As brocas estão prontas para perfurar, mas os barões do petróleo enfrentam obstáculos ambientais e a fúria da Argentina
Fonte: Gazeta do Povo - RPC
A conversa de início de noite no bar Victory, em Port Stanley, Ilhas Malvinas, costumava ser sobre a pesca de lula ou o itinerário dos navios-cruzeiro. Esta realidade mudou. Hoje, entre uma lata e outra de cerveja britânica, os ilhéus possuem algo muito mais interessante para discutir: petróleo.
De acordo com as últimas pesquisas sísmicas, as Malvinas repousam sobre 18 bilhões de barris de petróleo. Companhias de prospecção que operam nas ilhas declararam planejar o início das perfurações ainda neste ano.
Os mais de 3 mil habitantes das ilhas já fazem as contas e contemplam a possibilidade de serem uma das populações mais ricas do planeta. "Mesmo que eles (poços de petróleo) produzissem (apenas) um bilhão de barris, os impactos em termo de renda per capita nas Ilhas Falklands seria algo estrondoso", declarou Sam Moody, diretor executive da Rockhopper Exploration, uma das três empresas com direitos de explorar os recursos minerais das ilhas.
Os malvineses, por sua vez, ainda não podem se considerar os barões sul-americanos do petróleo. Existem vários obstáculos antes que isto se concretize. O primeiro seria saber se as estimativas refletem a realidade – e para isto seria necessário um poço para perfurações preliminares.
Durante o boom do preço do petróleo, os poços eram proibitivamente caros, chegando a custar mais de US$ 600 mil por dia. Com a queda dos preços, os poços voltam a ser uma alternativa viável, e várias concessionárias acreditam que irão conseguir ao menos um.
Atualmente, as empresas de prospecção são ferinas e controlam o preço do mineral gota a gota. Ben Brewerton, porta-voz da Falklands Oil and Gas, declara que as perfurações seriam viáveis mesmo que os preços fiquem pouco abaixo dos US$ 20 o barril, dado o tamanho da jazida que se espera encontrar. O risco de vazamentos e outras tragédias ambientais representa uma outra ameaça ao progresso da indústria petrolífera. Além de ser um santuário para pinguins e focas, as Malvinas são o lugar escolhido para a reprodução da maior população de albatrozes de testa negra do mundo.
Phyl Rendell, diretor dos recursos minerais e agrícolas das Malvinas, declarou que as autoridades das ilhas estão exigindo que as empresas de exploração de petróleo cumpram os mais rigorosos requerimentos ecológicos. As maiores preocupações são, todavia, políticas.
A Argentina, país que travou uma sangrenta guerra contra o Reino Unido em 1982, pelo controle das ilhas, fica a menos de 500 quilômetros de distância. "Não importa o que aconteça nas Malvinas, quer seja uma maior exploração dos recursos naturais ou um fortalecimento democrático, os argentinos vão reclamar disto", reclama Mike Summers, membro da assembleia legislativa das Ilhas Malvinas.
Na Argentina, a tensão é ainda maior. O ministro das Relações Exteriores abandonou as negociações conjuntas com o Reino Unido sobre a coordenação da exploração de petróleo no Atlântico Sul.
O ministro foi ainda mais longe: impediu que qualquer empresa que esteja envolvida na exploração de petróleo nas ilhas atue em solo argentino.
Mais dinheiro
Mas os moradores das ilhas já especulam como o dinheiro extra trazido pelo petróleo deverá ser gasto. De acordo com as empresas de exploração, as ilhas devem receber 21% das receitas em forma de impostos de 9% em forma de royalties sobre todo o óleo e gás produzidos. Oficiais do governo britânico estão estudando as experiências de outras comunidades pequenas que ficaram ricas com o petróleo como as das Ilhas Shetland, que se beneficiaram do boom do petróleo no Mar do Norte e utilizaram a bonança trazida pelo mineral para criar e custear um fundo de apoio a centros de lazer e outros projetos comunitários. O mesmo poderia acontecer nas Malvinas.
As ilhas não dispõem de teatros, contam com apenas poucos restaurantes e possuem uma vida noturna pouco agitada. Uma malha de estradas mais abrangente e um porto maior também aparecem na lista das benfeitorias mais desejadas pelos ilhéus. Um cinema seria uma verdadeira dádiva: para ver uma projeção em tela grande os habitantes precisam enfrentar 35 km de estrada de chão até a base militar da ilha principal.
"Podemos listar uma enormidade de benfeitorias que precisamos. Nem vacas temos nas ilhas”, revela Adam Cockwell, um operador de ferryboat. Pelo menos por enquanto, a população decidiu não contar com promessas do futuro próximo. Como Rendell mesmo disse: "Temos sido cuidadosos em não contar com algo que podemos não conseguir jamais".
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