O acidente do Boeing 747-SP da China Airlines, que cumpria o voo 006,
entre Taipei e Los Angeles, em 19 de fevereiro de 1985, foi um exemplo
dramático de como a fadiga e o excesso de trabalho podem fazer com que
tripulantes experientes e bem treinados cometam erros terríveis, a ponto
de provocar um desastre.
Felizmente, o desastre total foi evitado no caso do voo 006. A
tripulação conseguiu, afinal, recuperar o controle da aeronave e pousar
em segurança, com alguns feridos a bordo e danos pesados no avião.
O voo Dynasty 006 (Dynasty é o indicativo de chamada de
rádio da China Airlines) começou às 16:22 de 19 de fevereiro de 1985,
hora local, no Aeroporto de Taipei, em Taiwan. Era um voo regular
diário, non stop, e tinha como destino Los Angeles, na costa
oeste dos Estados Unidos. 251 passageiros embarcaram no avião, um Boeing
747-SP-9, matriculado N4522V.
O voo transcorreu normalmente, sem incidentes, por quase dez horas, e
voava no FL 410 (41 mil pés), quando encontrou turbulência de ar claro.
Uma espessa camada de nuvens se estendia abaixo do avião, com topos a 37
mil pés. A tripulação tomou as precauções normais nessas situações,
orientando todos os passageiros e tripulantes a usar os cintos de
segurança. Estava, então, a oeste da posição Redoo, 300 NM a noroeste de
San Francisco, na Califórnia, na qual esperava chegar às 10:13UTC.
O comando do voo estava a cargo do experiente piloto Min-Ho Yuan, que
era assessorado pelo Primeiro-Oficial Ju Yu Chang, pelo Engenheiro de
Voo Kuo Win Pei, pelo segundo Comandante Chien-Yuan Liao e pelo segundo
Engenheiro Shih Lung Suwere, que se revezavam nas suas respectivas
funções.
O comandante Yuan tentava, até há pouco, dormir no compartimento de
repouso da tripulação (o "sarcófago"), enquanto Pei e Chang pilotavam o
avião. Por fim, Yuan desistiu, e foi até o cockpit assumir as suas
funções. Embora o avião ofereça um relativo conforto para o descanso dos
tripulantes, não é fácil dormir durante o voo, especialmente quando se
tem a responsabilidade do comando do mesmo.
Comandante do Dynasty 006, Min-Ho Yuan, na investigação do acidente |
Os problemas começaram quando a tripulação percebeu o motor nº 4 perder empuxo e entrar em flame-out (literalmente, apagou). Nesse momento, o piloto automático do avião estava acoplado, no modo PMS (Performance Management System).
O avião voava a Mach .84, 254 knots indicados. Depois do avião acelerar
para Mach .88, o PMS reduziu o empuxo dos motores para EPR (Razão de
Pressão do Motor) 1.00, recuando as manetes para reduzir a velocidade
para o valor selecionado, e avançando em seguida para manter tal
velocidade. Nesse momento, todos os motores aceleraram, menos o nº 4, o
motor externo da asa direita.
O Engenheiro de Voo percebeu imediatamente o apagamento do motor 4 e anunciou isso para os demais tripulantes. Nenhum deles ficou realmente surpreso com o fato. O motor 4 já tinha dado problemas em dois voos anteriores, nos FL 410 e 430, tendendo a apagar em grande altitude.
Para uma aeronave de 4 motores, como o Boeing 747, perder um motor não é
um evento tão grave. A aeronave foi projetada para voar com 3 motores, e
o desempenho, embora se deteriore, de forma alguma impede a aeronave de
voar.
A primeira atitude do Comandante Yuan foi ordenar ao Engenheiro de Voo reiniar o motor 4. O avião continuou a voar no FL 410 com o piloto automático acoplado. Isso contrariava o procedimento padrão nesses casos.
