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Relatório técnico confirma Rafale Preferido “político” do presidente Lula, avião francês ganha respaldo depois de mudanças nos critérios de avaliação do Ministério da Defesa.

A exposição de motivos técnicos do Ministério da Defesa, que resume em 40 páginas as mais de 2 mil geradas em documentos dos comandos da Aeronáutica e da Marinha sobre a compra de 36 caças supersônicos, já está pronta para ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nela, o caça francês Rafale aparece em primeiro lugar, após mudança nos pesos da avaliação, que deu mais valor à transferência de tecnologia e menos aos custos de aquisição e manutenção da aeronave. A alteração foi feita com base na nova Estratégia Nacional de Defesa (END), que tem no desenvolvimento da indústria militar brasileira uma das prioridades, e permitiu que o avião francês despontasse como vencedor também na esfera técnica, apesar de cada unidade custar cerca de US$ 20 milhões a mais do que seu mais caro concorrente. Agora, resta ao presidente convocar o Conselho Nacional de Defesa para bater o martelo, o que pode acontecer só após as eleições de outubro.

A mudança colocou a opção preferida do Planalto também como a escolha técnica da Defesa. Desde que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, esteve em Brasília para as festividades do 7 de Setembro de 2009, e foi anunciado o início das negociações com a francesa Dassault, o presidente Lula — e o próprio ministro da Defesa, Nelson Jobim, — deixam claro que a decisão do governo será política. O fato de o caça escolhido pelo presidente ter respaldo do documento da Defesa, contudo, dá mais validade à decisão. Em versões anteriores, feitas antes da alteração final nos pesos de avaliação, o relatório elaborado pela Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate (Copac) chegou a apontar os outros dois concorrentes, o sueco Gripen NG e o americano F-18 Super Hornet, como melhores opções.

Já se passou um ano e meio desde que as três finalistas — a Dassault, a norte-americana Boeing e a sueca Saab — entregaram as chamadas ofertas finais, ou Bafo (do inglês best and final offers), ao Comando da Aeronáutica. De lá para cá, a Copac analisou a fundo as propostas no que concerne às especificações dos caças, transferência de tecnologia, offset (contrapartidas), e preço de aquisição e manutenção, entre outros itens. O primeiro relatório que chegou ao Alto Comando da Aeronáutica trazia o sueco Gripen NG como a melhor opção, mas teve uma revisão pedida pela cúpula da FAB para aumentar o peso dos riscos já apontados no próprio texto. Segundo o documento, há dúvidas quanto ao desempenho do radar e aos custos operacionais do motor do Gripen NG — essas questões haviam sido praticamente descartadas nesse momento da avaliação.

A primeira alteração, que dobrou de 5 para 10 esse peso, fez o americano F-18 Super Hornet, que é consideravelmente mais barato que o Rafale e apresenta menos riscos que o sueco, tomar a dianteira no relatório entregue em dezembro ao Ministério da Defesa. Foi a vez do órgão, contudo, pedir uma nova mudança nos parâmetros de avaliação, que ainda eram os mesmos da primeira concorrência, iniciada pela FAB em 1995. A preocupação principal do ministério era aumentar a importância da transferência de tecnologia, que valia até então apenas 9 dos 100 pontos, para valorizar as propostas que mais trouxessem oportunidades à indústria brasileira, como prevê a END.

Com o peso da transferência de tecnologia agora em 40 pontos, a proposta francesa, que ganhou nota 8, passou à frente da norte-americana Boeing, que obteve apenas nota 2 nesse quesito. O Gripen NG, oferecido pela sueca Saab, ficou um ponto à frente do Rafale nesse quesito, mas não venceu principalmente pelos fatores riscos e offset — que o caça francês “levou” após o presidente Sarkozy assumir o compromisso de comprar 12 unidades do cargueiro KC-390, que está sendo desenvolvido pela Embraer.

Custos
O alto preço do Rafale, que era o principal obstáculo da proposta francesa, também foi compensado pela mudança dos pesos da avaliação enviada pelo Alto Comando da Aeronáutica. O peso dos custos totais do caça, que valiam 50% da nota final, caiu pela metade no novo texto. O governo francês também reduziu o preço de cada unidade — de 64 milhões para 60 milhões de euros (cerca de US$ 83,7 milhões e US$ 78,5 milhões, respectivamente), mas, mesmo assim, ele continuou sendo o mais caro, com o Gripen NG estimado em US$ 50 milhões e o F-18, em US$ 55 milhões.

O Ministério da Defesa não confirma a conclusão da exposição de motivos, e nem soube precisar quando o documento será entregue ao presidente. A decisão só será anunciada depois que Lula avaliar o texto com o Conselho Nacional de Defesa. Dada a proximidade das eleições e a possibilidade de que a escolha seja usada pela oposição na disputa, especula-se que o vencedor só seja, de fato, conhecido após o pleito. Há três semanas, em visita à Embraer, a candidata do Partido Verde, Marina Silva, criticou a “falta de transparência” no processo. “A tramitação no Congresso Nacional ocorreu de forma açodada (...), não houve tempo de debate, as questões foram feitas sem o devido tempo, para que tivéssemos o devido trâmite”, reclamou.

