A esperança dos Estados Unidos de alcançarem um cobiçado acordo de 4
bilhões de dólares para vender 36 caças ao Brasil sofreu um revés com as
revelações recentes de que os norte-americanos espionaram comunicações
da Internet brasileira.
Quando o secretário de Estado
norte-americano, John Kerry, sentar-se para conversar com autoridades
brasileiras em Brasília na terça-feira para preparar uma visita de
Estado da presidente Dilma Rousseff à Casa Branca, a venda dos jatos não
estará na agenda, disse uma fonte.
"Não podemos falar dos caças
agora... Você não pode dar um contrato desse para um país em que você
não confia", disse uma fonte do alto escalão do governo brasileiro à
Reuters sob condição de anonimato devido à sensibilidade da questão.
A
autoridade disse que a visita de um dia de Kerry ao Brasil estará
concentrada em restabelecer a confiança entre Washington e Brasília,
abalada com as revelações sobre espionagem que geraram um grande
alvoroço político no maior parceiro comercial dos Estados Unidos na
América do Sul.
A Embaixada dos Estados Unidos em Brasília não
quis comentar o impacto do caso de espionagem sobre a possível compra de
caças norte-americanos.
"Acreditamos que a oferta da Boeing é a
melhor oferta disponível aos brasileiros e ela tem o apoio total do
governo norte-americano", disse um porta-voz da missão diplomática
norte-americana em Brasília.
No mês passado, o jornal O Globo
publicou documentos vazados pelo ex-prestador de serviços da Agência de
Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) Edward Snowden que revelaram
a vigilância das comunicações eletrônicas no Brasil e em outros países
latino-americanos.
Irritados, senadores brasileiros questionaram a
visita de Dilma a Washington em outubro e criticaram a possibilidade de
assinar o contrato com os EUA para a renovação da frota de caças da
Força Aérea Brasileira (FAB).
A Boeing, com o caça F-18 Super
Hornet, concorre com a francesa Dassault, com o caça Rafale, e a sueca
Saab, com o Gripen NG, pelo contrato avaliado em pelo menos 4 bilhões de
dólares, além de prováveis encomendas futuras que podem ampliar o valor
do contrato ao longo dos anos.
O contrato para fornecimento de
caças para a FAB se tornou um prêmio cobiçado para as empresas de
defesa, no momento em que os Estados Unidos e muitos países europeus
reduzem seus orçamentos militares.
F-18 ERA FAVORITO
Uma
porta-voz da Boeing se recusou a comentar sobre o estágio atual da
oferta, mas disse que o eventual contrato com o Brasil é uma boa
oportunidade de negócios para a fabricante de aviões norte-americana.
O
Brasil tem debatido a substituição de seus defasados caças de combate
há mais de uma década, num processo que passou por três presidentes.
Dilma parecia estar próxima de uma decisão mais cedo neste ano, com a
Boeing aparecendo como clara favorita depois de a Força Aérea
norte-americana comprar 20 aviões de ataque leve da Embraer para uso no
Afeganistão.
Dilma adiou uma decisão sobre os caças por conta da
desaceleração econômica e da deterioração da situação fiscal do país. O
orçamento do Ministério da Defesa foi reduzido em 3,7 bilhões de reais
em maio e novamente em 920 milhões de reais no mês passado.
A onda
de manifestações que tomou as ruas do país em junho, impulsionadas por
uma ampla frustração com a qualidade dos serviços públicos e corrupção,
colocou os gastos governamentais sob os holofotes e ajudou a diminuir as
chances de uma grande compra, como a de caças de combate.
"Não
espero que a presidente decida sobre os contratos dos caças neste ano, e
ano que vem é ano de eleição, então isso pode ter que esperar até
2015", disse uma outra autoridade governamental envolvida na política de
defesa.
O Ministério da Defesa, no entanto, ainda espera que Dilma assine o acordo para a compra de novos caças antes do fim deste ano.
A
Força Aérea Brasileira pressionou o governo a tomar uma decisão ao
anunciar publicamente que os caças atualmente usados pelo país, os
Mirage 2000, de fabricação francesa e que defendem Brasília, estarão
obsoletos e não poderão mais ser usados depois do último dia deste ano.
O
escândalo de monitoramento da Internet, revelado por Snowden, afetou as
relações entre EUA e Brasil justamente no momento em que elas
caminhavam bem sob o governo Dilma.
Os laços entre os dois países
eram complicados durante o mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, que aproximou o Brasil de governos de esquerda da América Latina e
do Irã.
A visita de Estado de Dilma aos EUA em 23 de outubro é a
única do tipo que o presidente norte-americano, Barack Obama, está
oferecendo a um líder estrangeiro neste ano, um indicativo da
importância que seu governo dá a uma aproximação com o maior país da
América Latina.
Autoridades brasileiras afirmam que jamais
consideraram cancelar a visita de Dilma e que acreditam que as relações
entre os dois países são fortes o bastante para deixar o caso de
espionagem para trás.
Mas o governo brasileiro quer uma explicação
melhor do que a que obteve até agora sobre o que a NSA queria e qual a
amplitude da vigilância norte-americana sobre as comunicações
brasileiras, disseram as autoridades.
0 Comentários