Utilizando-se do pretexto da proclamação da independência da república autônoma da Crimeia, dentro da Ucrânia, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) reviveu hoje planos congelados sobre o ingresso da Geórgia no bloco.
Segundo o jornal russo Kommersant, a
OTAN está disposta a iniciar com Tiflis o plano de ações voltadas à
adesão desse país caucasiano, um desejo do governo georgiano que tem
sido bloqueado desde 2008 por aliados influentes como a Alemanha e a
França.
Uma fonte citada pelo jornal de maior tiragem neste país detalhou que a iniciativa poderia ser analisada na Cúpula do próximo mês de setembro, no Reino Unido.
Acrescentou que caso a Rússia reconheça o pedido de unificação da Crimeia e que o projeto seja levado adiante, a incorporação de Geórgia seria quase um fato certo.
O Kommersant relembra que o único obstáculo poderia ser a posição da Alemanha, por suas relações mais favoráveis com a Rússia, entre o restante dos estados aliados.
Contudo, a fonte não identificada pelo jornal russo expressou estar seguro de uma mudança da postura de Berlim já que nenhuma das demais autoridades das nações da União Europeia admite uma eventual unificação de Crimeia à Rússia.
O plano de ações da OTAN, como preâmbulo do ingresso, supõe o cumprimento pelo país solicitante de um pacote de condições políticas, econômicas, legais e militares, que no fundo representam perda de soberania, anexação, ocupação do território e dependência, além de ampliar o cerco ao redor da Rússia.
Com esse status participam hoje Bósnia Herzegóvina, Macedônia e Montenegro, territórios que separados da antiga Iugoslávia após conflitos armados instigados pelos Estados Unidos e pela OTAN, seguidos da agressão aliada.
Por outro lado, o Parlamento de Crimeia emitiu ontem uma declaração de independência dessa república autônoma, ao invocar o respaldo que Kosovo recebeu do Ocidente, e em particular o veredicto da Corte Internacional de Justiça da ONU, do dia 22 de julho de 2010, contra a Sérvia.
A sentença, recordaram os deputados em sessão extraordinária, afirma que a declaração unilateral de independência de parte de um Estado não viola nenhuma norma internacional, daí é que se tomou esta decisão, indicaram os parlamentares, em uma votação de 78 deputados a favor, dos 100 presentes.
A declaração era um requisito indispensável para a realização do referendo sobre o status do território, marcado para o próximo domingo.
Além disso, a Prefeitura (prefeitura) da cidade de Sebastopol se pronunciou pela independência e pela celebração de um plebiscito, amparado no direito dos povos à autodeterminação.
Do Pravda
Na cúpula da OTAN marcada para setembro, provavelmente
será apresentado à Geórgia um Plano de Ação para a adesão à Aliança
Atlântica. Os peritos associam a inesperada pressa de Bruxelas à
situação na Ucrânia. A Aliança se prepara para ações mais decisivas,
apesar de antes também não se retrair demasiado na Europa Oriental.
A
probabilidade de o pedido de Tbilisi ser aceite é bastante elevada.
Isso é atualmente reconhecido mesmo pelos membros da OTAN que
anteriormente apelaram a que não se precipitasse os acontecimentos.
Entretanto
a via oficial para uma adesão à OTAN é longa e trabalhosa. Se se
cumprir escrupulosamente todas as exigências, ela poderá demorar vários
anos. Mas, se houver muita vontade, também poderão ser apenas alguns
meses. Por outras palavras, a Geórgia poderá entrar na OTAN pela porta
dos fundos, entreaberta amavelmente pelos norte-americanos. Este é o
comentário do analista Ivan Konovalov:
“Existem dois
critérios fundamentais para que um país seja aceite na OTAN. O primeiro é
aquilo que o Ocidente chama de “governação democrática estável”. O
segundo é ter forças armadas fortes e bem abastecidas. Sinceramente, a
Geórgia não possui nem uma coisa, nem outra.”
O país tem
problemas territoriais por resolver. A economia parece bastante débil
por comparação com os países europeus. Já as forças armadas, apesar de
terem sido criadas com base no modelo ocidental, também não se mostraram
muito eficazes.
Além disso, a admissão como país-membro
da OTAN é uma decisão colegial. Podemos não duvidar que muitos países
europeus admitem com muita relutância a possibilidade de a Geórgia vir a
ser membro da Aliança Atlântica. Mas os EUA têm alavancas de influência
poderosas. Se eles se esforçarem o bastante, a Geórgia poderá vir a
fazer parte da OTAN.
Na opinião de uma série de peritos,
todas as conversas à volta da entrada da Geórgia na OTAN não passa de
uma demonstração de força, de uma espécie de contrapropaganda à posição
da Rússia relativamente à Crimeia. A aceleração do processo de entrada
da Geórgia na OTAN irá acrescentar problemas a Tbilisi. Já a atual
situação na Ucrânia demonstra que a admissão da Geórgia na OTAN seria um
passo extremamente precipitado para a organização. Por isso, as partes
terão de agir de forma muito cautelosa e pragmática.
Apesar
de parecer um paradoxo, os apelos de Bruxelas podem obrigar Tbilisi a
rever as suas posições nas questões da Abkházia e da Ossétia do Sul. O
cientista político Pavel Zolotarev comenta:
“Este tipo
de declarações está, pelos vistos, na continuidade da linha seguida em
2007-2008, quando a Geórgia e a Ucrânia estavam sendo ativamente
atraídas para fazerem parte da OTAN. Os acontecimentos de agosto de 2008
obrigaram a fazer uma pausa nesse processo. Mas foi só uma pausa,
porque os EUA não desistiram desse objetivo, o que é comprovado pelos
desenvolvimentos da situação na Ucrânia.
Não
conseguiram atrair a Ucrânia inteira para a OTAN, a Crimeia ficou logo
de fora. Mas, para influenciar a situação, eles começaram logo a falar
em adesão da Geórgia. Esse passo se destina a obter um efeito político.
Em
primeiro lugar, não tenho a certeza se a própria direção georgiana terá
esse desejo. Em segundo, ao entrar para a OTAN, Tbilisi terá de
declarar a ausência de quaisquer problemas territoriais e abdicar de
todas as pretensões relativas à Abkházia e Ossétia do Sul, o que é pouco
provável. Mas se não for assim, o acesso da Geórgia à OTAN estará
vedado.”
A entrada da Geórgia na OTAN dificilmente
agradará à Rússia. Sobretudo devido ao aparecimento de uma ameaça
militar adicional junto à sua fronteira meridional. Contudo, os peritos
não vêm nisso um motivo para grandes preocupações. A Rússia é
suficientemente forte para não sentir complexos a esse respeito. Como
dizia Caio Júlio César, a tranquilidade do guerreiro deve aterrorizar o
inimigo. Moscou segue essa máxima.
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