A decisão do adiamento da visita oficial da presidente Dilma Rousseff aos Estados Unidos, anunciada nesta terça-feira (17), após comum acordo com o presidente Barack Obama,
causará o congelamento de uma relação que vinha caminhando a passos
largos. É essa a opinião de Geraldo Zahran, professor de relacionais
internacionais PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo),
ao avaliar os prejuízos bilaterais dos escândalos de espionagem, que
resultou na mudança da agenda dos líderes dos dois países.
"Não imagino que essa tensão vá colocar em xeque os acordos bilaterais
entre Brasil e os Estados Unidos, tampouco que haja retaliações entre as
partes", afirmou Zahran, que acrescentou que o "congelamento na
relação" pode ser ainda mais prejudicial caso atitudes não sejam tomadas
em curto ou médio prazo.
Para ele, no entanto, a decisão do adiantamento da visita foi acertada.
Avaliação também feita por Alcides Costas Vaz, professor do Instituto
de Relações Internacionais da UnB (Universidade de Brasília). "Foi um
tom adequado à prometida resposta norte-americana sobre as denúncias de
espionagem ao governo brasileiro", apontou. Na opinião dele, se a
presidente mantivesse a agenda, demostraria certa indiferença em relação
ao tema. "E isso, sim, que me parece inadequado."
"Ao tornar pública essa decisão, diante da opinião pública externa e
interna, a presidente evidencia a preocupação brasileira com o fato da
espionagem, além de expressar melhor essa inquietação", completou Vaz,
que não classifica a medida como uma "pressão", mas, sim, como uma
"tomada de decisão".
Como citou Zahran, também não foi uma retaliação aos Estados Unidos.
"Retaliação seria se o governo proibisse que empresas norte-americanas
participassem de licitações no país ou mesmo se o Brasil se recusasse a
receber autoridades dos Estados Unidos", afirma ele, que relata que a
questão tem um peso maior para o Brasil do que para os Estados Unidos.
"O governo brasileiro não se sentiu satisfeito e os dois presidentes
decidiram tomar essa atitude para que agenda bilateral não fique refém
dessa decisão. É uma decisão importante de dois países que tem tendo
agir como parcerias e em parceria existem tensões."
Mas, para Cristina Pecequilo, professora de relações internacionais da
Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o adiamento da visita não
resolve o impasse entre os dois países. "Acho que ela [Dilma] deveria
manter a viagem apesar da gravidade das acusações de espionagem. A
visita de Estado seria uma boa oportunidade para resolver problemas na
relação bilateral cara a cara", afirmou a especialista, que apontou que a
decisão não terá impacto significativo nas relações entre os dois
países. "Eu acho que do ponto de vista comercial e econômico não há
nenhum impacto. Não é uma quebra de relacionamento desse ponto de
vista", disse.
Apesar do adiamento da visita, o professor da UnB ressaltou a decisão
de Dilma e Obama de não cancelar o encontro. "Manter esse encontro em
perspectiva é importante para o desenvolvimento bilateral", disse Vaz.
Mas, de acordo com Zahran, dificilmente a visita seja realizada ainda
esse ano. "Diante da intensa pauta internacional --com reunião da ONU,
crise na Síria e a agenda doméstica dos Estados Unidos-- não imagino que
a viagem aconteça tão logo. Isso vai levar um tempo."
Repercussão no Congresso
O senador tucano Aécio Neves (MG), provável candidato à Presidência em
2014, criticou a atitude de Dilma. "Era a oportunidade de a presidente
ter uma agenda afirmativa em defesa dos interesses do país. Ela opta,
mais uma vez por privilegiar o marketing". Para Aécio, a presidente
deveria ter mantido a viagem e cobrado explicações pessoalmente a Obama.
O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) afirmou que o governo brasileiro faz
"política de avestruz" ao adiar a visita oficial da presidente Dilma
Rousseff aos Estados Unidos.
"Não gosto de política de avestruz, que esconde a cabeça na areia para
não saber o que se passa ao redor", afirmou o tucano. Para Alvaro Dias,
se houve espionagem, o Brasil deveria insistir em pedir explicações ao
presidente norte-americano, Barack Obama, e não adiar a visita.
"Cabe ao governo brasileiro enfrentar o problema, não fugir dele. Esse
afastamento trará prejuízos econômicos ao país", disse o senador. "A
viagem permitiria fazer um questionamento pessoal, frente a frente."
O tucano associou a desistência da viagem com que ele considera visão
equivocada da diplomacia brasileira. "O governo brasileiro tem cometido
equívocos diplomáticos sem fim. Essa decisão mostra que o Brasil
substitui, em sua política externa, países economicamente avançados por
países de terceiro mundo", criticou.
Já o senado José Agripino Maia (DEM-RN), vê na decisão um ato de
"marketing político-eleitoral". "Não tenho nenhuma dúvida que por trás
dessa decisão está um belo aconselhamento de marketing
político-eleitoral."
O parlamentar, no entanto, afirmou que a decisão "tem o viés positivo de mostrar a estatura do Brasil diante da bisbilhotice".
Questionado, Agripino evitou afirmar qual deveria ter sido a atitude do
governo frente às denúncias de espionagem. "Quem tem condições de
avaliar se essa decisão foi correta, é a presidente. Não tenho o mesmo
volume de informações que ela tem. Não quero fazer nenhuma censura."
O senador disse que outros países que teriam sido espionados, como
México e Argentina, irão manter "intactas" suas relações com os
norte-americanos, e que a suspensão da viagem por causar um
"descompasso" nas relações comerciais entre os países.
"A não ida é uma afirmativa do Brasil. A posição dela [Dilma] está
baseada em informações que não foram prestadas por eles. Por isso, é uma
postura em defesa da soberania nacional", disse o senador Walter
Pinheiro (PT-BA). "Mas é importante dar outros passos, como em relação à
defesa do país, já que a vulnerabilidade do Brasil está além
fronteiras", completou. O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) concordou
com o adiamento da viagem: "era o mínimo a ser feito".
Para o líder do PSDB, senador Aloysio Nunes Ferreira (SP), a presidente
deveria ir aos Estados Unidos para cobrar pessoalmente os
esclarecimentos e uma retratação sobre os fatos reportados. "Ela tem
toda a nossa solidariedade no repúdio à espionagem dos Estados Unidos e
de qualquer outro país. Agora, acho que ela deveria ir para dizer na
lata, no Salão Oval [gabinete do presidente dos EUA na Casa Branca], que
o Brasil não aceita esse tipo de coisa", disse o líder tucano. Ele
também acha que o Brasil "se deixou espionar".
Do UOL
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