Uma trosoba no céu de Limoeiro

Fonte: O Povo

Em Limoeiro do Norte, dois inventores criaram a trosoba, um avião com motor de fusca e estrutura de alumínio aeronáutico que voa a 120 quilômetros por hora. José Ribamar e José Lucilane refazem caminhos de Santos Dumont, ao apostar num sonho de construir um avião

É um pássaro? Um avião? É a trosoba no céu de Limoeiro do Norte. Um avião com motor de Fusca e Brasília e estrutura com sucata de tubo de alumínio aeronáutico. A invenção é do caminhoneiro José Ribamar Maia de Freitas e de José Lucilane Mendes Ribeiro, que tem uma oficina de auto elétrica. O avião criado por eles tem 9,20 metros de envergadura (distância de uma ponta a outra entre as asas), seis metros de comprimento e voa a uma velocidade de 120 quilômetros por hora (com motor reduzido a 75% da capacidade). O avião voou numa pista de pouso em Limoeiro do Norte.

"O avião é como um ultraleve avançado, porque tem menos de 500 quilos, tendo 310 quilos vazio e sendo pilotado por duas pessoas. Eu sou o piloto e José Lucilane é o co-piloto", diz Ribamar. Os dois criaram a trosoba aprendendo juntos, errando e caindo, tal como Santos Dumont. Enquanto Ribamar fica com a parte de desenho e projeto, Lucilane desenvolve as partes elétrica, mecânica, aerodinâmica. Os dois montam tudo juntos.

A história dos dois Josés começou em Limoeiro do Norte, onde moram e se conheceram por meio de uma rádio que divulgou a paixão de Ribamar aos ouvintes. Lucilane entrou em contato com ele e daí vieram os planos. O primeiro avião foi criado em 1998 e mal saiu do chão. Desde então, não pararam. Veio o segundo, em 2000, que decolava mas não se mantinha no ar. Já em 2001, eles conseguiram a proeza de fazer um avião que levantou 20 metros, mas a estrutura era fraca e o avião foi despencando no ar.

"Fizemos um pouso de emergência nos matos. Graças a Deus, não aconteceu nada com a gente", relembra Ribamar. Já o quarto avião é o 14 Bis deles, porque foi a invenção que deu certo, com condições ideais de vôo. "Levamos mais de um ano para construir, em 2005 ficou pronto, mas ele levou muito sol e chuva, sem abrigo. Um amigo apelidou ele de trosoba", conta Ribamar rindo. "Por enquanto, o avião está desmontado porque estamos construindo um galpão, um hangar", dizem. Eles esperam remontar esse quarto avião em breve. "Quem sabe possamos fazer uma trosoba número 5", brinca Lucilane, lembrando os feitos do primeiro aviador. Eles aprenderam o ofício sozinhos, quebrando a cabeça e várias peças. Também não foi fácil investir. Em 2000, Ribamar conta que não tinha dinheiro para o curso de pilotagem e vendeu a moto para ir a Fortaleza fazer 12 horas de vôo de ultraleve. Já Lucilane tinha voado de asa delta, antes de conhecer Ribamar. "Fomos aprendendo com nossos próprios erros até conseguir voar. Não tinha dinheiro para fazer o curso de pilotagem. Costumo dizer que era uma estrada larga e fomos abrindo uma vereda ao lado, para realizar nosso sonho", compara Ribamar.

Hoje, o sonho tornou-se profissional e eles fizeram curso teórico de pilotagem em Fortaleza, esse ano. "As pessoas no curso dizem que a gente foi primeiro fazer o avião, para depois voar. No momento, ainda não fizemos a parte prática, que é cara", diz Ribamar. A fama deles tem crescido. Lucilane conta que os dois ministraram curso de noções de aviação em Limoeiro do Norte, durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia.

Os dois são apaixonados por avião desde a infância e admiradores de Santos Dumont. Ribamar diz que só conheceu mais a fundo a história do inventor depois que voou. "Terminei o curso de primeiro e segundo grau recentemente e depois passei a conhecer mais a história dele. Ele foi o criador, tudo o que veio depois, em termos de aviação, tem a participação de Santos Dumont. Ele abriu o caminho dos céus para nós". ta)

JOSÉ RIBAMAR Maia realiza o sonho de voar em uma máquina construída por ele mesmo: “ninguém tira isso de mim” (Foto: Fotos: Arquivo Pessoal de Ribamar Maia)

Caminhoneiro constrói avião

(Diário do Nordeste, 7/10) - Via Jornal da Ciência

Desde do vôo histórico de Santos Dumont, em Paris, em 1906, até o pouso dos astronautas da Apollo 11, na Lua, em 1969 o homem tem conseguido realizar, pelo menos, em máquinas, o sonho de Ícaro e seu pai, Dédalo, de voar

No sertão cearense, José Ribamar Maia de Freitas, de 34 anos de idade, quase sem recursos ou conhecimento aeronáutico, superou todas as dificuldades e desconfianças da população de Limoeiro do Norte, e construiu um avião. Sonho de quase toda a sua vida.