A decisão do comandante de mandar reiniciar o motor em pane e manter o avião no piloto automático criou várias situações problemáticas. Em primeiro lugar, não se deve dar a partida em um motor em uma altitude tão grande. Os manuais do Boeing 747 orientam que qualquer tentativa de reiniciar um motor em voo deve ser feita abaixo de 30 mil pés. Outro problema, bem mais grave, é que um motor parado implica em tração assimétrica, que tende a guinar o avião para o lado do motor em pane, no caso, à direita. Tal tendência deve ser compensada pelo piloto manualmente, pela aplicação do pedal do leme no sentido oposto, e depois pelo acionamento do compensador do leme, para estabilizar o avião na proa desejada.
O Comandante Yuan, no entanto, não aplicou o leme, confiando no piloto automático para manter a proa selecionada no sistema. Isso foi um erro terrível, pois o comandante se esqueceu que o piloto automático do Boeing 747 não atua nem no leme de direção e nem no compensador do leme. Para manter a proa selecionada no sistema, o piloto automático do 747 atua somente nos ailerons e nos spoilers diferenciais.
O avião começou a perder velocidade e guinar para a direita. O piloto automático aplicou o comando dos ailerons e dos spoilers diferenciais para a esquerda, para tentar manter a proa selecionada, até que os comandos chegaram ao batente, a 23 graus. Sem atuação dos pilotos nos pedais do leme, o avião continuou a guinar e rolar a 60 graus para o lado direito, perdendo altitude até entrar na pesada camada de nuvens logo abaixo.
O Comandante, enfim, desacopla o piloto automático do 747. A situação, que já estava ruim, piora subitamente. O Comandante tenta estabilizar o avião com os ailerons e profundores, e mantém, inexplicavelmente, os pés fora dos pedais. Ao observar o ADI (Attitude Direct Indicator - Indicador de Atitude, também conhecido como Horizonte Artificial), vê uma situação tão implausível que reporta imediatamente: "perdemos a ADI!"
O Primeiro Oficial reporta que a ADI reserva também está fora dos
limites. Os dois pilotos, no entanto, estão errados: os instrumentos
estão corretos, e o avião é que está fora dos limites para o qual foi
projetado. Está em uma atitude absurdamente anormal, mergulhando em voo
invertido, de "cabeça para baixo".
O Engenheiro de Voo reporta, então, falha em todos os quatro motores. Na verdade, ele mesmo, sem perceber, havia recuado as manetes para trás, quando o Comandante perdeu o controle e o avião entrou em atitude anormal. Com exceção do motor 4, todos os motores operavam normalmente.
Na tentativa de recobrar os controles, o Comandante submeteu o Boeing 747 e seus ocupantes a esforços estruturais jamais imaginados pelos projetistas. Ignorando os ADI e sem poder visualizar o horizonte natural da Terra, o Comandante aplicava os comandos de modo aleatório, totalmente desorientado, submetendo o avião e seus ocupantes a esforços que chegaram a 5 G, cinco vezes a força da gravidade. A essa altura, os passageiros já se julgavam condenados a morrer. Muitos ouviram os rebites da estrutura saltar, um após outro, e o ruído parecia ser o de uma arma de fogo disparando.
O 747, de nariz embaixo, mergulhou na camada, em certo momento, mais de
10 mil pés em 20 segundos, em uma inacreditável razão de descida de
30.000 pés por minuto.
Subitamente, no entanto, o avião saiu da camada, a 11 mil pés de altitude. Os pilotos viram o Oceano Pacífico se aproximar rapidamente, mas agora tinham uma referência visual. O comandante puxa o manche e avista o horizonte. Ao alinhar o nariz do avião, ordena ao Engenheiro reiniciar os motores. O Engenheiro liga os ignitores dos quatro motores e empurra as manetes à frente. Os motores 1, 2 e 3 respondem de imediato, e logo o motor 4 também responde. Subitamente, o avião parece voar normalmente, de novo, O controle do 747 foi retomado a 9.600 pés, e o avião tinha mergulhado 30 mil pés em dois minutos e meio, desde o FL 410.
