A Rússia deu nesta quinta-feira mais um passo para consolidar a anexação da Crimeia. A Duma aprovou por 443 votos a 1 o acordo de anexação da península ucraniana. Nesta sexta, o Conselho da Federação deve ratificar o texto assinado nesta semana pelo presidente Vladimir Putin e por governantes da Crimeia. Pouco depois da aprovação, o presidente Barack Obama anunciou que novas sanções serão impostas a pessoas ligadas ao governo russo e a um banco do país, em resposta à movimentação do Kremlin para tomar a região no sul da Ucrânia.


Ao defender a aprovação no Congresso, o chanceler Sergei Lavrov voltou a falar sobre a população de origem russa que é maioria na Crimeia. “Tenho certeza de que esse documento significará um marco decisivo no destino das nações multiétnicas da Crimeia e da Rússia, que estão ligadas por laços fortes de harmonia histórica”, ressaltou o ministro, falando “em nome de Putin”.
Voltando a mencionar a necessidade de proteger a população de origem russa – principal argumento usado por Putin para buscar a anexação, Lavrov disse que “a ilegalidade continua” na Ucrânia, em uma referência ao governo interino instalado depois da deposição do presidente Viktor Yanukovich, que havia se aproximado do Kremlin. “Há ações diárias de nacionalistas, antissemitas e outros extremistas de quem as novas autoridades ucranianas dependem. A unificação desses povos em um Estado vai promover o bem-estar e a prosperidade e serve aos interesses da Rússia”.
Sem mencionar diretamente os Estados Unidos, Lavrov disse na manhã desta quinta que nações ocidentais estão tentando “preservar sua liderança global e exibir sua excepcionalidade em vez de se esforçar para serem guiadas pelo direito internacional”. O ministro acrescentou que Moscou vai continuar a usar métodos “políticos, diplomáticos e legais” para proteger os russos que estão fora do país.

Sanções – Em resposta ao avanço russo sobre a Crimeia, Barack Obama fez um pronunciamento nesta quinta para anunciar mais sanções contra pessoas ligadas ao Kremlin e contra um banco russo. Também afirmou ter assinado uma ordem  executiva que permite avançar sobre “setores chave” da economia russa. “Queremos que o povo ucraniano possa determinar seu próprio destino e tenha boas relações com os Estados Unidos, a Rússia, a Europa, com quem quiser”.
A ordem executiva permite que sejam aplicadas sanções contra o setor de serviços financeiros, energia, mineração e defesa, segundo uma fonte do governo americano informou à agência Reuters. A nova lista de atingidos pelas sanções inclui vinte pessoas ligadas à ação russa na Crimeia e o banco que será submetido às medidas é o Bank Rossiya, que tem 10 bilhões de dólares em ativos.
Depois dos EUA, foi a vez de a União Europeia decidir acrescentar doze nomes à sua lista de 21 personalidades russas e ucranianas já afetadas pelas sanções impostas na última segunda-feira, anunciou o presidente francês, François Hollande. "Haverá 33 personalidades nessa lista", disse Hollande.
Putin rebate – A Rússia também anunciou sanções contra os Estados Unidos em retaliação ao congelamento de ativos e restrições a viagens anunciados esta semana por Obama. Moscou advertiu que as sanções americanas “vão atingir os Estados Unidos como um bumerangue”. “Ninguém deve ter dúvidas: vamos responder adequadamente a cada golpe hostil”, afirmou a chancelaria russa.
As sanções estão limitadas, por enquanto, a restrições de entrada no país, e atingem membros da administração Obama e congressistas, como o presidente da Câmara dos Deputados, John Boehner, o chefe da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Robert Menendez, e o senador republicano John McCain, que ironizou no Twitter: "Estou orgulhoso por ter sido sancionado por Putin. Nunca vou parar com meus esforços e dedicação à liberdade e independência da Ucrânia, que inclui a Crimeia". 
Assim como Obama não incluiu o ministro Lavrov na lista dos impossibilitados de viajar aos EUA, o que poderia impossibilitar algum encontro diplomático, Moscou também não colocou o secretário de Estado americano John Kerry em sua lista de sancionados. Também ficaram fora a conselheira de segurança Susan Rice e a embaixadora do país na ONU, Samantha Power. 
Europa – A chanceler alemã Angela Merkel disse ao Parlamento em Berlim que 28 líderes da União Europeia devem demonstrar que estão prontos para seguir rumo a sanções econômicas contra a Rússia. “A reunião da União Europeia hoje e amanhã deixará claro que estamos prontos para, a qualquer tempo, iniciar a fase 3 de medidas se houver uma piora na situação”.
Alguns diplomatas leram a declaração de Merkel como um reconhecimento implícito de que a Crimeia está perdida e que apenas novos passos de Moscou no sentido de desestabilizar a Ucrânia ou intervir em outras repúblicas pós-soviéticas resultaria em sanções que possam prejudicar economias convalescentes no Ocidente e também na Rússia.


Transição – O acordo aprovado pela Duma entrará em vigor quando for ratificado e determina que a Crimeia estará totalmente integrada à Rússia após um período de transição previsto para terminar no dia 1º de janeiro de 2015.
A Rússia já começou a emitir passaportes para a população da Crimeia, que aprovou em referendo realizado no último domingo a anexação à Rússia. O referendo é considerado ilegal pelo governo interino em Kiev, por EUA e países da União Europeia. Apesar dos discursos contrários à movimentação russa na península, há sinais de que a região já é dada como perdida. Ontem, por exemplo, as autoridades ucranianas anunciaram a retirada de soldados e familiares do território, depois que unidades leais a Moscou invadiram unidades militares em Simferopol. 
O Kremlin também está agindo para auxiliar a economia da região, que depende de Kiev para obter 85% de sua eletricidade, 90% de sua água potável e muitos de seus itens de alimentação. O ministro das Finanças Anton Siluanov afirmou que Moscou vai cobrir o déficit orçamentário da Crimeia, estimado em 1,5 bilhão de dólares, com recursos dos cofres russos. O ministro de Energia, Alexander Novak, disse que o país também tem como garantir uma fonte constante de energia para a Crimeia, por meio do fornecimento de fontes back-up e do controle de reservas de combustível.

De Veja