Foi em maio de 1985 que o general Igor Rodionov desembarcou de uma aeronave militar de transporte no aeroporto de Cabul, assumindo o comando do 40º Exército da União Soviética, que combatia no Afeganistão.
A face dele, agora enrugada, conta melhor do que as palavras a história que se seguiu. Ele foi o quinto de um total de sete comandantes soviéticos, compartilhando um lugar na história com um grupo de indivíduos que desempenharam uma tarefa similar: generais estrangeiros enviados para conquistar o Afeganistão. Os integrantes desse grupo, que teve início com Alexandre, o Grande e continua até os dias de hoje, são notáveis por uma característica evidente – todos acabaram fracassando.
Um conselho não muito otimista que ele gostaria de fornecer àqueles que estão seguindo as suas pegadas no Afeganistão: “Tudo já foi tentado“.
Às vésperas de uma aguardada decisão por parte do governo dos Estados Unidos de enviar mais milhares de soldados para lutarem contra o Taleban, o general Rodionov e outros veteranos soviéticos sentem uma mistura de Schadenfreude e simpatia pelos mais recentes invasores estrangeiros das terras montanhosas das quais eles se retiraram em 1989, após uma sangrenta luta de contra-insurgência que durou dez anos.
Na sua base no suntuoso Palácio Tajbeg, em uma colina elevada nos arredores de Cabul, o general Rodionov descobriu algo rapidamente: “Não havia um front. As balas podiam vir de qualquer lugar“.
O 40º Exército soviético era composto de 120 mil soldados no auge da guerra, e as operações focavam-se no envio de soldados transportados por helicópteros para as montanhas, no controle dos terrenos elevados e, depois, na movimentação de tanques pelos vales.
Em um período de uma década quase 15 mil soldados soviéticos – e centenas de milhares de afegãos – foram mortos em vários dos mesmos lugares que as forças dos Estados Unidos e dos seus aliados lutam atualmente para controlar: as regiões fronteiriças no sudeste do país, perto do Paquistão, e as províncias de Kandahar e Helmand, no sul.
“A guerra, no decorrer dos dez anos, transcorreu em círculos. Nós chegávamos, e eles (os insurgentes) partiam. Depois, nós partíamos, e eles retornavam“, conta o general Rodionov.
Outros ex-oficiais militares soviéticos enxergam uma futilidade similar nos esforços dos Estados Unidos no Afeganistão.
“Mais soldados simplesmente significará mais mortes“, adverte Gennady Zaitsev, ex-comandante da tropa de elite Alfa, da KGB, que participou da maioria das operações mais críticas da guerra.
“Os cidadãos norte-americanos e britânicos perguntarão, com muita razão, ‘Por que os nossos filhos estão morrendo?’, e a resposta será, ‘Para manter o presidente afegão, Hamid Karzai, no poder’. Eu não creio que eles ficarão satisfeitos com isso“.
Para o general Rodionov, as notícias que chegam do atual conflito são perturbadoramente familiares. “Os Estados Unidos e os seus aliados precisam entender que não existe nenhuma forma de se alcançar o sucesso militarmente. A única solução é política. E Karzai não goza de popularidade junto ao povo, ele simplesmente administra uma máfia“.
As relações entre o povo afegão e os soviéticos determinaram o resultado da guerra, acredita o general Rodionov. “Aquilo era um problema social e político, que nós deixamos grosseiramente de perceber com a nossa mentalidade militar“, diz ele.
Assim como as forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), os soviéticos tiveram uma lua de mel que durou um ou dois anos após a invasão do Afeganistão, em 1979. Projetos de infraestrutura foram implementados – os prédios altos de Cabul foram em sua maioria construídos pelos soviéticos. Mas o general Rodionov recorda-se que por volta de 1982 a situação piorou drasticamente.
“É claro que o problema era o mesmo – o 40º Exército era uma força militar altamente armada e treinada. Respondíamos a cada tiro disparado contra nós com dez tiros de volta. Os nossos soldados provocaram muitas baixas entre a população civil“.
“Nós bombardeávamos uma aldeia porque havia um ou dois mujahadeens no local. Mulheres e crianças morriam, e isso criou o movimento insurgente. Foi uma clássica guerra de guerrilha“.
Os veteranos russos do Afeganistão dizem que os Estados Unidos estão correndo o risco de vencerem militarmente, mas perderem politicamente, ecoando a própria experiência soviética.
Pyotr Suslov, um ex-membro da unidade de operações especiais da KGB no Afeganistão, diz que o principal erro da Otan é não prestar a atenção necessária no equilíbrio entre as tribos afegãs, especialmente as de etnia pashtun, que compõem pouco menos da metade da população.
Em vez disso, os Estados Unidos concentraram a sua atenção inicial na Aliança do Norte, o movimento guerrilheiro liderado por indivíduos de etnia tajique, que enxotaram o Taleban do poder em 2001 com o auxílio dos Estados Unidos.
“Eles ignoraram os pashtuns“, explica Suslov. “A Aliança do Norte assumiu o poder após a queda do Taleban, e havia um punhado de comandantes diferentes, de diferentes tribos e etnias. Os pashtuns foram ignorados. Foi daí que veio o problema. É importante que os Estados Unidos concordem com as tribos pashtuns“.
O general Rodionov conta que chegou Afeganistão como um crítico duro da guerra, e as suas críticas só aumentaram durante o período em que foi comandante naquele país.
Naquela época, as autoridades graduadas soviéticas, percebendo a futilidade dos seus métodos, começaram a discutir abertamente a retirada. “No início era um círculo bem pequeno de autoridades, mas que foi crescendo gradativamente. O pensamento predominante na época da retirada era: ‘Nós deveríamos ter feito isso antes’“.
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A opinião pública dos USA começará a contar os mortos dia-a-dia, os familiares dos falecidos soldados, e principalmente os parentes dos feridos, começarão a dar entrevistas nos meios de comunicação, e isso gerará mal contento.
Os velhos métodos utilizados para o controle da informação, que foram muito utilizados na administração Bush filho, a um certo ponto, aos olhos da população, não funciona mais.
Homens assim determinados como estes, que sacrificam de forma voluntária a própria vida, não são derrotados sem uma guerra de destruição em massa.
O Ocidente tem muito o que aprender com os povos do Oriente Médio e da Ásia Central.