Novo livro propõe hipótese de espionagem para progresso russo na área.
Teste da URSS aconteceu em 1955; avanço rápido supreendeu os EUA.
Um momento decisivo da Guerra Fria aconteceu em 1955, quando Moscou detonou sua primeira bomba de hidrogênio – uma arma cerca de mil vezes mais poderosa do que bombas atômicas e ideal para destruir grandes cidades. A bomba acabou com o monopólio americano e representou um perigo mortal. Desde então, Washington lidou muito mais cuidadosamente com Moscou, iniciando uma era de tensão dominada pelo medo mútuo de aniquilação.
Imagem colorida do teste russo da bomba de hidrogênio, em 1955... (Foto: NYT)
Um novo livro afirma que Moscou adquiriu o segredo da bomba de hidrogênio não de seus próprios cientistas, mas de um espião atômico infiltrado no laboratório de armas de Los Alamos, no Novo México. Historiadores consideram o caso incompleto, porém merecedor de uma investigação. Eles afirmam que o livro, "The Nuclear Express: A Political History of the Bomb and its Proliferation" (O expresso nuclear: uma história política da bomba e de sua proliferação), de Thomas C. Reed e Danny B. Stillman, soma-se a um número crescente de enigmas sobre quem inventou a bomba de hidrogênio soviética, meio século atrás.
... e a imagem em preto e branco do teste (Foto: NYT)
"É bem intrigante", comentou Robert S. Norris, historiador nuclear, em relação ao livro. "Aprendemos muito sobre espiões atômicos. Agora, descobrimos que um espião pode estar também no centro da história da bomba de hidrogênio."
Uma pista surpreendente citada pelos autores é um desacordo entre cientistas nucleares russos sobre quem merece crédito pelo avanço, como também algumas alegações de que a espionagem teve um papel nisso tudo. O livro detalha esse conflito russo e questiona a idéia popular de que Andrei D. Sakharov, conhecido mais tarde por suas campanhas pelos direitos humanos, criou a bomba de hidrogênio soviética de forma independente.
Sem nome
O livro não dá nome ao espião suspeito, mas afirma que ele nasceu nos Estados Unidos, cresceu em um país estrangeiro, se envolveu com simpatizantes do comunismo durante a Grande Depressão, e trabalhou em Los Alamos durante a Segunda Guerra Mundial. Depois, afirma o livro, ele se "envolveu profundamente" no esforço americano de desenvolver a bomba de hidrogênio.
A obra afirma que Stillman, físico em Los Alamos de 1965 a 2000 e diretor de inteligência do laboratório por mais de dez anos, levou suas suspeitas ao FBI na década de 1990, mas a investigação, segundo o livro, foi "inimaginavelmente falha" e não levou a nada. O suposto espião, segundo o livro, está morto. O FBI, geralmente acusado de falta de organização em casos de espionagem atômica, se recusou a comentar.
Historiadores e cientistas nucleares chamam o argumento do livro de provocador, quando não vago e aparentemente circunstancial. Eles acrescentam que o suspeito provavelmente não será o último a ser indicado e responsabilizado pelo progresso soviético. "É um quebra-cabeças fascinante", disse David Holloway, autor de "Stalin and the Bomb" (Stalin e a Bomba) e historiador militar da Universidade de Stanford. "Mistério é uma palavra muito forte. Mas como exatamente os físicos soviéticos chegaram à idéia permanece incerto."
Harold M. Agnew, que trabalhou como colaborador no desenvolvimento da primeira bomba de hidrogênio do mundo e futuro diretor de Los Alamos, afirmou que os soviéticos provavelmente tiveram inúmeros espiões para divulgar o segredo. "Sempre ficamos surpresos", ele disse, "ao ver o quanto eles avançavam rapidamente".
Espalhando segredos
O novo livro está previsto para ser lançado em janeiro pela Zenith Press. Um dos focos principais é como os espiões espalharam segredos nucleares por todo o mundo. Nos últimos anos, o número de espiões soviéticos conhecidos e infiltrados no Manhattan Project para construir a bomba atômica aumentou para meia dúzia, e espera-se que mais nomes sejam revelados. No entanto, até agora, relatórios do projeto subseqüente de Los Alamos para a construção da bomba de hidrogênio não documentaram grandes episódios de espionagem atômica.
