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Poder do Talibã supera o da al-Qaeda


Do Washington Post CABUL - Via O Globo

No momento em que a violência aumenta no Afeganistão, o equilíbrio do poder entre grupos insurgentes mudou. Uma al-Qaeda enfraquecida depende cada vez mais de um Talibã fortalecido para sua proteção e para conseguir gente para realizar ataques mortais.

A ascensão do Talibã e o declínio relativo da al-Qaeda têm amplas implicações para o governo Obama, que busca definir quem é seu inimigo no Afeganistão e que debate o envio de mais dezenas de milhares de soldados.

Ainda que a guerra no Afeganistão tenha começado como uma resposta ao terrorismo da al-Qaeda, há talvez menos de cem membros do grupo no país, segundo um militar americano ligado à inteligência em Cabul, que falou sob a condição de ter sua identidade mantida sob sigilo.

O oficial estimou que há 300 membros da al-Qaeda nas áreas tribais do Paquistão, comparado com as dezenas de milhares de talibãs nos dois lados da fronteira.

O fato de a nova dinâmica de poder entre os grupos levar a relações melhores ou piores faz oficiais e observadores discordarem. Ela pode estar aproximando a al-Qaeda de determinadas facções talibãs - principalmente forças leais ao ex-ministro talibã Jalaluddin Haqqani - e afastando de outras, inclusive a do líder Mohammad Omar, baseado no Paquistão. As alianças cambiantes podem ter um efeito significativo sobre a decisão do governo dos EUA sobre qual será seu foco.

Apesar de o presidente dos EUA, Barack Obama, ter dito que o país permanecerá no Afeganistão porque uma vitória talibã significaria uma proliferação de guerreiros da al-Qaeda, que retornariam ao seu refúgio de antes de 2001, a facção de Omar parece ter se distanciado da rede nos últimos meses. A mudança parece refletir a crescente confiança do grupo, mesmo sem a al-Qaeda como patrono.

- O Talibã tem o conhecimento, os recursos e a energia - disse Richard Barrett, coordenador da Equipe de Monitoramento do Talibã e da al-Qaeda da ONU.

O Talibã e a al-Qaeda há tempos mantêm uma relação simbiótica. O Talibã, composto principalmente de pushtus do Afeganistão e do Paquistão, fornece abrigo à al-Qaeda, que é liderada por árabes, em troca de dinheiro, armas e treinamento. Quando Omar governou quase todo o Afeganistão, de 1996 a 2001, recebeu Osama bin Laden, líder da al-Qaeda, e se recusou a entregá-lo aos EUA depois do 11 de Setembro. A invasão americana do Afeganistão forçou Omar e Bin Laden a fugirem para o Paquistão.

A missão de Omar é expulsar os soldados dos EUA e da Otan do Afeganistão e recapturar o país. Seu grupo é particularmente ativo nos ataques a soldados no sul do Afeganistão.

Este ano, o comitê militar de Omar publicou um livro de regras, convocando os seguidores a proteger a população e evitar baixas civis. Ele protestou contra a corrupção do governo do presidente Hamid Karzai, uma questão que chama a atenção dos afegãos. Também pediu apoio de países muçulmanos. Mas a forma como a al-Qaeda defende uma guerra santa mundial e seu gosto por ataques com muitas baixas, não importando quantos civis muçulmanos morram, complicam o objetivo.

Em entrevista para a revista "al-Samoud", o líder do comitê político talibã, Agha Mutassin, elogiou a Arábia Saudita, convocou a unidade muçulmana e disse que o Talibã "respeita todas as diferentes escolas islâmicas sem discriminação". Tais posições podem colocar Omar do lado oposto da extremista sunita al-Qaeda, que prega a derrubada de governos muçulmanos que julga corruptos e ataca xiitas.
Na luta contra EUA, grupos ainda unidos

Outras correntes talibãs, porém, estão mais ligadas à al-Qaeda do que nunca. A facção de Haqqani, acusada por muitos dos ataques mais mortais a soldados dos EUA e que tem como base a cidade de Miran Shah, no Paquistão, trabalha tão próxima da al-Qaeda que a distinção entre os grupos pode ser irrelevante.

Haqqani travou uma ligação com guerreiros árabes durante a guerra contra os soviéticos nos anos 1980, quando recebeu fundos da CIA. Quando Bin Laden fugiu da invasão americana de 2001, refugiou-se com Haqqani, segundo o escritor Ahmed Rashid.

No campo de batalha, insurgentes da al-Qaeda e de uma ampla gama de facções talibãs ainda se comunicam e coordenam ataques. Unidos por um inimigo comum, eles compartilham explosivos e usam as mesmas redes de homens-bomba. Um estrangeiro que viaje para as terras tribais paquistanesas para se juntar à al-Qaeda pode terminar trabalhando com o Talibã.

- A al-Qaeda é o professor do Talibã. Ainda são parceiros próximos - disse o general Abdul Manan Farahi, diretor de um programa antiterrorista do governo afegão.