O Pentágono encomendou recentemente uma série de recomendações ao
Centro de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS, na sigla em
inglês) tendo em vista planos para a criação de bases militares no
Pacífico. O relatório do CSIS do dia 27 recomendou que o Pentágono
transfira forças do Nordeste da Ásia para o Mar do Sul da China.
Especificamente, pediu ao Pentágono que aumente o número de submarinos
de ataque na base de Guam, intensifique a presença dos fuzileiros navais
na região e estude a possibilidade de posicionar um grupo de
porta-aviões no oeste da Austrália.
A região do Mar do Sul da China indubitavelmente está se tornando um
ponto potencialmente inflamável. Este ano, houve um considerável aumento
das disputas por territórios, direitos de pesca e arrendamento de áreas
que produzem petróleo. Um recente congresso da Associação das Nações do
Sudeste Asiático (Asean) em Phnom Penh, no Camboja, com o objetivo de
avançar na elaboração de um código de conduta no Mar do Sul da China,
fracassou. Pela primeira vez em 45 anos, não foi produzida uma
declaração conjunta. O Vietnã e as Filipinas manifestaram-se
particularmente preocupadas porque seus vizinhos do Sudeste Asiático não
conseguiram apresentar uma visão unificada contra as transgressões da
China no mar.
O aumento do poderio militar americano na região, pedido pelo
relatório do CSIS e pelo secretário da Defesa Leon Panetta em um
discurso em junho em Cingapura, pretende em parte dissuadir uma agressão
aberta, como um súbito reinício de guerra nas Coreias ou um ataque da
China a Taiwan.
Embora essas hipóteses atualmente sejam consideradas muito remotas, a
presença militar americana na região cumpre sua missão. Mas e o que
dizer de um adversário que utiliza a estratégia de implementação de
pequenas ações clandestinas cumulativas, nenhuma das quais é motivo para
deflagrar uma guerra, mas que com o tempo acabam provocando uma
importante mudança estratégica?
As instâncias decisórias e os planejadores militares americanos
deveriam considerar a possibilidade de que a China esteja com uma
estratégia desse tipo no Mar do Sul da China, o que poderá atrapalhar os
planos militares de Washington. O Apêndice 4 do relatório anual do
Pentágono deste ano, sobre o poderio militar chinês, mostra a
reivindicação da China em relação ao Mar do Sul, a chamada "linha
tracejada", juntamente com reivindicações menores feitas por outros
países às margens deste mar.
Precedentes
Uma recente matéria da BBC mostra a
reivindicação territorial da China em comparação às zonas econômicas
exclusivas das 200 milhas náuticas, que a convenção da ONU sobre o
Direito do Mar concedeu aos países localizados ao redor deste mar. O
objetivo da estratégia de Pequim seria acumular gradativamente, mediante
pequenas ações persistentes, as provas da presença constante da China
no território que ela reivindica.
Em abril, surgiu um impasse naval entre a China e as Filipinas em
razão da apreensão de barcos de pesca chineses na zona econômica
exclusiva das Filipinas, perto de Scarborough Shoal. O impasse terminou
depois de semanas sem que as questões legais implícitas fossem
resolvidas. Separadamente, as Filipinas agora pretendem começar a
perfurar em busca de gás natural na Reed Bank, perto de sua Ilha
Palawan, decisão contra a qual a China levantou objeções. Uma fragata
chinesa encalhou recentemente a 90 milhas de Palawan; no ano passado,
navios de guerra chineses ameaçaram abalroar um navio de vigilância
filipino perto do Reed Bank.
Em toda essa região, e às vésperas da fracassada cúpula de Phnom
Penh, uma estatal chinesa que se dedica à exploração de petróleo
divulgou uma lista de blocos offshore abertos à licitação para
companhias de exploração de petróleo. Parte de alguns desses blocos já
estava sendo arrendada pelo Vietnã para exploração e desenvolvimento.
