Modificar a pacifista Constituição do Japão, que nesta semana
completou 66 anos, é um dos principais desafios do conservador e
controvertido primeiro-ministro do país, Shinzo Abe, em um ambiente
marcado pela disputa territorial com a China e as ameaças da Coreia do
Norte.
Em seu mandato anterior como chefe de governo (2006-2007), Abe
fracassou em sua tentativa de modificar o artigo 9 da Carta Magna
concebida após a Segunda Guerra Mundial, segundo o qual o Japão renuncia
ao direito de ter um Exército e a declarar guerra.
Mas o aumento da despesa militar de Pequim, sua presença cada vez
mais forte na região e a disputa que mantém com Tóquio pelas ilhas
Senkaku/Diaoyu, assim como a recente campanha de ameaças do regime de
Pyongyang, geraram um ambiente no qual o projeto pode conseguir uma
maior aceitação.
No entanto, antes de buscar reformar a polêmica cláusula pacifista,
Abe defendeu uma mudança do artigo 96, que regula de maneira rígida os
requisitos necessários para se fazer uma emenda da Constituição
japonesa.
Esta norma, que estipula que é necessário o apoio de dois terços dos
parlamentares das duas câmaras e uma maioria simples em um referendo
para modificar qualquer parte da Carta Magna, fez com que seu texto
nunca tenha sido alterado em 66 anos.
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Abe já disse que a emenda do artigo 96, "que ficou bloqueada pelas
forças de ocupação" (dos Estados Unidos após a 2ª Guerra), segundo
afirmou recentemente ao jornal "Yomiuri", estará no programa do Partido
Liberal-Democrata (PLD) para as eleições que renovarão a metade da
câmara Alta em julho.
Segundo as últimas pesquisas, nas duas câmaras e tanto no partido
governante como na oposição muitos parlamentares são a favor de
modificar este artigo.
"Conforme ficar redesenhada a câmara Alta em julho, será mais fácil
ou não aprovar a emenda", explicou à Agência Efe Jun Iio, professor do
Instituto Nacional de Estudos Políticos de Tóquio.
"Haverá boas possibilidades de se conseguir os dois terços nesta
câmara se o PLD (que já tem maioria absoluta na câmara Baixa) e o
Partido para a Restauração do Japão (também conservador) conseguir bons
resultados", acrescentou.
No entanto, apontou Iio, seria necessário depois que mais de 50% dos
japoneses desse seu sinal verde à emenda em um plebiscito "que deveria
ser convocado junto com as próximas eleições gerais", algo que pode
ocorrer só em 2017.
"Em qualquer caso levaria muito tempo emendar o artigo 96 e ainda mais o 9", disse Iio.
As últimas pesquisas mostraram que 48% dos eleitores japoneses são a
favor de aprovar a reforma do artigo 96, que 40% são contra e 12% estão
indecisos.
Em qualquer caso, grupos contrários no Japão e em países vizinhos,
como China e Coreia do Sul, temem que Abe use as tensões regionais como
desculpa para abrir uma porta que permita uma nova onda militarista em
um país que invadiu boa parte da Ásia oriental durante a primeira metade
do século XX.
Os gestos contraditórios e discutíveis do primeiro-ministro, capaz de
defender o caráter "indissolúvel" das relações entre Tóquio e Pequim e
ao mesmo tempo denunciar as "ameaças contra a soberania" japonesa que
segundo seu gabinete a China realiza nas ilhas Senkaku, contribuem para
alimentar essas especulações.
Além disso, Abe foi criticado por suas polêmicas doações ao santuário
de Yasukuni, em Tóquio, onde estão enterrados criminosos de guerra,
pelas recentes fotos publicadas pelo jornal "Mainichi", nas quais ele
aparece vestido de militar em cima de um tanque, e por seus antecedentes
políticos e familiar.
Neto do ex-primeiro-ministro Nobusuke Kishi, um pró-imperialista
condenado e reabilitado depois pelos EUA, Abe é um dos grandes
defensores da atuação do Japão na Ásia antes e durante a Segunda Guerra
Mundial e escreveu vários livros sobre o assunto.
Por isso, sua trajetória contribuiu para desacreditar suas boas
intenções em reformar o artigo 9, o que segundo ele tem o objetivo de
chamar as tropas japonesas de Exército, definir seu papel na
Constituição e autorizá-las a defender o país em caso de ataque.
Fonte: Terra
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