O Comandante, pelo interfone, pede aos comissários uma avaliação da situação na cabine de passageiros. Há vários feridos, pelo menos dois com gravidade. Os controladores de voo do ARTCC (Air Traffic Route Control Center) Oakland, responsável por todos os voos que se aproximavam naquele setor da costa oeste dos Estados Unidos, conseguem finalmente se comunicar com o avião. O ARTCC Oakland já tinha liberado o voo para o FL 240, e depois tentaram por seis vezes se comunicar com o Dynasty 006, sem sucesso.
O Comandante Yuan, ao responder ao controle de tráfego aéreo, declarou estar subindo e ter intenção de prosseguir para o seu destino, Los Angeles. Não informou sobre a pane do motor 4, declarou "não ter percebido" as tentativas de comunicação para o seu voo e não declarou emergência. Oakland liberou o voo Dynasty 006 para o FL 200 e depois para o FL 350 em direção a Los Angeles, até que o Engenheiro de Voo, ao checar seus intrumentos, verificou que o sistema hidraulico nº 1 estava sem pressão, e que as luzes indicativas dos trens de pouso da fuselagem estavam baixados e travados. Não podiam ser recolhidos, por falta de pressão hidráulica no sistema 1.
O Comandante Yuan não demorou a perceber que, com o arrasto adicional dos trens de pouso baixados, o avião não teria combustível para alcançar Los Angeles, e finalmente declarou emergência. Oakland liberou uma aproximação direta para o Aeroporto Internacional de São Francisco, e afastou todas as demais aeronaves do caminho. A aproximação foi feita no piloto automático, que funcionou corretamente, até 2500 pés. A aproximação final e o pouso foram feitas manualmente, suavemente e com sucesso. Após livrar a pista, a tripulação deteve o avião danificado e cortou os motores. A aeronave foi rebocada para uma posição de estacionamento para o desembarque e o atendimento aos feridos.
Entre os 251 passageiros e 23 tripulantes a bordo, 24 se feriram, dois com alguma gravidade, um passageiro e um tripulante. Ninguém morreu.
O NTSB - National Transporte Safety Board investigou o acidente, por ter acontecido sobre o espaço aéreo americano e por envolver uma aeronave matriculada nos Estados Unidos, a despeito de operar para uma empresa aérea de Taiwan. O NTSB não teve grande dificuldade para elaborar o relatório, já que a aeronave e seus ocupantes sobreviveram.
O relatório concluiu que o aviao tinha somente uma pequena falha em uma válvula no motor 4, que restringiu a passagem de combustível e levou ao apagamento do motor em grande altitude. Era uma falha que não deveria conduzir a aeronave a um acidente. Tudo o que aconteceu a seguir foi falha dos pilotos: o Comandante deveria ter desacoplado o piloto automático e aplicado o leme, descer para abaixo de 30 mil pés e aí tentar reacender o motor 4. Isso não foi feito. O engenheiro errou também, ao tentar reacender o motor 4 em grande altitude e com uma bleed valve aberta (a bleed valve é uma válvula de sangria, que sangra ar comprimido do compressor do motor para alimentar o sistema pneumático da aeronave), contrariando o preconizado no manual.
O Comandante Yuan se esqueceu que o sistema de piloto automático do
Boeing 747 não opera o leme de direção e tampouco o seu compensador. O
piloto deve operar os pedais, para corrigir a assimetria de tração e a
guinada resultantes de um motor em pane, e isso não foi feito.
Por fim, por pouco o avião não foi foi perdido devido à desorientação espacial dos seus pilotos. Os instrumentos de voo funcionavam corretamente, mas foram ignorados, pois suas indicações foram julgadas como implausíveis pelos tripulantes. O voo somente foi salvo quando o comandante avistou o oceano e o horizonte da Terra, fornecendo referências visuais.
Como tripulantes tão experientes puderam cometer erros tão graves? Eles foram bem treinados e conheciam muito bem o avião. O NTSB conseguiu responder à essa pergunta: fadiga.
