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Uma escalada perigosa


A ameaça de Pequim impor sanções a empresas norte-americanas envolvidas na venda de armas a Taiwan, anunciada a semana passada pelo Pentágono, agravou as tensões entre a China e os Estados Unidos e qualquer erro de cálculo poderá ter consequências...

A ameaça de Pequim impor sanções a empresas norte-americanas envolvidas na venda de armas a Taiwan, anunciada a semana passada pelo Pentágono, agravou as tensões entre a China e os Estados Unidos e qualquer erro de cálculo poderá ter consequências muito graves.

A venda de armamento enquadra-se no "Taiwan Relations Act", que desde 1979 define o quadro das relações entre Washington e Taipé, restringe-se a material de "carácter defensivo", e foi considerada por Pequim como uma "interferência nos assuntos internos da China".

Os equipamentos, no montante de 6,4 mil milhões de dólares, incluem designadamente sistemas anti-míssil Patriot, mísseis anti-navio Harpoon e helicópteros Blackhawk.

Caças F16 e oito submarinos solicitados por Taiwan ficam fora da presente proposta de vendas que dá seguimento a uma solicitação de Taipé, no valor à época de 11 mil milhões de dólares, aprovada em Outubro de 2001 pela administração Bush e que já teve concretização parcial em 2008 com fornecimentos orçados em 6,5 mil milhões.

Forçar a mão
Desta feita, porém, os protestos de Pequim não se limitam ao congelamento de contactos e conversações militares, retomados o ano passado depois das críticas as vendas de armas de Bush, e incluem possíveis sanções contra empresas como Sikorsky, Rayethon, Lockheed Marti , e, sobretudo, a Boeing a contar aumentar a sua presença no mercado chinês que representa actualmente 4% das suas vendas.

O diferendo vem no seguimento de uma série de maus passos recentes nas relações entre a China e os Estados Unidos que tiverem os seus pontos mais baixos no impasse das negociações sobre mudanças climáticas em Copenhaga, cibersegurança e censura à Google, além das polémicas sobre alegada manipulação do yuan e adopção de sanções contra o Irão, a que se soma, ainda, a prevista audiência este mês de Barack Obama ao Dalai Lama.

Apesar das relações entre Pequim e Taipé atravessarem uma fase de desanuviamento depois da eleição do presidente Ma Ying Jeou, em Março do ano passado, ter posto cobro a veleidades independentistas, a necessidade de Taiwan reforçar a sua capacidade de dissuasão face a uma possível, ainda que improvável, tentativa de invasão da ilha suscita inevitavelmente dificuldades nos contactos com o continente.

Os Estados Unidos vêm-se envolvidos na questão devido ao seu compromisso de sustentarem a capacidade defensiva de Taiwan e à política de "ambiguidade estratégica" sobre eventual intervenção em caso de ataque militar à ilha que desde 1949 escapa ao controlo do regime comunista, consolidando uma independência de facto que inviabiliza modelos de reunificação à imagem dos estatutos especiais atribuídos por 50 anos a Hong Kong, em 1997, e a Macau, em 1999.

Um problema de avaliação
O grave na recrudescente polémica entre Washington e Pequim centra-se, sobretudo, no risco de imperativos de política interna conduzirem a uma escalada capaz de deteriorar seriamente as relações bilaterais.

A liderança chinesa prepara para 2012 a promoção de uma nova geração de dirigentes e enfrenta desafios de fundo para reconverter um modelo económico assente no mercado exportador e de insustentáveis custos ambientais não podendo dar sinais de debilidade política em questões tidas como matéria sagrada de soberania nacional, caso da reunificação de Taiwan ou ameaças separatistas no Tibete e Xinjiang.

Os Estados Unidos entraram, por sua vez, no ciclo para as eleições do Congresso em Novembro e o défice comercial com a China, diferendos sobre direitos de propriedade intelectual e as taxas de câmbio do yuan apresentam terreno fértil para a adopção de medidas retaliatóras proteccionistas contra o seu principal credor (22% das obrigações do Tesouro norte-americano são detidas por Pequim) e segundo maior parceiro comercial a seguir ao Canadá.

Nem Washington conseguirá duplicar as suas exportações nos próximos cinco anos, como pretende Obama, se as empresas norte-americanas encontrarem dificuldades acrescidas de acesso ao mercado chinês, nem a China está em condições de prescindir de investimentos e tecnologias de origem norte-americana ou arriscar o valor do seus 789,6 mil milhões de dólares em títulos do tesouro dos Estados Unidos.

Os constrangimentos da relação bilateral mais importante do início do século XXI, com implicações para a maior parte das grandes questões internacionais, desde o Irão à contenção dos efeitos negativos das mudanças climáticas, impedem rupturas ou reviravoltas diplomática bruscas.

Uma avaliação errónea das intenções, forças e fraquezas, do parceiro/adversário, patentes nas dificuldades da China em considerar os efeitos globais de algumas decisões que toma numa altura em que aumentam o seu peso e responsabilidades globais, e nas hesitações dos Estados Unidos ao lidarem com uma potência emergente com prioridades mal entendidas em Washington, é o maior risco para uma escalada de gestão difícil num conflito de fundo.

A conjuntura leva Pequim a forçar a mão e a aumentar a parada face a uma administração democrática tida por susceptível de ceder a pressões, subestimando a dispersão de poderes e interesses que condicionam a política norte-americana, mas acarreta o risco de provocar retaliações igualmente desproporcionadas e contraproducentes por parte de Washington.