Técnicas matemáticas inspiradas em um clérigo britânico do século 18 já
ajudaram nas buscas por aeronaves acidentadas no mar. Será que poderão
ajudar nos esforços para encontrar o voo MH370? Na segunda-feira, o
premiê malaio, Najib Razak, afirmou que o voo 'terminou no mar' e que
não deixou sobreviventes.
No entanto, a busca pelos restos do avião e sua caixa-preta continua,
ela pode dar pistas sobre as circunstâncias que levaram a seu
desaparecimento.
A Autoridade Marítima Australiana afirmou, na quarta-feira (noite de
terça no Brasil) que as buscas foram retomadas após as condições
meteorológicas terem melhorado no sul do oceano Índico, onde acredita-se
que o avião tenha se acidentado. Segundo a Austrália, 12 aeronaves
participam da operação.
No caso do voo AF 447, da Air France, que se acidentou no Atlântico em
2009 na rota Rio de Janeiro-Paris, destroços foram encontrados flutuando
no oceano cinco dias após a tragédia, mas o mistério ao redor do tema
não poderia ser resolvido sem que se encontrasse a caixa-preta com as
gravações da cabine.
E, por conta das correntes marítimas, as partes do avião podem se distanciar muito do local do acidente.
A guarda-costeira americana frequentemente usa diferentes tipos de
software para simular possíveis movimentos dos destroços após o impacto
inicial. Mas esses programas não serviam no caso do AF 447 por causa da
imprevisibilidade que caracteriza a faixa equatorial, sobretudo na época
do ano em que a tragédia ocorreu.
Estatísticos
Navios e submarinos de Estados Unidos, Brasil e França continuaram as buscas, sem resultados. A autoridade francesa de investigação de acidentes (BEA, na sigla em francês) decidiu então pedir ajuda a um grupo de especialistas em estatísticas dos Estados Unidos, com experiência na localização de objetos perdidos no mar.
Navios e submarinos de Estados Unidos, Brasil e França continuaram as buscas, sem resultados. A autoridade francesa de investigação de acidentes (BEA, na sigla em francês) decidiu então pedir ajuda a um grupo de especialistas em estatísticas dos Estados Unidos, com experiência na localização de objetos perdidos no mar.
Foi por isso que Colleen Keller foi à França para colaborar com as
buscas. Para transformar em números e probabilidades as teorias da BEA
quanto aos possíveis locais do acidente, Keller e sua equipe da empresa
Metron Inc se basearam no chamado Teorema de Bayes, desenvolvido pelo
estatístico e clérigo presbiteriano britânico Thomas Bayes, morto em
1761.
A técnica criada por Bayes permite avaliar ao mesmo tempo vários
cenários, inclusive contraditórios, para encontrar a opção de maior
probabilidade. Keller e seus colegas avaliaram o grau de incerteza de
cada dado disponível para determinar o local mais provável da
localização do avião.
Daí dividiram a área de busca em quadrados e usaram cifras para
calcular, em cada seção, a chance de que os destroços estivessem ali.
Essas cifras vieram da análise de diferentes teorias sobre as causas do
acidente - por exemplo, avaliações de diferentes falhas mecânicas
possíveis levaram a diferentes graus de probabilidade de cada cenário.
Os investigadores americanos estudaram então dados históricos de
acidentes prévios e determinaram, por exemplo, que os aviões foram
encontrados frequentemente muito perto de sua última posição conhecida.
Por fim, Keller reduziu a probabilidade dos locais onde já haviam sido
realizadas buscas infrutíferas. 'Há dois componentes que fazem da
matemática de Bayes algo único', explicou Keller. 'Por um lado, permite
considerar toda a informação incluindo diferentes graus de incerteza e
combinar dados, até mesmo probabilidades excludentes.'
'No caso do voo MH370, se considerava uma possível trajetória ao norte e
outra ao sul da última posição conhecida. O avião foi para um lado ou
outro, mas o teorema permite avaliar todas as teorias.'
Além disso, a técnica desenvolvida por Bayes é flexível, diz Keller. Se
houver novos dados, eles são incorporados, e o mapa de probabilidades
se atualiza.
Hipótese errada
No caso do voo da Air France, havia certeza de que o avião caíra em um raio de 40 milhas da última localização transmitida pelo sistema de segurança da aeronave. Mas a área da busca era tão grande que os investigadores não sabiam por onde começar. O mapa de probabilidades desenhado por Keller permitiu limitar essa área, mas mesmo assim os destroços não foram encontrados.
No caso do voo da Air France, havia certeza de que o avião caíra em um raio de 40 milhas da última localização transmitida pelo sistema de segurança da aeronave. Mas a área da busca era tão grande que os investigadores não sabiam por onde começar. O mapa de probabilidades desenhado por Keller permitiu limitar essa área, mas mesmo assim os destroços não foram encontrados.
Vários meses depois, Keller foi chamada pela Air France para uma nova
tentativa de análise de dados. Então, Keller e seus colegas questionaram
uma hipótese presumida a princípio. Dados históricos indicavam que,
após a queda de um avião, a caixa-preta seguia emitindo sinal em 90% dos
casos. Imediatamente depois do desaparecimento do voo AF 447, as
equipes de busca passaram dias varrendo com radares as áreas próximas da
última localização conhecida, tentando detectar sinais dos gravadores
de voz da caixa-preta.
Como nenhum sinal foi detectado, Keller e sua equipe haviam concluído
que a chance de se encontrar o avião nessas áreas era muito baixa. Mas e
se nem a caixa-preta ou os gravadores estivessem emitindo sinais?
Os analistas da Metron adaptaram seu modelo para incluir essa
possibilidade e determinaram novas áreas de alta probabilidade. Os novos
dados permitiram a localização do avião.
'Áreas imensas'
A caixa-preta e o gravador indicaram uma combinação de erros humanos e falhas técnicas por trás da queda do voo, que resultou na morte de 228 pessoas. Para Keller, foi um 'milagre' que os restos do avião tenham sido encontrados. 'Estavam no fundo do mar, em uma zona arenosa.'
A caixa-preta e o gravador indicaram uma combinação de erros humanos e falhas técnicas por trás da queda do voo, que resultou na morte de 228 pessoas. Para Keller, foi um 'milagre' que os restos do avião tenham sido encontrados. 'Estavam no fundo do mar, em uma zona arenosa.'
Ela não tem certeza de que os destroços do voo da Malaysia Airlines
sejam achados algum dia - porque, mesmo que sejam encontradas algumas
peças, não significa que o restante da aeronave seja fácil de se
encontrar.
'Se passaram tantos dias desde o desaparecimento que não acho que
encontrar algum objeto possa ser muito útil', prosseguiu Keller. 'São
áreas imensas. Sei que muitos podem pensar: como é possível não
encontrar um Boeing 777? Mas, se estiver no fundo do oceano Índico,
infelizmente talvez não seja encontrado.'
Do G1
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