O comandante Yuan estava com boa saúde, mas tinha cumprido exaustivas jornadas de trabalha na semana que anteceu o acidente. Tinha passado 5 dias em Jeddah, na Arábia Saudita, até 14 de fevereiro, e feito um voo de ida e volta ao Japão na jornada anterior. Reconheceu ter dificuldades de dormir mais que duas horas em um voo de longa duração. A fadiga disso resultante foi, sem dúvida, decisiva no seu processo de tomar tantas decisões erradas, que quase conduziram a um desastre de gigantescas proporções. Felizmente, ele fez o que todo piloto foi treinado para fazer: salvou o avião e seus ocupantes, a despeito dos erros cometidos antes.
O Boeing 747SP envolvido no acidente ficou gravemente danificado. Os
estabilizadores e profundores ficaram despedaçados, perdendo boa parte
das superfícies. Um dos atuadores do profundor quebrou, provocando o
vazamento de fluido hidráulico que despressurizou o sistema 1. Todavia,
mantiveram sua operacionalidade, permitindo o controle do avião com
pouca dificuldade. A APU se soltou do seus seus encaixes e ficou apoiada
nas portas de acesso. As asas entortaram duas ou três polegadas para
cima, nas pontas. Os ailerons foram danificados. As portas do trem de
pouso da fuselagem foram arrancadas quando os trens desceram e pela ação
do vento relativo. No interior, os danos ficaram restritos a alguns
bins e a duas poltronas, 36D e 36E.
O Boeing 747-SP demonstrou uma quase inacreditável resistência a esforços, para os quais jamais foi projetado. Aviões comerciais são projetados para suportarem 2,5 G positivos e 1 G negativo, e o N4522V suportou o dobro disso, talvez mais, e sobreviveu. Ainda pode ser reparado e voou por quase 18 anos depois do acidente.
O avião foi reparado. Em 25 de abril, foi liberado para o voo e voltou a
Taiwan e ao serviço ativo. As asas entortaram para sempre, mas os danos
estavam dentro dos limites de tolerância. O N4522V continuou a voar
pela China Airlines por mais quase 12 anos, quando foi arrendado para a
Mandarin Airlines, em 1º janeiro de 1997, onde voou por um ano, até ser
desativado e armazenado no Aeroporto Internacional McCarram, em Las
Vegas, onde ficou até 2002. Comprado por uma instituição religiosa, a
Gospel to the Unreached Millions (GUM), voou eventualmente até 2005,
quando o avião teve seu certificado de aeronavegabilidade suspenso pelo
FAA, por motivo de manutenção. Nunca mais voltou a voar, e atualmente se
encontra parado no Aeroporto de Tijuana, no México, em mal estado e sem
condições de voo.
O Engenheiro de Voo percebeu imediatamente o apagamento do motor 4 e anunciou isso para os demais tripulantes. Nenhum deles ficou realmente surpreso com o fato. O motor 4 já tinha dado problemas em dois voos anteriores, nos FL 410 e 430, tendendo a apagar em grande altitude.
O Boeing 747-SP-9 N4522V, da China Airlines |
A primeira atitude do Comandante Yuan foi ordenar ao Engenheiro de Voo reiniar o motor 4. O avião continuou a voar no FL 410 com o piloto automático acoplado. Isso contrariava o procedimento padrão nesses casos.
A decisão do comandante de mandar reiniciar o motor em pane e manter o avião no piloto automático criou várias situações problemáticas. Em primeiro lugar, não se deve dar a partida em um motor em uma altitude tão grande. Os manuais do Boeing 747 orientam que qualquer tentativa de reiniciar um motor em voo deve ser feita abaixo de 30 mil pés. Outro problema, bem mais grave, é que um motor parado implica em tração assimétrica, que tende a guinar o avião para o lado do motor em pane, no caso, à direita. Tal tendência deve ser compensada pelo piloto manualmente, pela aplicação do pedal do leme no sentido oposto, e depois pelo acionamento do compensador do leme, para estabilizar o avião na proa desejada.
