“A abordagem da imprensa e da maioria da mídia (acerca da ufologia) é um fracasso total” (Rubens Junqueira Villela, cientista e primeiro brasileiro a pisar no polo Sul)
Recentemente (maio de 2013), a BBC News veiculou matéria que tangencia
um tema que a mídia em geral ignora ou enfoca de forma curiosa, talvez
por entendê-lo fantasioso.
Trata-se de uma ocorrência relacionada à
aparição de Ufos (Unidentified flying objects) ou Ovnis (Objetos voadores não identificados),
termo utilizado no Brasil.
A notícia comentava o relatório da firma
britânica UK Airprox Board, especializada em segurança de voos e
incidentes aéreos, que analisou um episódio acontecido em 2 de dezembro
de 2012, quando um avião de passageiros por pouco não colidiu com um
objeto não identificado.
O avião em questão, um Airbus A320, preparava-se para aterrissar no
Aeroporto Internacional de Glasgow, na Escócia, quando o piloto e os
tripulantes viram um objeto à frente aparecer repentinamente e passar
embaixo da aeronave, a uns dez segundos de distância, segundo o
comandante.
Porém, o radar não teria detectado nenhum tipo de aeroplano
naquele momento e imediatamente após o incidente foi iniciada uma busca
na região sem resultados.
Em um trecho da conversa registrada entre o
controlador de voo, na torre de monitoramento, e o piloto do avião, logo
após a passagem do objeto, este afirma “não ter certeza do que é (o
objeto)”, e acrescenta que “sem dúvida é bem grande e é azul e amarelo”.
A investigação não conseguiu determinar o tipo de objeto descrito,
apesar de descartar a possibilidade de ser outra aeronave ou um balão
meteorológico.
No seu parecer final, a UK Airprox Board admite que as
fontes de vigilância disponíveis não obtiveram êxito em rastrear nenhuma
atividade que correspondesse àquela narrada pelo piloto do A320, ainda
que as condições meteorológicas fossem consideradas favoráveis para a
observação.
Mais um entre milhares de incidentes aéreos não conclusivos
ou mal explicados que a mídia se exime de apurar mais profundamente,
limitando-se apenas a reportá-lo.
Governo Blair investigava Ovnis
Desde 2003, o governo britânico vem disponibilizando ao público e à
mídia documentos ufológicos – antes catalogados sob a rubrica de
secretos e ultrassecretos – que podem ser consultados em seu Arquivo
Nacional (The National Archives - TNA). Esse acesso foi ampliado a
partir de 2008 com a incorporação de novos arquivos, agora também
disponíveis na internet.
Em um desses lotes abertos à consulta pública em 2012 é descrito o
trabalho de agentes do Projeto UFO (UFO Desk) no período de governo do
primeiro-ministro Tony Blair (1997 a 2007), que tinham a tarefa de
produzir informes diários sobre Ovnis para o Ministério da Defesa (MOD).
Cabia ao setor acompanhar os relatos e investigações sobre possíveis
“avistamentos”, gerenciar os pedidos de consulta de dados pela mídia e
pesquisadores e manter contato com ufólogos.
Um serviço assinalado como
“o mais estranho da administração pública inglesa” pelo jornalista e
pesquisador David Clarke, responsável pela catalogação e liberação dos
arquivos UFOno TNA.
Segundo Clarke, a partir de 2005, com a implementação da Lei de
Liberdade de Informação (Freedom of Information Act-Foia) em todos os
patamares de governo, a pressão de vários segmentos da sociedade para a
divulgação dos registros oficiais sobre Ovnis se acentuou e o tema foi
um dos mais solicitados ao Ministério da Defesa para consultas.
Na
ocasião, o subsecretário de Estado de Defesa Tom Watson confirmou que os
arquivos UFO eram os tópicos mais requisitados para liberação, seguidos
das consultas sobre recrutamento, investigações funcionais e eventos
históricos, como a II Grande Guerra e o conflito das Malvinas.
Margareth Thatcher e o Roswell inglês
Mas, apesar da liberação dos documentos – antes mantidos sob sigilo
militar –, um antigo funcionário do MOD, Nik Pope, que dirigiu o UFO
Desk na década de 1990 e deixou o ministério em 2006, revelou que os
nomes de muitas pessoas ficaram ininteligíveis para mantê-las
propositadamente no anonimato e que os arquivos somente receberam o nada consta
após uma análise minuciosa e a certeza de que não constituíam ameaça à
segurança nacional.
Ainda assim, determinados arquivos foram retidos de
acordo com as exceções estipuladas pela Foia.
