A forma como a entrada da Venezuela
foi consolidada na última reunião cúpula do Mercosul, no final da
semana passada, revela a pressa do Brasil em ampliar o bloco. Essa é a
opinião de analistas ouvidos pela BBC Brasil, que acreditam que o
Brasil, em particular, estaria preocupado com a crescente influência da
China na região após a criação da Aliança do Pacífico, bloco que serve
de "contrapeso" ao Mercosul e teria maior aproximação com a Ásia.
Segundo a imprensa dos países do bloco, o Brasil teria pressionado
pela integração imediata da Venezuela ao Mercosul - e essa integração
teria sido decidida em uma reunião a portas fechadas entre os
presidentes do Brasil, Argentina e Uruguai durante a cúpula, na cidade
argentina de Mendoza.
Há notícias de que a pressão exercida pela presidenta Dilma Rousseff
nesse sentido sobre o Uruguai teria causado um mal-estar diplomático.
Além da integração da Venezuela, a cúpula também suspendeu o Paraguai,
em consequência da derrubada do presidente Fernando Lugo.
O Paraguai era o único país do bloco que não tinha ainda aprovado, no seu Senado, a entrada da Venezuela no Mercosul.
Para diplomatas da Bolívia, país associado que participa
dos encontros do bloco, "Brasil e Argentina foram decisivos" para
incorporar a Venezuela e suspender o Paraguai. "As reuniões tiveram
momentos tensos, mas o saldo foi muito positivo para toda a região",
disseram.
Na opinião de interlocutores do governo brasileiro, não
se podia esperar mais pela entrada da Venezuela no bloco. "Não podíamos
ficar reféns dos golpistas do Paraguai. E decidimos dar o troco",
afirmou uma fonte brasileira.
Na segunda-feira, o ministro das Relações Exteriores do Uruguai,
Luis Almagro, disse à rádio Espectador e ao canal quatro de televisão,
de Montevidéu, que a presidente Dilma pediu, em Mendoza, que os
ministros se retirassem para uma reunião entre ela e os colegas da
Argentina, Cristina Kirchner, e do Uruguai, José Mujica.
Naquele encontro entre os três presidentes, disse Almagro, foi
definida a palavra final sobre a incorporação da Venezuela ainda neste
mês. "Essa reunião começou com um chamado de Dilma Rousseff, que disse
que tinha de falar pessoalmente com os presidentes sobre um tema
político. Nós, ministros das Relações Exteriores, nos retiramos. A
postura do Brasil foi decisiva nesse assunto (incorporação da
Venezuela)", disse Almagro.
Segundo ele, na reunião dos ministros, um dia antes do encontro presidencial, o Uruguai era "contrário à entrada da Venezuela com o Paraguai suspenso".
O Congresso do Uruguai foi o primeiro a aprovar a entrada da Venezuela
para o Mercosul, depois a Argentina e, em terceiro, o Brasil.
A incorporação definitiva do país ao bloco dependia do Senado
paraguaio. "Eles também não foram tão rápidos em destituir o Lugo? Por
que não poderíamos incorporar já a Venezuela? A incorporação foi feita
com bases legais", disse um interlocutor brasileiro.
As declarações de Almagro causaram mal-estar nos bastidores dos
governos argentino e brasileiro. "As presidentas não decidem pelo
Uruguai, e o presidente uruguaio assinou a decisão de incorporação da
Venezuela", afirmou a fonte brasileira.
A incorporação da Venezuela provocou fortes críticas da oposição
uruguaia ao governo de Mujica. O Uruguai tem pouco mais de 3 milhões de
habitantes, e setores da política local entendem que, com o Paraguai
suspenso, o país ficará "ainda mais exprimido" entre as decisões dos
dois maiores sócios do bloco - Brasil e Argentina.
Bloco rival
Em seu discurso em Mendoza, Dilma disse esperar que outros países
sejam membros-plenos do Mercosul. A entrada da Venezuela foi consolidada
seis anos após a assinatura do primeiro acordo para essa integração e
seis meses antes da reunião semestral do bloco, em dezembro.
"O Mercosul vinha perdendo dinamismo e a integração da Venezuela dará
novo e importante fôlego ao bloco. A Venezuela é um país caribenho que
tradicionalmente esteve ligado aos EUA. Precisamos aproveitar a decisão
de (Hugo) Chávez de estar na América do Sul para formalizar logo essa
integração", disse um interlocutor do governo brasileiro, em Brasília.
"A incorporação da Venezuela também envolve, indiretamente, os países
da Alba (Aliança Bolivariana para os Povos da América), e o Mercosul
ficará ligado politicamente a esse bloco", disse o professor de ciência
política da Universidade do Chile, Guillermo Holzmann.
A ampliação do bloco veio pouco menos de um mês depois da
formalização, no Chile, da chamada Aliança do Pacífico, com a assinatura
de um acordo entre Chile, Peru, Colômbia e México, entre outros.
Segundo analistas e interlocutores dos governos do Mercosul, esse é
mais um motivo para o Brasil acelerar a revitalização e ampliação do
Mercosul. A Aliança seria um "contrapeso" ao bloco e reúne países com
acordos de livre comércio com a China e com EUA - caso do Chile e do
Peru.
A Colômbia tem acordo com os americanos e recentemente disse à China
que está interessada no mesmo tipo de entendimento de livre comércio.
Fonte: IG
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