O Comandante Yuan, no entanto, não aplicou o leme, confiando no piloto automático para manter a proa selecionada no sistema. Isso foi um erro terrível, pois o comandante se esqueceu que o piloto automático do Boeing 747 não atua nem no leme de direção e nem no compensador do leme. Para manter a proa selecionada no sistema, o piloto automático do 747 atua somente nos ailerons e nos spoilers diferenciais.
O avião começou a perder velocidade e guinar para a direita. O piloto automático aplicou o comando dos ailerons e dos spoilers diferenciais para a esquerda, para tentar manter a proa selecionada, até que os comandos chegaram ao batente, a 23 graus. Sem atuação dos pilotos nos pedais do leme, o avião continuou a guinar e rolar a 60 graus para o lado direito, perdendo altitude até entrar na pesada camada de nuvens logo abaixo.
O Comandante, enfim, desacopla o piloto automático do 747. A situação, que já estava ruim, piora subitamente. O Comandante tenta estabilizar o avião com os ailerons e profundores, e mantém, inexplicavelmente, os pés fora dos pedais. Ao observar o ADI (Attitude Direct Indicator - Indicador de Atitude, também conhecido como Horizonte Artificial), vê uma situação tão implausível que reporta imediatamente: "perdemos a ADI!"
Diagrama do acidente do Dynasty 006 |
O Engenheiro de Voo reporta, então, falha em todos os quatro motores. Na verdade, ele mesmo, sem perceber, havia recuado as manetes para trás, quando o Comandante perdeu o controle e o avião entrou em atitude anormal. Com exceção do motor 4, todos os motores operavam normalmente.
Na tentativa de recobrar os controles, o Comandante submeteu o Boeing 747 e seus ocupantes a esforços estruturais jamais imaginados pelos projetistas. Ignorando os ADI e sem poder visualizar o horizonte natural da Terra, o Comandante aplicava os comandos de modo aleatório, totalmente desorientado, submetendo o avião e seus ocupantes a esforços que chegaram a 5 G, cinco vezes a força da gravidade. A essa altura, os passageiros já se julgavam condenados a morrer. Muitos ouviram os rebites da estrutura saltar, um após outro, e o ruído parecia ser o de uma arma de fogo disparando.
Concepção artística do Dynasty 006, em atitude totalmente anormal |
Subitamente, no entanto, o avião saiu da camada, a 11 mil pés de altitude. Os pilotos viram o Oceano Pacífico se aproximar rapidamente, mas agora tinham uma referência visual. O comandante puxa o manche e avista o horizonte. Ao alinhar o nariz do avião, ordena ao Engenheiro reiniciar os motores. O Engenheiro liga os ignitores dos quatro motores e empurra as manetes à frente. Os motores 1, 2 e 3 respondem de imediato, e logo o motor 4 também responde. Subitamente, o avião parece voar normalmente, de novo, O controle do 747 foi retomado a 9.600 pés, e o avião tinha mergulhado 30 mil pés em dois minutos e meio, desde o FL 410.
O Comandante, pelo interfone, pede aos comissários uma avaliação da situação na cabine de passageiros. Há vários feridos, pelo menos dois com gravidade. Os controladores de voo do ARTCC (Air Traffic Route Control Center) Oakland, responsável por todos os voos que se aproximavam naquele setor da costa oeste dos Estados Unidos, conseguem finalmente se comunicar com o avião. O ARTCC Oakland já tinha liberado o voo para o FL 240, e depois tentaram por seis vezes se comunicar com o Dynasty 006, sem sucesso.
O Comandante Yuan, ao responder ao controle de tráfego aéreo, declarou estar subindo e ter intenção de prosseguir para o seu destino, Los Angeles. Não informou sobre a pane do motor 4, declarou "não ter percebido" as tentativas de comunicação para o seu voo e não declarou emergência. Oakland liberou o voo Dynasty 006 para o FL 200 e depois para o FL 350 em direção a Los Angeles, até que o Engenheiro de Voo, ao checar seus intrumentos, verificou que o sistema hidraulico nº 1 estava sem pressão, e que as luzes indicativas dos trens de pouso da fuselagem estavam baixados e travados. Não podiam ser recolhidos, por falta de pressão hidráulica no sistema 1.
