O envolvimento de potências internacionais no conflito interno da Síria pode afetar a recuperação econômica global, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Estima-se que a guerra civil na Síria já matou 100 mil pessoas nos últimos dois anos. Com a revelação sobre o uso de armas químicas em um ataque na semana passada, Estados Unidos, Grã-Bretanha e França estão liderando esforços para intervir militarmente na região.

A possível ação – em discussão no Conselho de Segurança da ONU – acontece em um momento em que países desenvolvidos davam sinais de que estavam emergindo da crise econômica dos últimos anos.
Os dados mais recentes sobre o desempenho econômico dos Estados Unidos e da Europa, referentes ao segundo semestre, foram todos acima do esperado.

Petróleo

A principal preocupação dos analistas de economia é com o preço do petróleo. Durante a quarta-feira, o preço do petróleo (Brent bruto) chegou a operar no maior patamar desde maio de 2011.
No começo da semana, o preço do barril avançou 4% e chegou a US$ 117 – o patamar mais alto em cinco meses.
"Desde segunda-feira, houve essa disparada sem precedentes do preço do petróleo, e tudo isso é devido às especulações sobre a Síria", afirma Edward Hardy, analista de mercado da RanSquawk, consultoria londrina.
A Síria não é um grande exportador de petróleo e sequer figura entre os 30 maiores produtores mundiais, mas os acontecimentos no país podem ter reflexo no resto do Oriente Médio.
A Síria abriga importantes linhas de suprimento. Um dos oleodutos mais importantes da região, o Kirkuk-Ceyhan, passa pelo país. O duto é o maior escoador do petróleo do Iraque – sétimo maior produtor mundial – para a Turquia, de onde é exportado para o resto do mundo.
Hardy diz que, caso as potências internacionais entrem em um conflito com o governo, há temores de corte de abastecimento nessa linha. Na segunda Guerra do Golfo, em 2003, um oleoduto que liga o Iraque ao Mediterrâneo via Síria foi bombardeado, e nunca mais voltou a ser usado.
"Um aumento no preço do petróleo tem potencial para afetar os preços nos Estados Unidos e Europa, assim como a confiança dos consumidores e o crescimento econômico nesses mercados, que estão se recuperando."
Hardy destaca que, por ora, a instabilidade no preço do petróleo acontece apenas no curto prazo, e que o conflito teria que sofrer uma escalada para que seu efeito seja mais duradouro.

Instinto

Para Nick Lewis, analista de risco da Capital Spreads, nas próximas semanas será possível saber qual será a dimensão da ação internacional na Síria, o que deve deixar mais claro quais serão as expectativas dos investidores.
"Na última vez que tivemos um cenário parecido [em 2003, na véspera da invasão do Iraque], o preço do petróleo subia porque havia muita demanda, já que a economia global estava bem. Agora é diferente. O problema é que há risco de pouca oferta", diz Lewis.
Mas para o economista sênior do banco londrino Standard Chartered, Philippe Dauba-Pantanacce, a súbita alta do petróleo foi uma reação "instintiva" dos mercados, e não se sustentará no longo prazo.

"Se o passado na região serve de referência, as duas Guerras do Golfo provocaram reações instintivas desde tímidas – em março de 2003 – a abruptas – em agosto de 1990 – nos dois principais mercados de petróleo, o WTI e o Brent. Mas os mercados rapidamente voltaram à normalidade", diz Dauba-Pantanacce.
"O maior risco no momento é de um aumento abrupto no preço de todas as commodities, que provocaria um aumento na inflação e uma deterioração nas balanças de pagamentos dos países, sobretudo nos países mais frágeis. Mas este não é o cenário que prevemos."


Bolsas

Lewis acredita que o preço do petróleo pode influenciar na recuperação das economias da Europa e Estados Unidos, mas para ele outro fator neste momento é mais importante para os mercados do que a situação na Síria.
Para o analista de risco da Capital Spreads, a recuperação dos países ricos está mais ligada ao programa de estímulo monetário dos Estados Unidos (QE3). Este mês, o governo prometeu dar fim ao programa, mas não anunciou como e nem quando isso será feito.
"No médio e longo prazo, isso é mais importante nos mercados globais, pois afeta também as bolsas de valores", diz ele. Lewis lembra que as bolsas em países emergentes já estão tendo forte volatilidade devido ao QE3.
Mas o conflito na Síria também provocou oscilações nas bolsas esta semana.
O Dow Jones, de Nova York, caiu bruscamente na terça-feira, atingindo o menor nível em dois meses. O movimento foi acompanhado pelos índices de Londres, Frankfurt e Paris. Na quarta-feira, houve leve recuperação nos Estados Unidos.
O preço do ouro subiu quase 2%, atingindo US$ 1.420 por onça. A commodity é sempre vista como um porto seguro por investidores durante períodos de alta instabilidade.

Da BBC