O fogo destruiu o edifício inteiro em poucas horas
A tarde da quinta-feira, dia 24 de fevereiro de 1972, foi quente e abafada em São Paulo.  Centenas de pessoas trabalhavam nos escritórios do Edifício Andraus, um grande e imponente edifício na Avenida São João, quando uma dramática notícia se espalhou rapidamente por seus 32 andares: o prédio estava pegando fogo.
Um turbilhão de chamas destroi o Edifício Andraus
Aconteceu por volta das 16 horas e 20 minutos, entre a primeira e a segunda sobreloja das Casas Pirani, uma grande e já extinta loja de departamentos que ocupava o subsolo, o térreo e as sobrelojas do edifício. Há controvérsias sobre a origem do incêndio, mas é provável que tenha sido causado por uma sobrecarga na rede elétrica.
Helicóptero Enstrom no teto do Andraus
Construído em 1962, com 115 metros de altura e 32 andares, o Edifício Andraus tinha grande beleza arquitetônica, mas, assim como todos os prédios altos de São Paulo, na época, não possuia sistema de combate ao fogo, nem hidrantes, nem escadas de incêndio, e nem sequer extintores nos corredores. Como resultado, o fogo começou a subir para os andares superiores, e as pessoas que lá trabalhavam subitamente se viram encurraladas: não era possível descer, e o fogo subia rapidamente. Muitos se viram cercados pelo fogo nos andares, enquanto a maioria subia as escadas para atingir o terraço do prédio, onde havia um heliponto, raro naquela época.
O fato do prédio possuir um heliponto foi essencial para que aquelas pessoas fossem salvas, mas isso não quer dizer que uma operação de resgate fosse fácil. Um vento quente soprava no centro de São Paulo naquela tarde, atiçando as chamas em direção à Avenida São João, uma das mais movimentadas de São Paulo. O incêndio logo atingiu proporções devastadoras, tomando conta do prédio inteiro.
Resgate de uma criança, vítima do incêndio no Andraus
O Comandante Olendino Francisco de Souza, que comandava o SSA - Serviço de Salvamento Aéreo de São Paulo, foi convocado para levar o seu helicóptero, um Bell 204B, matriculado PP-ENC, para o Edifício Andraus, acompanhado do Coronel Gilson Rosemberg, da 4ª Zona Aérea da FAB. Souza foi, segundo ele, o primeiro a chegar no local, e manobrou o pesado helicóptero, uma versão civil do famoso "sapão", o Bell UH-1 Huey, no meio da fumaça e da grande turbulência criada pelo vento e pelo próprio incêndio. Cerca de 40 minutos já se haviam passado desde o início do incêndio, e nos andares abaixo, vítimas encurraladas se atiravam do prédio para não morrerem queimadas.
O Bel 204B pilotado pelo Cmte. Souza, resgatando sobreviventes do Edifício Andraus
Souza teve receio de apoiar o peso do helicóptero no pequeno heliponto, feito para aeronaves bem menores, e então manteve potência suficiente para que a máquina apenas tocasse o piso. Com o auxílio do Coronel Gibson, embarcou as pessoas que conseguiu e voltou ao Aeroporto de Congonhas para desembarcá-las. Muitos estavam feridos, queimados ou intoxicados pela fumaça. O DAC achou por bem fechar o aeroporto para as demais aeronaves, permitindo mais agilidade nas operações de resgate. Só reabriu após o último pouso dos helicópteros de resgate.
Após o PP-ENC levantar voo do terraço do Andraus, outros helicópteros da cidade logo manobravam em volta do edifício, agora totalmente tomado pelo fogo. O Comandante Walmir Fonseca Sayão, a bordo do PP-EES, um Hiller FH-1100, já tinha conseguido sobrevoar o terraço antes de Souza, e pediu para as cerca de 50 pessoas que estavam lá, que derrubassem as antenas e outros obstáculos que poderiam atrapalhar o pouso dos helicópteros. logo a área estava limpa, mas, ao tentar resgatar as vítimas, verificou que quase atingiu-as com o rotor de cauda. Verificou ainda que a temperatura do motor subiu rapidamente, e que o helicóptero perdeu potência. Abortou o resgate, desceu até um ponto logo acima da Praça da República, para esfriar o motor e recuperar potência, e depois, com pouco combustível, foi até Congonhas reabastecer.
O caos na Avenida São João
As 50 pessoas avistadas por Sayão subitamente se transformaram em uma multidão de mais de 300 pessoas. Muitas vítimas não estavam conseguindo acessar o terraço devido a um portão de ferro trancado, mas logo conseguiram arrombá-lo e chegar ao heliponto para esperar o resgate.