Para Pope, o mais relevante nesses registros diz respeito à segurança
aérea porque existem muitos relatos de incidentes onde aviões comerciais
por muito pouco não se chocaram com objetos não identificados. Contudo,
em 2009 a divisão UFO foi desativada pelo MOD que entendeu que os
milhares de “avistamentos” narrados pelo público não tinham valor
militar. Entretanto, o especialista acredita que o MOD continuará de
forma não oficial monitorando radares e “avistamentos” relatados por
pilotos militares e da aviação civil.
Um desses relatos ficou conhecido como o caso Roswell inglês, em alusão
ao famoso incidente ufológico que teria ocorrido em 1947 na cidade de
Roswell, no noroeste dos Estados Unidos, envolvendo a queda de um Ovni,
fato negado pelas autoridades militares americanas.
Na Inglaterra, no
início do governo de Margaret Thatcher, na década de 1980, o
“avistamento” de “luzes inexplicáveis” pairando sobre a Floresta
Rendlesham – de acordo com o memorando de 13 de janeiro de 1981,
assinado pelo subcomandante da base da Força Aérea Britânica (Royal Air
Force - RAF) de Bentwaters, tenente-coronel Charles Halt – também foi
considerado “não significativo para a Defesa”.
O incidente que envolveu
“avistamentos” de Ovnis se estendeu por quatro dias, em dezembro de
1980, e foi presenciado por dezenas de militares.
Na época, as bases de
Bentwaters e Woodbridge, no leste da Inglaterra, estavam sendo usadas
pela Força Aérea dos Estados Unidos.
Por ocasião da morte de Margaret Thatcher, em abril deste ano, David
Clarke lembrou que o desaparecimento da Dama de Ferro iria privar os
ufólogos, definitivamente, de uma certeza sobre o real conhecimento da
ex-primeira-ministra sobre o incidente da Floresta Rendlesham.
Ele
contou que, em 1997, durante uma festa de caridade em Londres, Thatcher
teve um encontro casual com a jornalista e ufóloga inglesa Georgina
Bruni (1947-2008) e proferiu uma frase que intrigou a jornalista.
Diante
da pergunta sobre o fenômeno dos Ovnis e de sua tecnologia avançada,
Thatcher teria respondido: “Você não pode dizer as pessoas” (You can’t tell the people).
A afirmação acabou se transformando no título do livro que Bruni
publicou em 2000 sobre suas investigações acerca do episódio de
Rendlesham Forest.
WikiLeaks e os documentos sobre Ufos
Outra liberação de documentos ufológicos bastante aguardada por
estudiosos desses fenômenos e ignorada pela mídia viria da parte de
Julian Assange e de seu site WikiLeaks.
Em 3 de dezembro de 2010, após a
publicação de mais de 250 mil telegramas diplomáticos sigilosos das
embaixadas dos Estados Unidos em todo o mundo, o australiano,
respondendo às perguntas dos leitores do jornal britânico The Guardian,
confirmou que nos documentos secretos ainda não divulgados (700 mil já
tinham sido publicados) existiam referências a Ovnis.
Entretanto, dois
meses depois, Assange admitiu em comunicado que suas afirmações sobre
registros ufológicos foram superdimensionadas.
Mas em abril deste ano, ao divulgar 1,7 milhão de documentos
diplomáticos do tempo de Henry Kissinger, quando este era secretário de
Estado dos EUA (1973-1977), o WikiLeaks também liberou 21 telegramas que
continham referências a ocorrências ufológicas.
Em um deles, enviado da
embaixada dos EUA em Gana, na África, a Washington, em novembro de
1973, há o registro de como o espaço aéreo havia sido violado por Ovnis,
os quais não correspondiam a aeronaves comerciais convencionais.
Porém o registro secreto mais surpreendente sobre o tema partiu de um
órgão científico federal – The Bureau of Oceans and International
Environmental and Scientific Affairs (OES) – do Departamento de Estado
norte-americano. Criado em 1974 pelo Congresso dos EUA para atuar na
política externa em relação às mudanças climáticas, energias renováveis e
situações dos oceanos e dos polos, o bureau também lida com a
questão espacial e a exploração do espaço através de um escritório
próprio, o Office of Space and Advanced Technology. No documento
divulgado pelo WikiLeaks, datado de 26 de março de 1975, o OES enviava
um informe com o seguinte título: “Arrangements to welcome
extraterrestrial life forms to the US” (Normas para dar boas-vindas a
formas de vida extraterrestres pelos Estados Unidos, em tradução livre).