Caminhoneiro, casado e pai de três filhos, ele conta que "meteu na cabeça" que iria voar de qualquer jeito, independente do tempo e dinheiro que seriam necessários para isso. E foi o que fez.

Há três anos, depois de muito idealizar, foi até o Aeroleve de Fortaleza e começou a se informar com os mecânicos e pilotos sobre o assunto. José Ribamar não tinha a menor noção sobre o desenho da asa, que segundo o piloto e jornalista Tom Barros, é um dos itens fundamentais para o avião levantar vôo.

"Eu apenas conhecia sobre motor de carro e caminhão e achava que bastava isso", diz. Voltou para Limoeiro, juntou canos, cadeira plástica, lona e motor Volkswagen e fez a sua primeira máquina. Não teve sucesso. O avião nem saiu do lugar.

Mesmo assim, não desanimou. Voltou a Fortaleza e com o dinheiro que tinha para terminar a construção de sua casa, cerca de R$ 1 mil, pagou 12 horas de aulas no Aeroleve. Não foi suficiente para aprender a pilotar.

Em média, são necessárias 20 horas de aulas teóricas e práticas. Sem o "brevet" e sentindo-se "mais experiente", Ribamar voltou para sua cidade e tentou o segundo avião.

Nesse tempo, adquiriu mais conhecimentos sobre o desenho da asa e teoria de vôo. Desta vez, para fazer a estrutura do avião, usou alumínio aeronáutico, que tem maior resistência e é mais leve. Com isso, avançou.

Cobriu a "engenhoca" com lona e colocou o motor Volkswagen. Sem ligar para a advertência do instrutor do Aeroleve, Guilherlardo Nunes, de que "seria quase um suicídio tentar voar numa ´coisa´ daquela", ele fez sua segunda tentativa frustrada. O avião caiu. "Foi um susto, mas saí ileso".

Nada parecia detê-lo. "Meu sonho era maior", afirma. Procurando saber mais sobre itens importantes para o aviador, como o centro de gravidade da máquina e balanceamento, partiu para seu terceiro projeto.

Desenhou um modelo Asa Baixa, fez um trem de pouso com mola de caminhão; colocou amortecedores de moto e motor 1600 da Volkswagen; estrutura de alumínio aeronáutico e gasolina comum. Para o revestimento usou tecido de algodão impermeabilizado com resina de vidro e algumas peças de Opala.

Com tudo pronto, conta que disse para ele mesmo: "é agora ou nunca". Foi para a pista da Chapada do Apodi, que é asfaltada e tem mil metros, e ficou treinando decolar e pousar.

Depois que estava seguro, avisou aos amigos: "é hoje!". O grupo, que o chamava de louco e visionário, foi até lá para conferir. E não deu outra. O sonho se tornou realidade.

José Ribamar finalmente decolou e sobrevoou as plantações do perímetro irrigado. Muito emocionado e recebendo o carinho da família, ele hoje é admirado e respeitado em sua cidade.

Quase sem acreditar que a história dele é verdadeira, um grupo do Clube Catuleve, de Fortaleza, liderado por Tom Barros, o sanfoneiro Waldonys (que também é piloto acrobático) e o presidente do Aeroclube de Mossoró, John Wayne, foi até lá para ver. Todos ficaram impressionados.

"Ficamos surpresos com a coragem dele e, a princípio, pensamos que aquela invenção nem iria sair do chão", afirma Tom. Outra emoção de Ribamar foi ver seu avião sendo pilotado por Waldonys, que sobrevoou a pista.

Mesmo informado de que não tem autorização para voar, sem carteira de piloto, e que o Depto. de Avião Civil (DAC) deve questionar e proibi-lo, ele diz que nada tem mais importância.

"Podem tirar o meu avião, mas não podem tirar a realização de meu sonho". Agora, seu plano é acabar de construir sua casa.