Alexandre Barros - Estadão
Depois do acidente da TAM em Congonhas, o ministro Nelson Jobim anunciou o novo Plano de Defesa do Brasil para setembro de 2008. Por que setembro? Por que não julho ou outubro? Suspeito, seriamente, que seria para coincidir com o 7 de Setembro, que já passou e, até agora, nada de plano.
O anúncio foi feito na cerimônia de apresentação dos novos generais ao presidente, ainda em 2007. Comparados comigo, eles são todos muito jovens. Em relação à velocidade de mudança do mundo, receio que estejam muito velhos.
Afinal, por que a idade é tão importante? É simples: Forças Armadas são burocracias que operam fora do mercado. Nelas existe apenas uma maneira de subir: fazer só o que os chefes mandam. E, como todas as burocracias não sujeitas às punições do mercado, elas não são capazes de aprender com seus próprios erros.
Só progridem nas burocracias os muito obedientes e os pouco criativos. Qualquer burocracia pública é assim. Inovação e atrevimento são punidos. O conformismo é premiado.
Oficiais jovens norte-americanos combatentes no Iraque estão começando a se insurgir contra essas características burocráticas das Forças Armadas dos EUA, que nisso são iguais a todas as outras. Os generais não vão ao campo de batalha nem costumam ter agilidade mental para acompanhar as mudanças do mundo, da tecnologia e, conseqüentemente, da estratégia. O resultado é que uma das coisas mais caras aos militares, a doutrina (que, trocando em miúdos, quer dizer: como se empregam as Forças Armadas em batalhas), acaba ficando desatualizada. Isso é muito grave num mundo que se move cada vez mais rapidamente.
No caso brasileiro é mais sério ainda, porque nossas Forças Armadas não se envolvem em guerras há muito tempo. Disse-me um oficial: "As Forças Armadas brasileiras medem a capacidade dos oficiais pelas notas que tiram nas escolas militares. Seus méritos são testados em batalhas simuladas entre azuis e vermelhos, e não em combates reais, com munição de verdade."
Em exércitos guerreiros, mesmo com a inércia burocrática, ainda há espaço para a inovação nas guerras. Heróis são os indisciplinados que dão certo. Militarmente, isso é simples: o indisciplinado que fez alguma coisa diferente das ordens que recebeu, e morreu, deu errado. O que sobreviveu e ajudou a ganhar a batalha virou herói e contribuiu para a mudança da doutrina.
Sem guerra e com promoções dos mais conformistas, nossa rota para a inovação militar está cheia de obstáculos.
Militares não são pagos para olhar o que militares de outros países fazem. Eles são pagos para adivinhar o que potenciais inimigos externos ou elementos desestabilizadores podem ou vão fazer. Daí a importância dos serviços de espionagem.
Os orçamentos militares, no Brasil, sempre foram definidos pelos militares, sem ouvirem ninguém. Eles definem quem acham que são os inimigos (ou acreditam em histórias que lhes contam), determinam do que precisam para combater quem eles acham que são os inimigos e o Congresso vota sem ter idéia do que está aprovando.
Numa democracia com controle civil, como se presume que seja a nossa, espera-se que os militares digam à sociedade ou aos representantes por ela eleitos, primeiro, contra o que e contra quem eles pretendem nos defender; segundo, como pretendem fazer isso; terceiro, com que meios e recursos eles precisam contar; quarto, quanto isso vai custar. E, finalmente: será que não dá para fazer isso por um preço mais barato?
Nenhuma dessas condições tem sido atendida pelos militares brasileiros.
Agora vamos ao que comprar. Como não temos tecnologia militar de ponta - se deveríamos ter ou não é outra questão -, estamos limitados a comprar o que está disponível no mercado.
Essas coisas se dividem em três categorias: material não-letal, letal de baixa tecnologia e letal de alta tecnologia.
No primeiro quesito estamos bem: fardas, botinas, marmitas, cozinhas de campanha, caminhões e coisas que tais. Destas a indústria local dá conta. Quanto ao material letal de baixa tecnologia, ainda damos conta de boa parte. Afinal, a indústria nacional de armas, bem como as de metalurgia, podem, em curto espaço de tempo, adaptar-se para suprir boa parte das necessidades.