Logo muitos outros helicópteros, do poder público ou privados, estavam sobrevoando o local: PT-HCP, da Anhembi Aviação, pilotado por Judimar Piccoli; PT-HDH, um Bell 206 da Audi, pilotado pelo Capitão Portugal Motta; PP-HBN, um Bell 206 da Pirelli, pilotado por Carlos Zanini, PP-HBM, um Hughes 300 da Votec, pilotado por Leo Waddington Rosa; PT-HCM, um Hughes 300 pilotado por Silvio Monteiro; PT-HCB, um Enstrom F28 da Anhembi Aviação, pilotado por Cláudio Finatti; PT-HCQ, um Enstron F-28, particular, pilotado por Sérgio Bering; PP-MAB, da Prefeitura Municipal de São Paulo, pilotado pelo Coronel Fonseca; PP-HDC, um Bell 206 da Papel Simão, pilotado pelo Coronel Telmo Torres Ayres.

O espaço aéreo ao redor do Edifício Andraus ficou simplesmente caótico, com tantas aeronaves em meio à fumaça e à turbulência do incêndio. Os coronéis da FAB que estavam, então, coordenando as atividades aéreas, temeram pela segurança dos helicópteros, e resolveram ordenar que os helicópteros pequenos, os Hughes e os Enstrom, equipados com motores a pistão, se retirassem do local.
O edifício Andraus destruído. Seria restaurado posteriormente
A decisão foi acertada. Os pequenos helicópteros conseguiam tirar apenas um ou dois sobreviventes de cima do prédio de cada vez, atrasando o pouso das aeronaves maiores,, e o incêndio poderia ser muito perigoso para essas aeronaves, equipadas com motores que consumiam a volátil gasolina de aviação. Dessa forma, permaneceram na missão os Bell 206 PT-HDH, PP-HBN e PP-HDC, o Bell 204 PP-ENC e o Hiller FH-1100 PP-EES.

Apesar disso, os helicópteros menores fizeram um esforço heróico, e o piloto Leo Waddington Rosa foi o que mais resgatou sobreviventes entre os pilotos dessas aeronaves, cinco no total.

O fogo começou a esmorecer em torno das 19 horas, mas o resgate continuou até a retirada do último sobrevivente do terraço do Andraus, pouco antes das 22 horas.

O comandante Olendino Souza, que operou a maior aeronave envolvida no resgate das vítimas do incêndio do Edifício Andraus, foi a grande estrela da operação, pois resgatou 307, dos mais de 400 sobreviventes resgatados do topo do prédio. Souza percorreu 32 vezes o percurso de ida e volta entre o Andraus e o Aeroporto de Congonhas. Completamente exausto, deitou-se na pista, ao lado do helicóptero, e adormeceu profundamente. Acordou horas depois, cercado de enfermeiros e médicos, no ambulatório do aeroporto. Souza receberia diversas homenagens e condecorações das autoridades, depois do incêndio.
A tragédia do Edifício Joelma, em 1974, matou 187 pessoas
Embora trágico, o incêndio do Edifício Andraus teve um relativamente pequeno número de vítimas fatais, 16, muitas das quais se atiraram do alto do prédio. Cerca de 330 pessoas ficaram feridas. Dois anos depois, um incêndio de grandes proporções atingiu outro prédio de São Paulo, o Joelma. O número de vítimas, dessa vez, foi muito maior, 187 mortos. No Edifício Joelma, os helicópteros não puderam fazer praticamente nada, pois o prédio não possuía um heliponto, e nem mesmo um terraço adequado.

Sem a operação aérea de resgate, o número de vítimas fatais do incêndio do Edifício Andraus poderia superior a 400. Com grande risco de perder a vida em um acidente, os pilotos dos helicópteros foram os grandes heróis do ano de 1972, em São Paulo e no Brasil inteiro.
O edifício Andraus em 2010: sem cicatrizes
Com uma sólida estrutura em concreto armado, o Edifício Andraus sobreviveu ao incêndio. Sua estrutura pode ser restaurada, e o prédio voltou a ser ocupado por escritórios e repartições públicas alguns anos depois. É um dos prédios mais seguros de São Paulo. Se a sua estrutura fosse de aço, como a das torres gêmeas do World Trade Center de Nova York, teria, sem dúvida alguma, desabado. No inquérito policial feito em 1972, ninguém jamais foi responsabilizado pela tragédia.