Ministério da Defesa recebe ufólogos
Assange está refugiado na embaixada do Equador em Londres desde junho
de 2012, e um de seus mais importantes informantes, o soldado
norte-americano Bradley Manning, analista de inteligência, pode ser
condenado à prisão perpétua nos EUA.
De acordo com o ex-senador pelo
estado do Alasca Mike Gravel, que em 2008 concorreu à indicação do
Partido Democrata para a candidatura à Presidência dos EUA, a Casa
Branca tem ajudado a acobertar a verdade sobre Ufos.
Em um painel sobre o
tema, em Washington, na primeira semana de maio deste ano, ele culpou a
mídia e o governo pelo acobertamento dos fatos.
“O que estamos
enfrentando aqui, por parte da imprensa e também do governo, é um
esforço para marginalizar e ridicularizar as pessoas que possuem algum
conhecimento específico.” Gravel revelou que os “relatos mais fortes”
sobre Ufos vêm justamente de ex-oficiais militares.
Por aqui, um encontro inédito reuniu ufólogos e representantes do
Ministério da Defesa, em Brasília, em abril deste ano, onde se
determinou que todos os documentos sobre o assunto sob a
responsabilidade do Exército, Marinha e Aeronáutica fossem tornados
públicos, como estabelece a Lei de Acesso à Informação - LAI (Lei nº
12.527, de 18 de novembro de 2011).
A disposição do governo foi
comemorada pelo ufólogo Ademar José Gevaerd, editor da revista UFO,
presente ao encontro, que classificou a reunião de “histórica e sem
precedentes em todo o mundo”.
Além da promessa de manter um canal de
comunicação permanente com os estudiosos dos fenômenos ufológicos, os
militares que participaram da reunião revelaram que o maior número de
requerimentos de informações ao órgão, a partir da regulamentação da
LAI, em 16 de maio de 2012, tinha os OVNIs como ponto de interesse, uma
surpresa para os próprios ufólogos.
Falando ao repórter Pedro Peduzzi, da Agência Brasil, Gevaerd destacou
que as autoridades afirmaram que o ministro da Defesa Celso Amorim
respeita a ufologia e o trabalho dos ufólogos.
O ministério garantiu
ainda que pretende levar adiante a ideia de estabelecer um canal
permanente de comunicação com a Comissão Brasileira de Ufólogos
(“Ministério da Defesa e ufólogos abrem canal para troca de informações
sobre óvnis”, em 19.04.2013).
A Agência Brasil, portal público de
notícias gerido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), produz
notícias para mais de 8 mil veículos de comunicação em todo o país, com
um alcance de 20 milhões de leitores.
A maior reportagem de todos os tempos
Entretanto, a disponibilização de documentos sigilosos sobre operações
militares envolvendo “avistamentos” de óvnis pode esbarrar em
obstáculos.
O coronel da Aeronáutica Alexandre Emílio Spengler,
responsável pelo Serviço de Informações ao Cidadão do Ministério da
Defesa admitiu que alguns documentos foram extraviados e outros
destruídos, já que o decreto 79.099 de 1977 permitia a destruição de
documentos sigilosos.
Quanto aos pedidos de informações negados (até o
momento), Spengler explicou que muitos documentos ainda estão sob sigilo
pelo fato de envolverem assuntos relacionados à segurança nacional,
classificados como secretos ou ultrassecretos.
Para o pesquisador e cientista Rubens Junqueira Villela, de 83 anos,
antigo professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências
Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP) e participante do
Programa Antártico Brasileiro, a vida é um fenômeno universal e ela não
está isolada ou ilhada, e sim, interconectada pela própria tessitura do
universo.
Com mais de uma dezena de viagens ao polo Sul, ele presenciou,
em 1961, um “avistamento” na Antártida a bordo do navio quebra-gelo
“Glacier” da Marinha dos EUA, com outros membros da tripulação.
O fato
foi registrado por organizações científicas internacionais da época como
o Gepa (Groupement d’Etude des Phénomènes Aériens), da França, e o
Nicap (Nacional Investigations Committee On Aerial Phenomena), dos EUA.
Em entrevista ao site Ufovia, em 2010, Villela criticou a maneira como a
mídia encara a ufologia.
“Com raríssimas exceções, os profissionais
destes meios são incapazes de uma abordagem objetiva, investigativa e
isenta de preconceitos. Simplesmente estão perdendo a maior reportagem
de todos os tempos!”
Sheila Sacks é jornalista, Rio de Janeiro, RJ
Do - Arquivos do Insólito
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