Denúncias de que Assad estaria usando armas químicas em larga escala elevam pressão, de republicanos e da oposição síria, para que Obama intervenha. Especialistas, porém, são céticos sobre maior envolvimento dos EUA.
Os Estados Unidos estão repensando sua posição até então contrária ao repasse de armas aos rebeldes na Síria. A declaração foi dada pelo secretário de Defesa americano, Chuck Hagel, na quinta-feira (02/05), apesar de o presidente Barack Obama ressaltar que nenhuma decisão sobre uma maior participação no conflito tenha sido tomada.
Hagel destacou que armar os rebeldes que lutam contra o regime do presidente sírio, Bashar al-Assad, é apenas uma das opções que estão sendo consideradas por Washington. A medida é considerada arriscada, uma vez que o armamento poderia cair nas mãos de extremistas misturados entre os insurgentes, como os militantes da chamada Frente Nusra.
Em visita ao México, Obama declarou que os EUA têm observado "evidências de contínuos banhos de sangue" e um "potencial uso de armas químicas" dentro da Síria. Sendo assim, afirmou, "todas as opções" estão sendo avaliadas. Em ocasiões anteriores, o presidente americano já deixara claro que o uso de armas químicas seria a "linha vermelha", cuja ultrapassagem justificaria uma intervenção militar internacional.
"Queremos ter certeza de que olhamos antes de pular, e de que aquilo que fazemos vai realmente ajudar naquela situação, e não torná-la mais fatal e mais complexa", disse Obama.
Já se especulava que o governo americano poderia rever sua posição de não armar os rebeldes. A pressão aumentou após a revelação, na semana passada, de que agentes de espionagem dos EUA teriam constatado que o regime de Assad usou armas químicas em pequena escala especialmente gás sarin em confrontos com seus opositores.
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj18JTd-nQ_KPjl5JGtYhd-9YPezYh1Zpg7d06pGFl5tru8DApEu7qCJN7ZOV74N0sw0u-bTNKkHte-1jjEnp5l_kg12-cW-dHwcsv1V2gqT0BIaJ4aMtRQRG84dacSxr-LPHlkkNQg-Bn6/s640/syria-chemical-weapons.jpg Líderes ocidentais têm declarado que esperam alcançar uma solução pacífica para o conflito na Síria, que já dura mais de dois anos. No entanto, sem expectativas de que alguma negociação alcance resultados, o enviado especial das Nações Unidas à Síria, Lakhdar Brahimi, já acenou que deixará o cargo, assumido em agosto passado após a saída de Kofi Annan. Os integrantes do Conselho de Segurança da ONU Reino Unido, China, França, Rússia e EUA vem reforçando os pedidos para que Brahimi permaneça.
Pressão republicana
As informações do serviço secreto americano sobre o uso de armas químicas pelo governo sírio abriram caminho para distintas decisões políticas. Líderes do Partido Republicano, como o senador John McCain, por exemplo, pressionam os democratas na Casa Branca a tomar ações militares.
Apesar de Obama ter ameaçado Assad várias vezes caso houvesse o uso de armas químicas no conflito com os rebeldes na Síria, analistas acreditam que decidir por uma intervenção em solo sírio é algo bastante improvável.
"Há pouco interesse da opinião pública americana em uma nova ação militar no Oriente Médio após soldados americanos terem passado dez anos na região", avalia Charles Mallory, do Instituto Asper.
Ele acredita que o Conselho de segurança da ONU deverá condenar a Síria e prevê novas e mais duras sanções contra o regime de Assad.
"Enquanto não houver imagens de televisão tão terríveis quanto as que foram divulgadas na época do ataque de gás venenoso, feito pelo Iraque contra a cidade de Halabadja, não haverá qualquer intervenção americana", aposta.
Em 16 de março de 1988, aviões do regime de Saddam Hussein atacaram a cidade curda com bombas químicas. Mais de cinco mil pessoas morreram.
Ajuda indireta à oposição
Para Mallory, ao governo americano não restam apenas as opções "intervir ou não intervir" militarmente no conflito sírio. Outras medidas menos drásticas podem ser tomadas, como, por exemplo, fornecer apoio operacional e armamento aos rebeldes, ou ainda continuar ajudando países vizinhos da região em conflito, como Arábia Saudita, Catar e Turquia.
Bruce Riedel, especialista em Oriente Médio do Brookings Institut, ressalta que Obama foi eleito para encerrar as guerras no Iraque e no Afeganistão, e não para dar início a um novo conflito. Por outro lado, afirma Riedel, o presidente americano precisa ter garantido que suas ameaças sejam levadas a sério na região. O especialista enxerga uma espécie de "humilhação" de Obama tanto com relação à sua posição no conflito sírio, quanto diante do Irã, que insiste em sua política nuclear.
A oposição na Síria manifesta-se favoravelmente a uma intervenção militar estrangeira no país, além de defender que os países ocidentais os abasteçam com armas. Para os rebeldes, para acabar com a guerra são necessárias ações em posições ocupadas pelas tropas do regime e a implantação de uma zona de exclusão aérea nas fronteiras com a Jordânia e a Turquia.
Rebeldes querem intervenção
Em declarações recentes, o secretário de Estado americano, John Kerry, afirmou que os EUA querem dobrar para 250 milhões de dólares a ajuda à oposição síria e fornecer aos rebeldes equipamento não letal como colete à prova de balas, aparelhos de visão noturna e carros blindados.
"Com isso os EUA já aprovaram a entrega de armas aos rebeldes sírios", afirma o especialista em Síria Thomas Pierret, da Universidade de Edimburgo. "Eles mesmos não fazem a entrega das armas, mas deixam para a Arábia Saudita e o Catar fazê-la."
Entre os países da União Europeia, França e Reino Unido querem obter uma permissão para a entrega das armas. A decisão deve sair no fim deste mês. A Alemanha posicionou-se, até agora, contrária ao armamento dos rebeldes, argumentando que as armas podem ir parar nas mãos de terroristas.
Para o cientista político Rami Khoury, da Universidade Americana de Beirute, o fato de o Ocidente ainda não ter intervindo militarmente na Síria não é nenhuma surpresa. O conflito, afirma, mudou muito o perfil com o tempo, e hoje tem uma série de implicações mais complicadas.
Khoury ressalta ainda que o confronto remete à antiga Guerra Fria, com a Rússia ao lado do governo sírio, e os EUA apoiando os rebeldes. Ele diz não mais acreditar em uma solução política para o caso. "A guerra só chegará ao fim quando um lado vencer militarmente o outro", afirma o cientista político. E isso, completa, ainda pode durar um longo tempo.

Fonte: O Povo