Quem defenderá os Estados Bálticos ?
Líderes europeus divergem sobre
ameaça russa


Area Militar

A reunião dos países da OTAN que decorre a partir desta Quinta-feira em Budapest na Hungria, vem mais uma vez chamar a atenção dos países membros para a situação nos chamados Estados Bálticos e para a possibilidade de as fronteiras dos países da aliança com a Rússia - onde se nota o ressurgimento das pretensões «imperiais» daquele país – se virem a transformar num foco de tensão ou de conflito.

Na primeira linha das preocupações encontram-se dois dos três estados bálticos, a Estónia e a Letónia por possuírem consideráveis minorias de origem russa, mas também outros dois países, a Lituânia e a Polónia, quer por terem fronteira directa com o antigo território alemão de Koenigsberg[1] quer esta última por causa das ameaças russas relacionadas com a instalação de mísseis do sistema de defesa norte-americano.

Como defender os Estados Bálticos ?
A Aliança Atlântica, têm-se vindo a colocar a questão cada vez com mais equidade, sobre como proceder em caso de crise com a Rússia e no caso de este último país decidir invadir qualquer dos estados do Báltico, como já foi claramente avançado pelo presidente russo Medvedev, quando disse que a Rússia iria até onde fosse preciso para defender os seus cidadãos.

Aquelas declarações russas, foram consideradas a mais grave ameaça à segurança na Europa nos últimos anos, pois indirectamente o presidente Medvedev - um dos homens mais poderosos na Rússia depois de Vladimir Putin – ameaçou invadir um país da aliança [2].

A ameaça russa sobre a Europa, tem vindo a gerar muito nervosismo entre vários países e dirigentes europeus, pois em grande medida os estados da Europa passaram nas últimas décadas a olhar para a Aliança Atlântica como uma organização política e não como uma organização militar.

Os dirigentes dos países que estiveram incluídos no bloco soviético e que temem e desconfiam da Rússia por razões históricas encontram-se entre aqueles que mais firmemente apresentam razões para justificar um maior empenhamento na defesa da área mais desprotegida de toda a OTAN.

Desde há vários anos que os Estados Bálticos se têm mostrado algo preocupados com a inexistência de qualquer plano de contingência perante a possibilidade de uma ação russa, mas esses receios foram vistos como secundários até que o ressurgimento «imperial» russo se tornou evidente com a invasão da Geórgia em Agosto de 2008.

A não existência de quaisquer planos defensivos, tinha até agora sido vista como uma prova de boa vontade por parte dos países da NATO, que tentavam assim demonstrar que confiavam na Rússia e que por isso não esperavam qualquer acção que justificasse planos defensivos.

A situação na Geórgia veio alterar completamente o jogo e veio também alertar os intervenientes de que quem está na aliança, tem obrigações, que podem levar a um conflito aberto.
Países como os Estados Unidos e a Grã Bretanha afirmaram nos últimos dias que são favoráveis a que a OTAN prepare planos de contingência para a eventualidade de um ataque russo contra os seus dois membros mais fracos e mais vulneráveis.

Por outro lado, países da Europa continental aparecem como os principais opositores a acções que possam levar a uma confrontação com a Rússia. Entre esses países encontram-se a Alemanha e a França, mas também outros como por exemplo a Grécia, que está mais próxima da Rússia por razões culturais.

Os militares da OTAN sabem que a defesa daqueles pequenos países, não pode ser levada a cabo apenas pelos seus próprios meios.

A Estónia, é o país mais exposto ao perigo russo. Tem um exército de 4.000 militares e tem cerca de 40 veículos SISU-XA de transporte de pessoal, que são o seu meio mecanizado mais importante

A seguir vem a Letónia, que tem um exército de 5.000 militares e possui três tanques T-55 e armamento ligeiro.

Mais a sul, a Lituânia só tem fronteira com Kaliningrad e tem um exército de 10.000 militares. Ainda possui alguns equipamentos russos. A maior modernização consistiu no fornecimento de cerca de duas centenas de veículos M-113 e sete dezenas de canhões de 105mm M-101. A Lituânia é o mais forte dos estados bálticos, e tem tanta população como os outros dois (Estónia e Letónia) juntos, mas é mesmo assim um anão militar.