A porca torce o rabo é nos materiais letais de alta tecnologia. Estes os países fornecedores cedem ou vendem sem transferir tecnologia (e as Forças Armadas brasileiras só gostam de adquirir material com transferência de tecnologia, o que limita significativamente o número de supridores). Temos de aceitar o que nos for oferecido, na quantidade e nos prazos que os vendedores fixarem. Negociações nessa área são longas e complicadas.
Desde o ano passado as coisas se complicam na Bolívia. O país está dividido e o grau de violência aumenta.
A Rússia manda bombardeiros para manobras conjuntas com as forças militares da Venezuela.
Os anúncios da Petrobrás informam que as reservas presumidas de petróleo brasileiro no Atlântico são bem maiores do que se pensava.
Os EUA reativaram a IV Frota, responsável pelo patrulhamento e segurança no Atlântico Sul.
E o Plano de Defesa, anunciado pelo ministro Jobim para setembro, que fim levou?
Numa de suas primeiras declarações o ministro Jobim disse muito energicamente, sobre a crise aérea, que não importava a cor do gato, desde que ele matasse o rato.
A ausência de um Plano de Defesa claro, para uma politéia que tem crises pipocando em volta, parece levar a crer que o ministro se atrapalhou na sua declaração e disse o contrário do que talvez quisesse dizer: que ele achava que, na realidade, a cor do gato é muito mais importante do que a morte do rato.
Alexandre Barros, Ph.D. em Ciência Política (University of Chicago), é pró-reitor do Centro Universitário Unieuro (Brasília)
Plano de defesa sai até o fim de outubro, diz Jobim
Da Reuters do G1 - Por Eduardo Simões
ITAPEMIRIM, Espírito Santo (Reuters) - O Plano Nacional de Defesa, inicialmente previsto para ser anunciado em 7 de setembro, será divulgado até o fim de outubro, disse o ministro da Defesa, Nelson Jobim, nesta segunda-feira.
O ministro também anunciou que a decisão sobre o acordo de cooperação militar com a França já foi tomada pelo governo e o pacto será assinado no fim do ano, durante uma visita do presidente francês ao Brasil.
O ministro reconheceu que as Forças Armadas precisam de equipamentos novos para cumprir suas funções.
"É evidente que precisam. Creio que até o fim de outubro devemos anunciar o Plano Nacional, que vai demonstrar claramente o tipo de modelo que temos de discutir", disse Jobim, na cidade de Itapemirim, no Espírito Santo, onde acompanhou demonstrações da Operação Atlântico, que simula uma guerra pelo controle da infra-estrutura petrolífera dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu submeter o plano de defesa ao Conselho de Defesa Nacional, que vai se reunir no início de outubro.
Segundo Jobim, no fim de dezembro, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, virá ao país para assinar um acordo militar que envolve transferência de tecnologia para a conclusão do projeto de construção do submarino a propulsão nuclear.
"O Brasil dispõe do controle do combustível. O acordo com a França é a construção da parte não nuclear do submarino", disse o ministro a jornalistas.
"O presidente Sarkozy virá ao Brasil no fim do ano e deve assinar o acordo estratégico em 22 ou 23 de dezembro", acrescentou Jobim. Segundo o ministro, além da parceria na construção do submarino nuclear, o acordo com a França também inclui a fabricação de helicópteros militares numa das fábricas da Helibrás e a capacitação de tropas do Exército. O submarino nuclear é uma das prioridades do Brasil, depois da descoberta de reservas petrolíferas na área do pré-sal, que tem potencial para transformar o país em um dos principais produtores de petróleo.
Questionado sobre um eventual desconforto provocado pelo anúncio de um exercício militar conjunto entre Rússia e Venezuela, na América do Sul, Jobim foi direto.
"Isso é um problema da Venezuela", disse.
Lula teria ficado descontente com a realização do exercício, dizendo que Hugo Chávez, o presidente venezuelano, está trazendo para a América do Sul um conflito que não diz respeito a ela. Desde agosto, a Rússia e os Estados Unidos trocam farpas devido à incursão militar russa na região separatista de Ossétia do Sul, na Geórgia, país apoiado pelos Estados Unidos.
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