Em reestruturação, Embraer já demite 500 no interior paulista
Júlio Ottoboni - (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 5)
São José dos Campos (SP), 8 de Agosto de 2008 - Sem revelar o número e o motivo das dispensas, a direção da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer) confirmou ontem o início de um processo de reestruturação organizacional. Apesar não fornecer informações a respeito das causas do procedimento, as queixas da direção sobre a política cambial eram constantes. Segundo o sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos, cidade sede da companhia, o número de demitidos deve girar em torno de 500 empregados.
Segundo especialistas da área, dois fatores levaram a essa decisão. O baixo valor do dólar americano diante da moeda nacional criou dificuldades na manutenção dos custos de produção. Além da retração do mercado aeronáutico mundial diante da alta do preço do barril aeronáutico e, por conseqüência, do querosene aeronáutico. Tanto a Boeing com a Airbus, duas maiores fabricantes do mundo, fizeram ajustes em seus quadros funcionais assim que teve início a crise do petróleo.
Encomendas mantidas
Na divulgação do resultado financeiro do 2º trimestre, a empresa apresentou em 30 de junho o número de 23.855 empregados e sua carteira de pedidos firmes totalizava US$ 20,7 bilhões. De acordo com a Embraer, os alvos da reestruturação são os setores administrativos e cargos gerenciais. As entregas estão todas confirmadas para serem cumpridas dentro de seus cronogramas iniciais. Inexiste oficialmente até o momento cancelamento de encomendas e as cadências produtivas dos jatos comerciais e executivos seguirão dentro das programações previstas anteriormente.
A direção da Embraer classificou a ação como ocorrência de "relativa freqüência em organizações industriais de grande porte". O sindicato dos metalúrgicos não foi comunicado oficialmente pela Embraer sobre as demissões que vêm sendo feitas na empresa. Também não foi informado sobre o número exato de desligamentos feitos até agora.
Segundo nota oficial distribuída pela entidade de classe, " a estimativa é que cerca de 500 trabalhadores dos setores administrativo, engenharia e área técnica da empresa tenham sido desligados entre os dias 4 e 5 de agosto. Isso sem contar as demissões do setor produtivo, que vêm ocorrendo regularmente desde o início do ano", informou o comunicado.
Redução de jornada
"Como solução para combater as demissões, o sindicato defende a redução da jornada de trabalho na empresa, sem redução de salários e sem banco de horas. Agora, após a nova onda de demissões, a necessidade de tomar uma providência urgente, promovendo a redução da jornada, ficou ainda mais evidente. Os trabalhadores não podem mais ser penalizados", afirmou o presidente do sindicato, Adilson dos Santos.
Embraer adota modelo automotivo para ganhar mais produtividade
Marli Olmos - de São Paulo - Valor online
O presidente da embraer, Frederico Curado, decidiu acabar com o paradigma de que a fabricação de aviões é uma processo manual e artesanal. Há exatamente um ano, pouco depois de assumir o cargo, o executivo implantou em todas as fábricas da companhia um programa de manufatura enxuta chamado "lean", um velho conhecido da indústria automobilística. Em alguns meses, a empresa terá o seu primeiro robô, encarregado da perfuração das asas do modelo Phenom, a nova aeronave executiva.
A mudança do sistema de produção começou porque a empresa precisava melhorar a produtividade, aumentar a rentabilidade e, em última instância, melhorar a competitividade.
Curado foi buscar a experiência de uma consultoria japonesa, alinhada com o famoso método de produção enxuta em empresas do setor automotivo como a Toyota.
"Estamos no começo da maratona", diz Curado. "Umas das principais estratégias que pessoalmente estou visualizando para elevar a competitividade da embraer é aproximar mais a produção do modelo automobilístico do que o aeronáutico clássico", disse.
Algumas mudanças já foram feitas, como alterações no "layout" e regras para reduzir desperdícios. A nova ordem vale para a fábrica e a área administrativa. Nos produtos que estão nascendo agora, a mudança será mais clara e mais próxima do estilo ritmado da indústria automobilística.
Um exemplo é o modelo de aviões executivos Phenom 100 e 300. A produção dessas aeronaves já funciona sem estoques na linha. O operário permanece no seu posto de trabalho e ali é abastecido com componentes.
