A Colaboração ALPHA, um consórcio internacional de cientistas, com participação de brasileiros, criou e armazenou um total de 309 átomos de anti-hidrogênio.

A equipe ganhou a manchetes no final de 2010, quando conseguiram capturar a antimatéria pela primeira vez.

Naquela ocasião, 38 átomos de anti-hidrogênio foram mantidos isolados durante 172 milésimos de segundo.

Agora, o armazenamento durou até 1.000 segundos - quase 17 minutos - além de demonstrar que o armazenamento da antimatéria por períodos bem maiores é factível.

1.000 segundos é quase uma eternidade quando se trata de estudar fenômenos em escala atômica, o que abre pela primeira vez a possibilidade de que os anti-átomos sejam estudados como o são os átomos da matéria comum.

Estado fundamental de energia

"Talvez o aspecto mais importantes desse resultado é que, depois de apenas um segundo, esses átomos de anti-hidrogênio tinham com certeza decaído para seu estado fundamental de energia (ground state). Estes foram provavelmente os primeiros antiátomos já obtidos nesse estado," explicou Joel Fajans, do Laboratório Berkeley, nos Estados Unidos, um dos membros da Colaboração ALPHA (Antihydrogen Laser PHysics Apparatus).

Como quase todas as medições de precisão exigem átomos no estado fundamental de energia, a pesquisa abre possibilidades totalmente novas de experimentos com a antimatéria.

Armadilha de antimatéria

A garrafa de antimatéria usada pelos cientistas é um campo magnético de oito pólos gerado por ímãs supercondutores.

Infelizmente, não dá para ver diretamente a antimatéria guardada lá dentro.

"Atualmente, a única forma de sabermos se capturamos um anti-átomo é desligar o campo magnético," explica Fajans. Quando o anti-átomo atinge a parede da garrafa, ele se aniquila."

Os cientistas então descobrem que ele estava lá dentro detectando uma emissão de raio gama gerada nessa aniquilação de matéria e antimatéria.


Nave Enterprise, seriado Jornada Nas Estrelas

Caso essa tecnologia pudesse ser empregada num vôo espacial, viagens a Marte ou Saturno seriam versões futuristas do que hoje é a ponte aérea Rio-São Paulo. Ainda mais do que isso, essa seria a única maneira conhecida de fazer uma nave com propulsão própria atravessar, num tempo razoável (ou seja, menor que o tempo de vida de um ser humano), a gigantesca distância até as estrelas mais próximas. Com a tecnologia de hoje, só conseguimos construir naves que levariam 80 mil anos para chegar à nossa vizinha Alpha Centauri, a 40 trilhões de quilômetros daqui. Existe um projeto interessante de construir um motor a base de antimatéria em andamento na Universidade da Pensilvânia. Muito bem bolado, o motor proposto pelo chefe do estudo, Gerald Smith, usaria um raio de antiprótons para energizar um reator nuclear. A grande vantagem desse sistema sobre idéias anteriores é que exige apenas alguns milhares de partículas, quantidade fácil de produzir com a tecnologia existente. Segundo Smith, se a coisa funcionar, e se for possível reduzir o custo do combustível, que é hoje altíssimo, poderá acelerar uma grande nave pilotada a uma velocidade em torno de 100 000 quilômetros por hora e reduzir pela metade o tempo de vôo aos planetas. Uma viagem a Marte levaria cerca de 100 dias. O esforço pode não dar em nada. Mas a idéia de usar a antimatéria como combustível deve continuar sendo uma inspiração para o avanço das pesquisas.


A Força Aérea americana, por exemplo, tem gastado milhões de dólares para desenvolver projetos de armas alimentadas por antimatéria. Caso funcionem, esses projetos poderiam dar à luz bombas mais poderosas que as ogivas nucleares. Fala-se também na construção de reatores movidos por ela para a produção de energia elétrica. Faz sentido: um pacote com 10 quilos de antimatéria é capaz de gerar tanta força quanto a Usina de Itaipu trabalhando sem parar por 6 anos. Entretanto, o uso mais interessante e defendido pelos cientistas para a antimatéria é a construção de espaçonaves capazes de cruzar as vastas distâncias entre as estrelas. Parece coisa de “Jornada nas Estrelas”, em que a nave Enterprise fazia suas viagens interestelares com um motor alimentado por matéria e antimatéria. O segredo é que, quando matéria e antimatéria se encontram, o resultado é um jato de partículas de energia pura. Se fosse possível produzir a aniquilação de modo que o jato fosse conduzido numa dada direção, a espaçonave seria impulsionada com grande força na direção oposta. É mais ou menos como funcionam hoje nossos foguetes químicos tradicionais, mas com uma quantidade de energia muito maior. Poderia ser mais eficiente também um carro, por exemplo, que movido a antimatéria só precisaria de 1 grama de combustível para rodar 10 mil quilômetros.

No início, a equipe precisava provar que era capaz de capturar o anti-hidrogênio. Para isso, eles desligavam a armadilha magnética depois de cada tentativa de produzir os anti-átomos - eles conseguiam capturar um anti-átomo a cada 10 tentativas.

Depois de conseguirem a prova, puderam dedicar-se ao melhoramento da armadilha, obtendo melhoramentos significativos, permitindo capturar os anti-átomos e mantê-los até seu decaimento para o estado ground - agora eles capturam um anti-hidrogênio em quase todas as tentativas.

Experiências com antimatéria

Os trabalhos prosseguem sem intervalos. A seguir, os cientistas planejam começar os experimentos diretos com a antimatéria, medindo alterações em seu estado atômico induzido por micro-ondas, o que permitirá avaliar a simetria entre matéria e antimatéria.

O passo seguinte será construir uma armadilha de antimatéria que permita experiências com raios laser.

Os lasers são essenciais para exames de espectroscopia e para "resfriar os anti-átomos", reduzindo sua energia para a realização de outros experimentos.

A equipe ALPHA tem atualmente mais de 40 membros, de 15 universidades ao redor do mundo, incluindo os brasileiros Cláudio Lenz César, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Daniel de Miranda Silveira, atualmente no Laboratório Riken, no Japão.