AÇÃO INDEPENDENTE - Hacker Majia vive com os pais e usa computador de casa para invadir outras máquinas e vender informações
Hackers se multiplicam na China
Número de ataques com origem no país vem aumentando; alvos podem ser financeiros ou políticos
David Barboza, THE NEW YORK TIMES, CHANGSHA - Via Estadão
Número de ataques com origem no país vem aumentando; alvos podem ser financeiros ou políticos
David Barboza, THE NEW YORK TIMES, CHANGSHA - Via Estadão
Com alguns toques rápidos, o hacker, cujo codinome é Majia, abre uma tela exibindo suas vítimas mais recentes. "Essa é uma lista de pessoas que tiveram o computador infectado com o meu cavalo de Troia", diz, operando de um sujo apartamento no subúrbio da cidade de Changsha, no centro da China.
"Eles nem sabem o que ocorreu". A "porta armadilha" online criada na semana passada já atraiu duas mil pessoas, da China e do exterior, pessoas que clicaram em algo que não deveriam, espalhando um vírus que permite ao hacker controlar seus computadores e roubar senhas de suas contas bancárias.
Majia, universitário formado, com cerca de 20 anos, é um ladrão cibernético. Ele opera secreta e ilegalmente, e faz parte de uma comunidade de hackers que exploram as falhas de um software para se introduzir em sites, roubar dados valiosos e vendê-los.
Especialistas em segurança na internet dizem que a China tem legiões de hackers por trás de um número cada vez maior de roubo de números cartões de crédito, espionagem corporativa e até mesmo da guerra cibernética contra outras nações. Alguns desses casos tiveram origem na China.
Há duas semanas, o Google acusou hackers chineses de uma série de ataques que levaram ao roubo de códigos fontes valiosos. Ainda de acordo com o Google, os hackers se infiltraram em contas de Gmail de ativistas de direitos humanos, sugerindo que o trabalho deles foi mais do que uma simples contravenção.
Além desses ladrões independentes, como Majia, especialistas em segurança de computadores dizem que existem os chamados "hackers patrióticos", que concentram seus ataques em alvos políticos. Há os mais direcionados para os serviços de inteligência dentro do Exército de Libertação Popular, como também grupos mais misteriosos que trabalhariam com o governo do Estado.
Na verdade, na China - como em partes da Europa do Leste e da Rússia -, o ataque a computadores tornou-se uma espécie de esporte nacional lucrativo. Existem conferências de hackers, academias de treinamento e revistas com títulos "Hacker X Files" e "Hacker Defense", que ensinam, passo a passo, como invadir computadores ou criar um cavalo de Troia.
Por menos de seis dólares, pode-se mesmo comprar o Hacker"s Penetration Manual (Manual de invasão hacker - livros como esse também são vendidos nos EUA, embora em menor quantidade).
E com 380 milhões de usuários de internet na China e um mercado de jogos online explodindo, analistas dizem não ser surpresa o fato de os jovens chineses serem tão habilidosos no assunto. Muitos entrevistados descrevem uma comunidade de nerds que trabalham de forma independente, mas que vendem os serviços para corporações, e até para o Exército. Como é difícil rastreá-los, continua difícil saber quem está por trás de ataques e de onde operam, dizem especialistas em tecnologia.
A atividade é ilegal na China. No ano passado, Pequim revisou e endureceu a lei sobre o assunto. Hoje essas operações são consideradas crime sujeito a até sete anos de prisão. Contudo, Majia parece não se importar, em grande parte porque a aplicação da lei não é tão rígida. Mas tem cuidado para não deixar pistas.
Ele reconhece que, em parte, o que o atrai é o dinheiro. Muitos hackers ganham muito. Exatamente quanto ganhou até agora, ele não diz. Mas admite que vende códigos para outros e alardeia que é capaz de entrar em contas bancárias.
De fato, o incentivo financeiro é o que motiva muitos hackers chineses como Majia. Scott J. Henderson, autor do livro The Dark Visitor: Inside the World of Chinese Hackers (O visitante secreto: dentro do mundo dos hackers chineses), diz que passou anos investigando esses jovens, às vezes com ajuda financeira do governo americano. Um desses piratas entrou no site do governo dos EUA, e mais tarde deu uma conferência sobre a atividade numa importante universidade. Hoje, trabalha para o ministério da Segurança da China.
Muitos tentam lucrar com dados roubados de grandes corporações, ou ensinando outros como invadir computadores. "Eles ganham muito vendendo vírus e cavalos de Troia para corromper os computadores de outras pessoas", disse Henderson. "E também invadem contas de jogos e vendem os personagens virtuais. É muito dinheiro". Majia vive com os pais e o seu quarto tem pouca coisa além de um computador de mesa, uma conexão de alta velocidade e um grande armário.
Ele se comunica com as pessoas online, debruçado no seu computador das 18h30 às 0h30 do dia seguinte. Indagado por que não trabalha para alguma grande empresa de tecnologia, Majia olha com desdém e diz que essas empresas são repugnantes e que perderia sua liberdade.
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