Lula na Bolívia - Apoio econômico e político ao governo de Evo Morales deveria ser mais cauteloso e exigir o fim de hostilidades
Fonte: Editorial Correio Brasiliense - Via NOTIMP FAB
EM VISITA , à Bolívia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a manifestar apoio ao colega Evo Morales. Para o brasileiro, Morales representa a "refundação democrática" do país. A cortesia acontece em momento estratégico. Um referendo marcado para o dia 25 pode aprovar a nova Constituição boliviana, selando o projeto político de Morales.
O texto da Carta tem apoio parcial da oposição e foi elaborado após conflito que causou pelo menos 18 mortes. O acordo foi possível depois que Morales recuou de sua proposta continuísta e aceitou concorrer a apenas uma reeleição, em pleito previsto para dezembro.
Para Morales, o apoio do Brasil neste momento é essencial, pois assegura um mínimo de receitas com exportação do gás natural. Além dos reservatórios das hidrelétricas estarem em níveis favoráveis, a indústria brasileira, por conta da crise, reduziu o consumo diário desse combustível. A demanda das termelétricas que usam o gás boliviano também caiu. Diante disso, Brasília anunciou a redução da importação de 31 milhões de m3 para 19 milhões de m3 diários do combustível boliviano.
O anúncio assustou o governo Morales. Atendendo a um pedido das autoridades bolivianas, o governo brasileiro recuou e decidiu manter a importação diária de 24 milhões de m3. Trata-se de uma má notícia para os consumidores brasileiros, que vão financiar a ajuda. Segundo a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia, serão gastos R$ 26 milhões por semana para manter ligadas três térmicas que utilizam o gás importado.
É razoável que os acordos comerciais tenham salvaguardas contra mudanças bruscas que poderiam prejudicar uma das partes, mas claramente a opção brasileira se deveu a motivações políticas. Os contratos entre os dois países já preveem uma remuneração mínima à Bolívia, que poderia ser atendida mesmo com a redução temporária anunciada inicialmente.
Reforçar os laços comerciais e estimular a economia boliviana são interesses do Brasil. Mas não se deve desconsiderar a lógica econômica nessas relações. Além disso, as manifestações oficiais brasileiras precisariam assumir um tom mais cauteloso, já que o histórico do presidente boliviano combina tentação autoritária com hostilidade aos interesses brasileiros -como foi o caso da ocupação militar das instalações da Petrobras.
Até o momento, o Palácio do Planalto tem sido complacente com tais provocações, embora as cartadas ultranacionalistas de Morales já tenham mostrado seu custo ao país -sob a forma de investimentos que deixaram de ser realizados. Resta esperar que o presidente boliviano abandone o radicalismo e a inconstância nas suas relações com o Brasil.
Reveses recentes para a política externa brasileira na América do Sul desaconselham o excesso de confiança.
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