O Boeing 737, o avião comercial a jato mais vendido da história, foi certificado pela FAA em 21 de dezembro de 1967 e permanece em produção até hoje, 42 anos depois de entrar em serviço pela Lufthansa, cliente lançador do modelo.
O 737 foi uma aeronave bastante inovadora na época em que foi lançada. Tinha uma fuselagem de seção igual à dos modelos 707, 720 e 727, e seis fileiras de poltronas. Podia ser operado por apenas dois pilotos, eliminando a função do engenheiro de voo, e tinha capacidade de carregar confortavelmente 108 passageiros (modelo 737-200). Em suma, era (e ainda é) uma aeronave bastante atraente para o mercado e para os usuários de transporte aéreo, oferecendo desempenho e conforto de uma jato internacional nas linhas domésticas.
O Boeing 737 chamou a atenção de vários operadores pelo mundo afora, inclusive da brasileira VASP, então uma empresa estatal pertencente ao Governo do Estado de São Paulo. À época, o Governo Federal, controlado pelos militares, intervia pesadamente na administração das empresas aéreas brasileiras. O antigo DAC - Departamento de Aviação Civil tinha um representante na diretoria de cada empresa aérea, com poder de veto. A aquisição do Boeing 737 pela VASP foi vetada, uma vez que, segundo a política vigente no DAC, somente a VARIG tinha o privilégio de adquirir jatos da Boeing. A VASP, sem outra alternativa, resolveu adquirir dois aviões BAC 1-11, jatos britânicos de menor capacidade e desempenho, mas não desistiu dos 737.
O Boeing 737 não chamou inicialmente a atenção da Varig, que resolveu adquirir, para as linhas domésticas, os modelos 727-100. Devido a esse desinteresse, e depois de muita negociação política, a VASP obteve finalmente sinal verde para trazer os 737-200 ao Brasil.
Os quatro primeiros aviões da encomenda da VASP foram apresentados ao público paulistano no feriado de 21 de abril de 1969, em ruidosos e espetaculares voos rasantes, em formação, sobre o Aeroporto de Congonhas, principal base operacional da empresa. Eram do modelo B737-2A1, matriculados PP-SMA, PP-SMB, PP-SMC e PP-SMD. Representaram um salto tecnológico considerável sobre os jatos domésticos então em operação no Brasil, como os BAC 1-11 e Sud Aviation Caravelle, esses então operados pela Cruzeiro do Sul.
Os 737 da VASP inauguraram uma nova era na aviação comercial brasileira. Os antigos aviões de motor a pistão e grande parte dos turbo-hélice em uso foram rapidamente retirados de serviço, e os 737-200 rapidamente se revelaram um grande sucesso. A VARIG logo sentiu a necessidade de encomendar aviões do mesmo tipo, mas que começaram a ser entregues apenas em 1974.
O PP-SMA, número de série do fabricante 20092, o 161º Boeing 737 a ser fabricado, assim como sete outros 737 comprados pela VASP, era do modelo 737-200 inicial, sem os refinamentos introduzidos na série B737-200 Advanced no início da década de 1970, como pylons redesenhados, sistema de auto-brake e anti-skid.
O PP-SMA foi um dos jatos mais intensamente usados na aviação comercial brasileira, e deteve, até ser desativado, o recorde de aeronave que por mais tempo voou no mundo em uma única empresa aérea, mais de 35 anos de serviço contínuo, sendo posteriormente ultrapassado nessa marca pelo 727-100 CP-861, do Loyd Aéreo Boliviano. Foi presença constante em todos os aeroportos em que a VASP operava no Brasil. Os mecânicos da empresa tinham um carinho especial por essa aeronave, que nunca sofreu acidentes ou incidentes graves durante toda a sua longa carreira.
Dos quatro Boeing 737 iniciais da VASP, o PP-SMB operava como cargueiro puro, e o PP-SMD foi vendido em 1974. Os PP-SMA e PP-SMC sempre operaram linhas de passageiros durante toda a sua carreira na VASP.
Devido às dezenas de milhares de ciclos voados, os 737 iniciais da VASP receberam muitos reforços estruturais na fuselagem, que foram acrescentando peso e reduzindo o desempenho e rentabilidade dos aviões, ainda mais levando-se em consideração que esse modelos iniciais eram equipados com motores Pratt & Whitney JT-8D-9, menos potente que os usados nos Advanced.
Apesar disso, o valente PP-SMA esteve em serviço de modo praticamente contínuo nas linhas da VASP. Nos últimos anos de operação, foi equipado com confortáveis poltronas de couro legítimo. Embora fosse muito antigo, era bem mais confortável que os Boeing 737NG atualmente operados na aviação comercial brasileira, com pitch entre poltronas mais generoso. Só perdia em conforto para seus irmãos mais novos em termos de ruído interno, especialmente nas poltronas situadas na parte traseira da aeronave.
Em setembro de 2004, o Departamento de Aviação Civil determinou a suspensão dos voos de oito aeronaves da VASP, os PP-SMA, PP-SMB, PP-SMC, PP-SMP, PP-SMQ, PP-SMR, PP-SMS e PP-SMT, por motivos de segurança, até que a empresa cumprisse todas a AD (Airworthiness Directives - Diretrizes de Aeronavegabilidade) estabelecidas pelo fabricante. Já em situação muito difícil, a VASP não tinha condições de gastar tanto dinheiro em aeronaves com vida útil praticamente esgotada, e resolveu canibalizar as células desse aviões para manter os 737 Advanced voando.
O PP-SMA foi rebocado para uma área remota do Aeroporto de Confins, e teve sua pintura, motores, assentos e peças removidos. Na fuselagem oca, restam pintados apenas uma bandeira do Brasil e a matrícula PP-SMA.
A VASP finalmente deixou de voar em janeiro de 2005, quando o DAC cassou sua autorização de operação. Posteriormente, em setembro de 2008, sua falência foi decretada e sua frota de aeronaves encontra-se abandonada em vários aeroportos pelo Brasil afora.
Em junho de 2009, a massa falida da VASP realizou um leilão de bens da empresa, e o PP-SMA foi oferecido à venda no lote 20, como sucata, não obtendo, no entanto, nenhum lance.
Nas condições em que se encontra atualmente, não existe nenhuma chance da aeronave voar novamente, ainda que seja reequipada com motores e outros componentes necessários. O PP-SMA foi aposentado com mais de 89 mil horas de voo, e não foi o mais voado na empresa, pois o PP-SMS voou bem mais do isso. Seu destino mais provável é ser desmanchado como sucata, pois está longe dos museus que poderiam preservá-lo. O Museu da TAM já manifestou interesse e negocia a compra de um Boeing 737-200 da VASP para preservar no seu museu em São Carlos, nas cores originais com que esses aviões vieram ao Brasil, mas optou por uma das células abandonadas atualmente em Congonhas.
Enquanto não decidem seu destino, o PP-SMA, o primeiro dos muitos Boeing 737 operados no Brasil, jaz silencionsamente cercado pelo mato no Aeroporto de Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte. Mas, apesar de tudo, seu lugar está garantido na história da aviação brasileira para sempre.
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