Bombas de hidrogênio, ao contrário de suas primas atômicas, são ilimitadas no tamanho. Cientistas americanos que buscavam criar uma dessas na década de 1940 e começo da década de 1950 chamavam a arma de seus sonhos de "A Super". Os criadores que obtiveram sucesso foram Edward Teller e Stanislaw M. Ulam. A façanha de 1951, conhecida como "implosão de radiação", exigia colocar uma bomba de átomos em uma extremidade de uma caixa de metal e hidrogênio na outra. A chama da explosão da bomba de átomos era para inundar o interior da caixa com radiação suficiente para comprimir e incendiar o combustível hidrogênio, liberando grandes explosões de energia através de fusão nuclear.
No final de 1952, o primeiro teste da idéia causou o desaparecimento da ilha Elugelab, do Pacífico. A explosão foi 700 vezes mais poderosa que a de Hiroshima. Moscou não tinha nada comparável, até 1955. A URSS então fez um arsenal de bombas de hidrogênio que, na época, fez o de Washington parecer minúsculo. Ela também detonou a maior bomba do mundo – uma gigante três mil vezes mais poderosa que a explosão de Hiroshima.
Com o passar das décadas, estudiosos identificaram Klaus Fuchs como uma possível fonte da inteligência da bomba de hidrogênio. O espião soviético no Manhattan Project deixou Los Alamos em 1946, e deu a Moscou as idéias sobre a bomba de hidrogênio, sendo preso em 1950. Porém, a maioria dos estudiosos julga suas dicas muito precoces, incompletas e errôneas para terem fornecido tanta assistência.
Os autores de "The Nuclear Express" afirmaram em entrevistas que seu interesse na edição se agitou depois da Guerra Fria, quando ex-cientistas nucleares soviéticos contaram sobre seu trabalho escondido. Reed, ex-criador de bombas de hidrogênio do laboratório Livermore, na Califórnia, e ex-secretário da Força Aérea, conheceu vários cientistas russos em Livermore em março de 1997. Ele disse que as reuniões abriram seus olhos. Os cientistas russos descreveram como Sakharov nunca recebeu crédito pela façanha da bomba de hidrogênio. Lev P. Feoktistov, membro da equipe de fundação da bomba de hidrogênio, sugeriu que espionagem não-relacionada a Fuchs desempenhou um papel.
Em seu livro de 1999, "Nukes Are Not Forever" (Bombas nucleares não são para sempre), ele reiterou o argumento. "Não posso fugir da sensação", escreveu Feoktistov, "de que estendíamos uma mão de vez em quando, embora de uma forma despercebida". Por exemplo, ele disse que a equipe soviética recebe um projeto de bomba que não era familiar que ele depois identificou como sendo o trabalho de Ulam, o pioneiro americano da bomba de hidrogênio. O rascunho mostrava um projeto que precedia a façanha da implosão de radiação.
Entre as revelações após a Guerra Fria, Stillman, em Los Alamos, se concentrou em um candidato a espião. Em entrevista, ele contou que suas suspeitas foram levantadas por um número de razões, incluindo a grande riqueza aparente do homem. Stillman afirmou que a investigação do FBI desmoronou na década de 1990 quando o escritório de Santa Fé se envolveu no caso de um moderno e suposto espião em Los Alamos – Wen Ho Lee. Em tempo, todas as acusações contra Lee, exceto uma, foram derrubadas após um juiz encontrar falhas significativas no caso do governo. O episódio é visto como responsável pelo aumento do nível federal de novas acusações de espionagem atômica.
Quando Reed e Stillman começaram a colaboração para o livro, eles julgavam ter peças complementares do quebra-cabeça da bomba de hidrogênio. No livro, eles afirmam ter deixado de nomear o suspeito de Los Alamos porque ele está morto e "não pode defender o nome de sua família nem refutar nossos argumentos". A identidade real não importa, acrescenta o livro. "Suas impressões digitais são o que contam."
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