Possível adiamento preocupa as finalistas

A demora em anunciar o vencedor da concorrência FX-2 da FAB, aliada aos mais de nove meses de silêncio do governo brasileiro sobre o processo, tem deixado as três concorrentes sob estado de tensão constante. Ronda a incerteza sobre se a compra dos caças supersônicos será deixada para o próximo governo — ou até novamente cancelada, como ocorreu com o programa FX anterior. Sem previsões de desfecho próximo, e com o início das férias parlamentares, o vaivém dos representantes e diretores das três empresas em Brasília diminuiu de forma considerável, mas não a expectativa.

Para a Dassault, cuja proposta é apontada como favorita, a expectativa é de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpra a repetida promessa de não deixar a decisão para o próximo governo. A empresa francesa também diz confiar nas declarações já dadas pelo ministro Nelson Jobim de que a política de Defesa “não é partidária”, mas uma política de Estado. Entre os motivos especulados para a demora, estão a própria campanha eleitoral, os interesses do país na sua atual agenda de política externa ou mesmo as prioridades do ministro da Defesa, que nas últimas semanas foi, inclusive, visitar as tropas brasileiras no Haiti. As empresas alegam que, desde outubro de 2009, quando tiveram uma oportunidade de entregar suas propostas revisadas à Aeronáutica, não têm qualquer informação oficial do governo brasileiro sobre a disputa.

O presidente da sueca Saab, Ake Svensson, observa que, se a decisão for deixada para depois das eleições, é possível que ela se estenda para o próximo governo, com um novo ministro da Defesa à frente do processo. “Se eles optarem por deixar a decisão para depois das eleições, não sei quanto tempo isso pode durar. Mas, no próximo governo, provavelmente haverá um novo ministro de Defesa, e talvez mais uma análise. Isso pode demorar mais um ano ou dois”, afirmou ao Correio. Cauteloso como os outros dois concorrentes, ele não critica a demora, e garante que o Gripen NG continua “se desenvolvendo” enquanto a decisão não sai.

O diretor de desenvolvimento de negócios internacionais da Boeing, Michael Coggins, afirma que “é compreensível” que haja uma demora em um processo como esse. “É uma decisão muito, muito importante, que vai garantir a espinha dorsal da Força Aérea Brasileira nos próximos 30 anos, além de haver muito dinheiro envolvido”, disse. “Para alguns concorrentes, talvez seja crítico que a decisão seja tomada logo, porque disso depende a sua linha de produção, mas nós estamos lá, produzindo o Super Hornet, e dispostos a trabalhar com o Brasil, independentemente de quanto tempo demore a decisão.” (IF)


 - (Gripen International/Divulgação )

Três perguntas para - Sten Tolgfors Ministro de Defesa da Suécia


O presidente Lula já disse que a decisão sobre os caças será política. O que o governo sueco tem feito para ajudar a oferta do Gripen NG nesse sentido?
No último ano, eu fui ao Brasil três vezes e tive o privilégio de me encontrar com o presidente Lula duas vezes na Suécia e duas vezes no Brasil. Mas, mais importante que isso, tivemos uma visita do rei e da rainha da Suécia ao Brasil, com vários outros ministros e uma delegação da nossa indústria. Além disso, sabemos que temos a melhor proposta em termos de valor, não só na aquisição como na manutenção. E também acreditamos ter a melhor oferta em termos de transferência de tecnologia, além de já mantermos uma cooperação forte com a indústria brasileira — São Paulo, por exemplo, é a segunda cidade de produção industrial sueca, e há um futuro interessante e promissor de exportação para outros mercados. Mas é claro que essa será uma decisão brasileira e teremos muito respeito por ela.

Por que uma parceria com o Brasil seria boa para a Suécia?
Uma parceria seria boa para os dois países. Se você olhar para a nossa indústria aérea, nós somos líderes quando se trata de produção militar, de caças, enquanto o Brasil tem uma grande experiência internacional na produção civil (aérea), com a Embraer. Então, vai ser uma parceria perfeita para ambos os lados. A nossa oferta vai dar acesso ao Brasil ao conhecimento de primeira linha sobre desenvolvimento de caças e a possibilidade de desenvolver o seu próprio caça nas próximas gerações. Também somos um país não alinhado militarmente, queremos cooperar com outros países, e, no Brasil, não buscamos um cliente, mas um parceiro para um projeto a longo prazo.

Qual o modelo de parceria proposto para o Brasil?
Nós não estamos oferecendo só a transferência de tecnologia, mas também uma parceria no desenvolvimento do avião, que vai muito além do que só transferir tecnologia. Se o Brasil quer ser capaz de desenvolver o seu próprio caça a longo prazo, isso envolve o conhecimento sobre integração de sistemas — o que a Suécia oferece. Nós damos, inclusive, a chance para o Brasil escolher que sistema vai integrar o Gripen NG, e essa é uma das razões porque o Gripen é tão competitivo em termos de preço.