A presidente Dilma Rousseff vai convocar o ministro da Defesa, Nelson Jobim, nos próximos dias, para uma reunião na qual serão discutidas, entre outras coisas, a compra de 36 novos caças para a força aérea Brasileira (FAB) e de 11 navios de superfície para a Marinha. Dilma adiou a compra dos caças, mas é improvável que a licitação seja retomada do zero. A negociação dos barcos ainda se acha em fase de consulta, mas também pode esperar por um momento mais adequado da economia.

Dilma está preocupada com a questão fiscal. Só os projetos da FAB e da Marinha, somados, envolvem alguma coisa em torno dos R$ 20 bilhões. E os caças da força aérea significam apenas um primeiro lote do que poderá vir a ser uma encomenda de mais de 100 caças, no longo prazo. Dilma e Jobim conversaram ontem. Muito embora a compra dos caças não signifique desembolso imediato, nem uma despesa orçamentária, o ministro entendeu o recado da presidente.

Segundo disse Jobim, mais tarde, a interlocutores, há pelo menos três boas razões para justificar o adiamento: o Orçamento Geral da União (OGU) ainda não foi sancionado, o volume do corte também não está acertado e, em terceiro, mas não menos importante, segundo faz questão de afirmar, o governo no momento é obrigado a fazer despesas extraordinárias de caráter inquestionavelmente prioritário, como no caso do combate às enchentes no Rio de Janeiro.

Decreto regula forças Armadas na defesa civil

Há muito ruído, em Brasília, sobre a compra de material militar. Há casos, talvez a maioria, de puro lobby. Mas no caso do Ministério da Defesa existe também o interesse do PMDB. Para boa parte dos dirigentes do partido seria muito mais interessante controlar um outro ministério com mais apelo político do que a Defesa, cujo maior atrativo é a Infraero, estatal cobiçada, mas que em breve deve mudar de endereço. Enjeitado por seu partido, Jobim, em contrapartida, sensibilizou o PT, ao convidar o deputado José Genoino para ser o principal assessor civil do ministério.

Dilma Rousseff e Nelson Jobim estão hoje juntos no Morro do Alemão, onde deve ser inaugurada uma agência do Banco do Brasil, entre outras atividades. É perceptível que o ministro ainda não acertou seu relógio com o de Dilma. Os dois ainda não chegaram a um modelo confortável de convivência. A mudança de presidentes ajuda a explicar as dificuldades - o jeito Dilma de governar difere muito do estilo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao qual o ministro (e os outros que permaneceram no cargo) já havia se habituado.

Lula não era afeito a despachos de rotina com os ministros; já com Dilma, ficará bem na fita aquele que a mantiver permanentemente informada com relatórios semanais, por exemplo, sobre os assuntos relacionados a sua área. Mas há também peculiaridades da Defesa, uma Pasta que transcende governos.

Os projetos para reequipar as forças Armadas, em sua grande maioria, são de longo prazo, coisa de 15, 20 ou 30 anos. Por outro lado, o país atravessa uma situação fiscal que a Defesa não deve ignorar. O que o ministro deve acertar com a presidente é um cronograma adequado ao orçamento disponível.

A compra dos caças, um negócio estimado em R$ 10 bilhões, as 36 primeiras de mais de uma centena de unidades, terá financiamento externo de longo prazo. Os efeitos financeiros não se darão no exercício de 2011, eventualmente a partir de 2012. Por outro lado, mesmo que não se trate de dinheiro orçamentário, é contabilizado como encargo financeiro e tem impacto no cálculo do superávit nominal.

A esquadrilha da FAB chegou a seu limite - a vida útil da maior parte dos caças esgota-se em 2015. O processo de compra dos novos aviões se arrasta desde o primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso. A reabertura do processo de licitação implicaria novo atraso.

Nesse aspecto, o melhor para a FAB seria a manutenção do atual processo licitatório. São três os supersônicos pré-selecionados: o francês Rafale, o sueco Gripen e o americano F-18, o Super Hornet. O ex-presidente Lula tinha preferência política pelo Rafale, dentro de uma parceria estratégica com a França. Em troca, Lula esperava ter o apoio da França à reivindicação do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Além disso, o Ministério da Defesa considerou a escolha como a mais adequada aos parâmetros da Estratégia de Defesa Nacional: das três opções, a da fábrica francesa Dassault seria a que mais ofereceu em termos de transferência de tecnologia.

Vale registro o tratamento que a presidente Dilma tem dado aos assuntos de natureza militar ou relacionados à caserna. Ela chamou para si a questão da compra dos armamentos, ao que tudo indica, pelas questões orçamentárias e econômicas envolvidas na compra, mas tirou de dentro do Palácio do Planalto outras questões relacionadas às forças Armadas, como aquelas relativas aos direitos humanos.

Este é o caso da decisão de transferir o Arquivo Nacional da órbita da Casa Civil para o Ministério da Justiça. O órgão é responsável pela manutenção dos documentos históricos do país, como os registros da época do regime militar. A discussão sobre os desaparecidos políticos está sob a responsabilidade da Defesa, enquanto a aprovação do Plano Nacional de Direitos Humanos, o PNDH 3, com a criação da Comissão da Verdade, será negociada no Congresso.

Antes da viagem de hoje ao Rio, Jobim acertou com a presidente da República a modelagem da participação das forças armadas quando for empregada na defesa civil, como atualmente acontece no Rio. Dilma deve baixar um decreto que prevê dois tipos de intervenção, evidentemente a pedido do governo estadual. A primeira é a de apoio. Neste caso, o comando fica com as autoridades civis da área. Pela segunda forma, os militares, chamados, assumem o comando e o controle da situação. Jobim procura tranquilizar os críticos da intervenção das forças Armadas em assuntos civis com o argumento de que o decreto vai ser específico sobre os casos em que elas poderão ser chamadas. "O que nós não podemos é banalizar isso", costuma defender o ministro da Defesa.

Fonte: Valor Econômico - Via NOTIMP/FAB