Finalmente, em junho, o governo chinês estabeleceu uma "prefeitura"
na cidade de Sansha na Ilha Woody, parte do arquipélago de Paracel, que a
China tirou do Vietnã do Sul em 1974. Sansha será o centro
administrativo para as reivindicações da China de incluir as Ilhas
Spratly, próximo de Reed Bank e Palawan, e o atol de Scarborough. Os
chineses também anunciaram que pretendem enviar uma guarnição militar
para a região.
As ações adotadas pela China parecem uma tentativa para gradativa e
sistematicamente conferir legitimidade às suas reivindicações. Ela
instalou um governo civil local que comandará uma guarnição militar
permanente. Está assegurando seus direitos econômicos pelo arrendamento
de setores de pesca e petrolíferos dentro de áreas de outros países e
enviou sua Marinha para frustrar explorações aprovadas por outras
nações. O prêmio que espera obter no final é o petróleo do Mar do Sul da
China que poderá suprir o país por 60 anos e uma possível neutralização
do sistema de alianças militares dos EUA na área.
O Pentágono pretende enviar reforços militares para a região e criou
novas táticas para usar tais recursos para contrabalançar o crescente
poder militar chinês. Mas os articuladores políticos em Washington vão
se encontrar numa situação difícil, de usar esse poder militar contra um
país como a China. Quando contemplamos uma guerra extremamente cara com
uma grande potência, tais eventos menores parecerão ridículos como
"casus belli". Mas em termos de tempo e espaço essas ações podem levar a
uma mudança fundamental na região.
Rota comercial
Embora, aparentemente, os EUA sejam um
participante distante no drama, as apostas são altas. Tanto a economia
americana quanto a global dependem da liberdade de navegação pelo mar;
US$ 5,3 trilhões de transações globais atravessam o Mar do Sul da China a
cada ano, US$ 1,2 trilhão dos quais passam pelos portos americanos. Em
segundo lugar, os EUA têm grande interesse em evitar que qualquer
potência reescreva unilateralmente a já estabelecida lei internacional
marítima da maneira que quiser. Finalmente, a credibilidade do sistema
de alianças dos EUA e sua fiabilidade como país parceiro no campo da
segurança estarão em risco.
O país que adota esse tipo de estratégia de ações clandestinas e de
menor porte transfere o ônus das suas ações para o adversário. Este
adversário ficará na posição desconfortável de traçar limites
aparentemente injustificáveis e adotar uma política arriscada
insustentável. Para a China, isso significaria simplesmente ignorar a
frota do Pacífico dos EUA e prosseguir com suas ações, supondo que será
impensável para os EUA iniciar uma guerra entre grandes potências por um
incidente trivial num mar distante. Mas o que parece trivial de uma
perspectiva americana poderá ser vital para países como Filipinas e
Vietnã, que tentam defender seu território e seus direitos econômicos de
um confisco de poder aberto e direto.
Esse fato pode dar a estes países um maior incentivo para serem mais
agressivos dos que os EUA na defesa contra as intrusões da China. No
caso de uma disputa armada entre a China e um desses pequenos países, os
dirigentes em Pequim terão de considerar as consequências estratégicas
e, em termos de reputação, de atacar militarmente um vizinho mais
frágil.
Os EUA têm preferido a neutralidade porque não desejam se comprometer
antecipadamente com uma sequência de eventos sobre os quais poderão não
ter nenhum controle. Essa estratégia é compreensível, mas cada vez mais
estará contradizendo as promessas de segurança feitas aos países amigos
na região e o objetivo de preservar as áreas comuns globais. Os
políticos e estrategistas em Washington terão de estudar o que fazer
contra um país do porte da China, que vem implementando ações
clandestinas para assegurar direitos que não são seus.
Por: Robert Haddick, Foreign Policy - COLUNISTA, EDITOR DO SMALL WARS JOURNAL - Via O Estado de S.Paulo - TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK
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