A capacidade defensiva conjunta destes três países é muito inferior às capacidades do exército da Geórgia, mesmo tendo em consideração que o exército georgiano não teve comandantes à altura e que tendo alguns militares treinados para operações de contra-insurgência, não tinha qualquer preparação para combates convencionais.

Operação conjunta

O perigo de uma acção russa, levou a que os estados da região proseguissem os seus estudos com vista a melhorar a integração dos seus sistemas de defesa, mas a necessidade de reorganização, bem assim como a necessidade de equipamentos estão para lá das capacidades financeiras dos três estados, pelo que mesmo com uma organização militar conjunta a possibilidade de uma defesa comum eficiente sem apoio imediato em menos de 24 horas torna qualquer defesa impossível.


Defesa aérea
Uma das poucas iniciativas ocidentais na defesa dos Estados Bálticos, consiste no envio de destacamentos de aeronaves para patrulhar o espaço aéreo dos países bálticos. Ainda no inicio de 2007,aeronaves portuguesas participaram nessa operação, tendo sido enviadas para a região quatro aeronaves F-16.

Durante a operação, foi referida pela imprensa a continua pressão russa naqueles países, nomeadamente através da manutenção de redes de espionagem constituídas por «russas de boa vontade», contra a presença das quais os militares portugueses foram avisados.

A utilização de grande número de prostitutas ao serviço do FSB [3] para colecta de informação é vista como apenas a ponta do iceberg dos serviços de espionagem russos nos países bálticos.

Provocações, podem despoletar conflito

Teme-se que da mesma forma que na Geórgia, a grande quantidade de agentes russos e cidadãos russos que permanecem nos Estados Bálticos facilite a criação de incidentes, que sirvam como argumento para uma eventual invasão, no caso de o governo de algum desses países ser levado a usar a força para garantir a autoridade do Estado.

Os países do Báltico temem que como na Geórgia, a Rússia apresente um invasão como uma necessidade premente para protecção de vidas civis, criando no ocidente uma sensação de dúvida que possa ser aproveitada por Moscovo para continuar as operações militares antes que o ocidente reaja.
Exemplo disso, foi o «Massacre» de Tskhinvali, apresentado continuamente pelo presidente russo na televisão como razão para a invasão russa, mas que foi provado como completamente fraudulento e inventado pelos russos.

A resposta perante a eventual invasão de um país báltico continua neste momento a ser duvidosa. Os alemães não se querem comprometer com a possível reorganização do exército dos países bálticos e outros países europeus não mostram grande interesse.
Além do mais existe ainda entre muitos membros da OTAN, a certeza de que os russos não terão coragem para invadir um país da aliança, acreditando que os russos não têm quaisquer intenções imperiais e que apenas pretendem viver em segurança.
Mas o facto, é que foram os próprios militares russos e analistas militare em Moscovo que avisaram que a Geórgia teria sido invadida pela Rússia mesmo que fosse já membro da OTAN.

Esta garantia russa de que atacará quem quer que seja, onde que seja, que chegou ao ponto de ameaçar a Polónia com um ataque atómico preventivo, constituiu no entanto um aviso muito sério, que alguns países da Aliança, nomeadamente a Polónia, estão dispostos a levar muito a sério, embora estejam certos de que dificilmente terão capacidade para se opor a uma invasão russa determinada.



[1] Koenigsberg, hoje Kaliningrad, era a capital da antiga Prússia Oriental e foi ocupada pelos soviéticos no final da II Guerra Mundial. A Prússia Oriental foi dividida entre Polónia e União Soviética, e a parte que coube à URSS passou para a jurisdição da Rússia, ficando fisicamente separada do resto da república, embora tivesse acesso através das outras repúblicas soviéticas.
Com o fim da URSS Kaliningrad ficou completamente isolada da Federação Russa, a centenas de quilómetros da fronteira.

[2] - As razões para a existência da OTAN, remontam à Guerra Fria e são resultado da necessidade de coordenar a defesa contra uma União Soviética agressiva e com pretensões imperiais que se mostrava extremamente forte nos anos 40 e 50.

[3] – O FSB é o substituto da antiga KGB, com poderes que segundo muitos são reforçados. As redes de prostituição do FSB são facilitadas pelas ligações directas que existem entre o Estado Russo e o Crime Organizado.