A rua K, no centro de Washington, seria apenas mais uma avenida moderna e
indiferente de uma grande cidade americana, se não fosse pela sua
alcunha de "meca" dos lobistas.
De um lado e de outro, firmas de advocacia e escritórios de consultoria
política vendem serviços corporativos de alto valor agregado: a mediação
das relações entre seus clientes e o governo americano.
A atividade de lobby alcançou US$ 3,3 bilhões (R$ 6,6 bilhões) no ano
passado, segundo cálculos da organização Center for Responsive Politics
(CRP), que monitora as informações repassadas, por lei, pelas entidades e
empresas ao Senado americano.
A lei americana de lobbies requer que as entidades, indivíduos ou
empresas declarem trimestralmente informações como os valores gastos, a
área na qual se fez o lobby e o departamento "alvo" da ofensiva.
Entretanto, entidades criticam a ausência da necessidade de se
declararem os nomes dos parlamentares contatados, ou as leis específicas
que foram alvo da discussão.
Especialistas lembram que a força destes lobbies está não apenas nas
suas atividades juntos aos congressistas, mas também na sua extensa base
de afiliados/eleitores e seus recursos milionários para o financiamento
de campanhas eleitorais.
"Acho que o lobby tem uma função importante, que é a de prover as partes
interessadas (em uma legislação) a oportunidade de passar a sua
mensagem para os membros do Congresso. Afinal, eles têm conhecimento
sobre o assunto", disse à BBC Brasil a diretora de Pesquisas do CRP,
Sarah Bryner.
"O problema é quando um lado tem muito mais poder, dinheiro e influência
que o outro. Há histórias clássicas de que é impossível conseguir uma
reunião com um deputado se sua organização ou empresa não tiver
contribuído com a campanha dele."
DIREITA E ESQUERDA
Os números do CRP mostram um retrato complexo de uma atividade que, no
ano passado, foi exercida por 12.400 pessoas registradas junto ao
Congresso americano.
A primeira constatação é o peso das corporações. Em áreas como a saúde e
o setor financeiro e imobiliário, os gastos corporativos com lobby se
aproximaram de meio bilhão de dólares no ano passado.
Liderando essas despesas no ano passado, as farmacêuticas despejaram US$
234 milhões nessa finalidade, seguidas de longe pelas seguradoras,
companhias elétricas, petroleiras, empresas do setor agrícola e de
defesa, e mesmo das indústrias de tecnologia e TV e cinema.
Definir exatamente como e quando esse dinheiro é capaz de influenciar as
decisões legislativas é um desafio, explica Sarah Bryner.
"Muitas vezes o resultado de um lobby é evitar uma emenda, ou evitar a
votação de um projeto. Sabemos das leis que o Congresso vota, mas
projetos podem nunca ser levados ao plenário e nunca vamos saber."
Porém, ela diz que se engana quem acha que o lobby é uma atividade
exclusiva de "executivos corporativos bem pagos para representar os
interesses capitalistas conservadores".
Há lobbies em prol de causas "de esquerda", como as defendidas por
entidades de meio ambiente que gastaram US$ 16,4 milhões no ano passado.
Encabeçados pela organização Planned Parenthood, o lobby a favor do
aborto gastou US$ 1,2 milhão em 2012, o dobro do que foi gasto por
grupos contra o aborto. Há que se ressaltar, entretanto, que a atividade
política das igrejas --os principais atores políticos entre os chamados
grupos pró-vida-- não é contabilizada neste cálculo.
Como as corporações, os grupos de pressão política estão organizados na
capital americana porque entendem o valor da articulação política,
indica o CRP. Somados, os lobbies "ideológicos", superaram US$ 125
milhões em 2012.
Nesta categoria também estão lobbies tradicionais, como o conservador
pró-Israel, que no ano passado desembolsou US$ 3,5 milhões --77% disto
vindos do Comitê de Assuntos Públicos Americano-Israelense (Aipac, na
sigla em inglês).
E também o lobby a favor das armas, que no início deste ano conseguiu
reunir tamanha força a ponto de já ser considerado o mais influente na
atual política americana.
Os grupos a favor das armas de fogo gastaram US$ 6 milhões em lobby no
ano passado, 25 vezes mais que os grupos a favor do controle delas.
Interesses brasileiros
Sem o poder financeiro das corporações, nem o músculo extra dos grupos
de pressão locais, estão as entidades que defendem os interesses
brasileiros na capital americana.
Atualmente, o escritório King & Spalding LLP vem declarando gastos
de US$ 80 mil por trimestre para representar os interesses da Embraer
junto ao Congresso americano, o Departamento de Defesa, e órgãos
americanos do setor de transporte.
A um custo de R$ 30 mil trimestrais, a associação do setor
sucroalcooleiro, Unica, faz lobby para manter as cotas destinadas ao
etanol avançado --categoria onde se encontra o biocombustível
brasileiro-- no mercado americano.
"Como estrangeiros, nós não temos o peso do eleitorado nem podemos
contribuir com campanhas políticas: precisamos que um congressista
americano acredite na nossa causa", resumiu a representante da Unica
Letícia Phillips.
Apesar de contrariar grandes interesses nos setores do milho
(matéria-prima do etanol americano) e petroleiro, a organização
conseguiu uma vitória ao derrubar em 2011 uma tarifa aplicada ao etanol
importado do Brasil. No ano anterior, a indústria bateu seu recorde em
valor de lobby --US$ 315 mil, segundo a compilação do CRP.
Outro setor em que os interesses brasileiros se chocam com os grandes lobbies americanos é o do algodão.
Desde 2009, o Brasil está autorizado pela Organização Mundial do
Comércio (OMC) a retaliar os EUA por subsídios ao setor algodoeiro que
só podem ser removidos com uma mudança na lei agrícola que está parada
no Congresso americano.
Um acordo entre os países permite evitar as medidas mediante pagamento
anual de US$ 148 milhões dos EUA ao Brasil --mas o entendimento é
temporário.
Segundo dados do Senado, só no ano passado as entidades americanas do
setor algodoeiro destinaram US$ 914 mil para defender, entre outros
subsídios, os seguros de colheita questionados pelo Brasil.
Fonte: UOL
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