisão de concluir o projeto do submarino nuclear é uma decisão política. ISTOÉ – Nós já dominamos completamente o ciclo do enriquecimento de urânio?
Moura Neto – A primeira parte, sim, em nível laboratorial, mas algumas etapas desse ciclo ainda são realizadas fora do País. A transformação do yellow cake, produto da primeira etapa de beneficiamento do urânio, em gás hexafluoreto de urânio, é feita no Canadá. Esse gás depois é transportado para a Europa, onde um consórcio que reúne Inglaterra, Alemanha e Holanda o enriquece. No momento em que a nossa fábrica estiver funcionando, em 2010, poderemos enriquecer todo o urânio aqui. Com o protótipo dessa fábrica, poderá ser construída uma unidade maior em Rezende, na Indústria Nuclear Brasileira (INB). A Marinha também fabrica e vem fornecendo ultracentrífugas à INB. Dentro de um período de tempo que eu não sei especificar, nós poderemos enriquecer todo o urânio de que necessitamos aqui no Brasil. ISTOÉ – O Brasil sofre pressões por causa do programa do submarino nuclear?
Moura Neto – São pressões veladas; quem domina a tecnologia nuclear não a fornece a ninguém. Mas o Brasil assinou o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) e também assinou o Acordo Quadripartite, entre a agência, Brasil, Argentina e a ABCC (Agência Brasileira Argentina de Contabilidade Nuclear). Esse acordo garante as inspeções periódicas da Associação Internacional de Energia Atômica (Aiea), mas também garante a inviolabilidade de nossas instalações. ISTOÉ – O reaparelhamento da Marinha pode ser feito em colaboração com a indústria nacional?
Moura Neto – O que o ministro (da Defesa) disse é que o programa de reaparelhamento da Marinha vai privilegiar a indústria nacional. Aliás, no programa nuclear, tudo foi desenvolvido com tecnologia nossa, até porque essa é uma tecnologia muito sensível e teria sido muito difícil obtê-la de outra maneira. A idéia é buscar transferência de tecnologia para beneficiar a indústria nacional, porque isso trará a independência na área de defesa.
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