O Comandante Yuan não demorou a perceber que, com o arrasto adicional dos trens de pouso baixados, o avião não teria combustível para alcançar Los Angeles, e finalmente declarou emergência. Oakland liberou uma aproximação direta para o Aeroporto Internacional de São Francisco, e afastou todas as demais aeronaves do caminho. A aproximação foi feita no piloto automático, que funcionou corretamente, até 2500 pés. A aproximação final e o pouso foram feitas manualmente, suavemente e com sucesso. Após livrar a pista, a tripulação deteve o avião danificado e cortou os motores. A aeronave foi rebocada para uma posição de estacionamento para o desembarque e o atendimento aos feridos.
Entre os 251 passageiros e 23 tripulantes a bordo, 24 se feriram, dois com alguma gravidade, um passageiro e um tripulante. Ninguém morreu.
O NTSB - National Transporte Safety Board investigou o acidente, por ter acontecido sobre o espaço aéreo americano e por envolver uma aeronave matriculada nos Estados Unidos, a despeito de operar para uma empresa aérea de Taiwan. O NTSB não teve grande dificuldade para elaborar o relatório, já que a aeronave e seus ocupantes sobreviveram.
O relatório concluiu que o aviao tinha somente uma pequena falha em uma válvula no motor 4, que restringiu a passagem de combustível e levou ao apagamento do motor em grande altitude. Era uma falha que não deveria conduzir a aeronave a um acidente. Tudo o que aconteceu a seguir foi falha dos pilotos: o Comandante deveria ter desacoplado o piloto automático e aplicado o leme, descer para abaixo de 30 mil pés e aí tentar reacender o motor 4. Isso não foi feito. O engenheiro errou também, ao tentar reacender o motor 4 em grande altitude e com uma bleed valve aberta (a bleed valve é uma válvula de sangria, que sangra ar comprimido do compressor do motor para alimentar o sistema pneumático da aeronave), contrariando o preconizado no manual.
O danificado Boeing 747-SP N4522V |
Por fim, por pouco o avião não foi foi perdido devido à desorientação espacial dos seus pilotos. Os instrumentos de voo funcionavam corretamente, mas foram ignorados, pois suas indicações foram julgadas como implausíveis pelos tripulantes. O voo somente foi salvo quando o comandante avistou o oceano e o horizonte da Terra, fornecendo referências visuais.
Como tripulantes tão experientes puderam cometer erros tão graves? Eles foram bem treinados e conheciam muito bem o avião. O NTSB conseguiu responder à essa pergunta: fadiga.
O comandante Yuan estava com boa saúde, mas tinha cumprido exaustivas jornadas de trabalha na semana que anteceu o acidente. Tinha passado 5 dias em Jeddah, na Arábia Saudita, até 14 de fevereiro, e feito um voo de ida e volta ao Japão na jornada anterior. Reconheceu ter dificuldades de dormir mais que duas horas em um voo de longa duração. A fadiga disso resultante foi, sem dúvida, decisiva no seu processo de tomar tantas decisões erradas, que quase conduziram a um desastre de gigantescas proporções. Felizmente, ele fez o que todo piloto foi treinado para fazer: salvou o avião e seus ocupantes, a despeito dos erros cometidos antes.
Os estabilizadores e profundores ficaram gravemente danificados |
O Boeing 747-SP demonstrou uma quase inacreditável resistência a esforços, para os quais jamais foi projetado. Aviões comerciais são projetados para suportarem 2,5 G positivos e 1 G negativo, e o N4522V suportou o dobro disso, talvez mais, e sobreviveu. Ainda pode ser reparado e voou por quase 18 anos depois do acidente.
O N4522V, desativado em Tijuana |
Fonte: Cultura Aeronáutica
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