Para sustentar o novo modelo, a embraer decidiu criar um armazém de peças e está conversando com todos os fornecedores para que eles também tenham estoques intermediários de apoio. "Não será um `just-in-time´ como em uma fábrica de automóveis, mas já será pequena revolução", diz Curado.
No início do próximo ano, a fábrica de Botucatu, onde é produzido o modelo Phenom , receberá o robô que passará a fazer os milhares de furos da asa, uma operação repetitiva, que requer alto grau de precisão. "Eu vejo a automação como um dever e não um direito", afirma.
Recentemente, Curado ficou sabendo que a americana Boeing também começou a adotar a automação, o que, de certa forma, sinalizou que a embraer está no caminho certo.
O objetivo dessa reviravolta no sistema de produzir aviões sustenta-se na necessidade de aumentar a eficiência e retomar índices de rentabilidade mais elevados. A embraer fechou o balanço do ano passado com uma margem operacional de 4,5%, considerada baixa pelos analistas. A meta é chegar a 8% ou 9% este ano e 10% a 12%, em 2009.
Se os planos da empresa derem certo, essa expansão virá com ganho de escala com os programas de aumento de eficiência aliados a uma elevação de faturamento, previsto para sair de US$ 5,3 bilhões em 2007 para US$ 6,5 bilhões este ano. Em 2009 a previsão é de US$ 7 bilhões.
A batalha pelo aumento de rentabilidade também passa pelo enxugamento de custos no efetivo. Em nota distribuída à imprensa, ontem, a embraer confirmou "ajustes em sua estrutura organizacional afetando posições de gerência e administrativas". A empresa lembrou que este movimento "ocorre com relativa freqüência em organizações industriais de grande porte", mas não confirmou a informação do sindicato dos metalúrgicos de São José do Campos de que 500 trabalhadores já teriam sido desligados.
Durante entrevista ao Valor, há poucos dias, Curado se queixou da carga tributária sobre folha de pagamento. "É uma barbaridade", disse, ao acrescentar que isso faz o país perder competitividade.
A valorização do real também afeta a competitividade da embraer, afirma o presidente da companhia, principalmente em relação aos concorrentes americanos. Por sorte, o euro e o dólar canadense também se fortaleceram, aliviando a disputa da empresa brasileira com a européia Airbus e a canadense Bombardier.
Se o câmbio afeta os fabricantes, o aumento nos preços do petróleo atinge as companhias aéreas. Segundo Curado, por enquanto, a crise no petróleo levou a empresa a aceitar negociar prazos com clientes. Mas não houve cancelamentos de pedidos. "Em muitos casos nossos aviões podem ser a solução para as empresas que precisam trocar as aeronaves mais antigas pelas mais econômicas", afirma.
O executivo cita o caso da Azul, seu cliente recente, que optou pelos aviões menores para explorar rotas regionais. Para ele, essa companhia vai quebrar o modelo tradicional de empresas que têm poucas linhas a alta densidade de passageiros. "O serviço para o passageiro não é ideal porque obriga a fazer conexões", diz.
Em tese, diz, a alta do combustível vai afetar as empresas aéreas no mundo, o que trará efeitos também na indústria de aviões. Mas, para Curado, "ainda é cedo para prognósticos negativos".
Ele diz que é preciso esperar pela reação do mercado ao que vai acontecer com os aumentos nos preços das passagens aéreas. A partir disso, surgirá o novo tamanho do mercado. O executivo vislumbra também um período de consolidação, com fusões entre as companhias, o que ele considera muito saudável em um mercado em que sobram assentos. Mas, de maneira geral, Curado não prevê uma crise muito profunda. "As pessoas precisam voar a negócios e querem viajar para o lazer", destaca.
Enquanto aguarda por esse novo cenário, Curado prossegue na batalha em busca da rentabilidade. A embraer já depende menos dos clientes dos Estados Unidos e começa a avançar na Ásia e Oriente Médio. No segundo trimestre, a empresa conseguiu elevar seu ganho líquido em 121,2%, somando R$ 176,3 milhões.
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